Famílias do MST em fazenda no Pará prometem resistir à PM

Fazenda Cabaceiras, no Pará, reincidente na utilização de trabalho escravo, foi ocupada pelo MST e desapropriada ano passado, mas decisão do STF a devolveu aos antigos proprietários. Agora, as trezentas famílias que vivem na fazenda correm o risco de despejo
Por Verena Glass
 09/06/2005

As 300 famílias de sem-terra que, segundo o MST, estão acampadas há cerca de sete anos em parte da fazenda Cabaceiras, em Marabá (PA), prometem resistir à ação de expulsão da Polícia Militar, que deve ocorrer entre esta sexta (10) e a próxima segunda-feira (13). A desocupação foi decidida pela Justiça estadual e faz parte do “mutirão de despejo” programado para atingir mais de 40 acampamentos e assentamentos no Sul e Sudoeste do Estado.

Segundo a coordenadora estadual do MST, Isabel Rodrigues, as famílias no local estão completamente estruturadas com casas, roças, criação, escola registrada no município de Marabá e até sete igrejas. “Vamos resistir”, garante.

Justiça suspendeu desapropriação
A fazenda Cabaceiras é um caso emblemático no Pará. Pertencente à família Mutran, uma das maiores proprietárias de terra no Estado, a área foi desapropriada em outubro de 2004 através de decreto presidencial por não cumprir sua função social, desrespeitar a legislação ambiental e por ter sido flagrada reincidindo na utilização de trabalho escravo.

À época, a desapropriação foi considerada “um símbolo da reforma agrária no Brasil”, como comemorou o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). O presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, também declarou que “o decreto de desapropriação da Cabaceiras representa a determinação do governo em fazer a reforma agrária e cumprir a lei”.

Quatro meses depois, em 22 de fevereiro deste ano, no entanto, o ministro do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence, acatando um mandado de segurança do agropecuarista Jorge Mutran, deferiu a liminar que suspendeu os efeitos do decreto presidencial. Na prática, então, até que o mérito seja votado em plenária pelos 11 ministros do STF, a área continua sob posse de Mutran, que teria direito de fazer cumprir a liminar de despejo contra o MST.

Segundo informações do STF, o processo de levantamento de dados sobre o caso está em andamento, mas o julgamento do mérito não tem data prevista, já que terá de ser solicitado pelo ministro-relator Pertence.

“O que está acontecendo no Pará é uma situação absurda”, afirmou hoje o consultor jurídico do MDA, Carlo Kaipper. Segundo ele, o ministério defende que, quando há qualquer manifestação de interesse do Incra sobre uma área, abre-se um processo administrativo pelo qual a competência sobre a propriedade deixa de ser da esfera estadual e passa para a federal, como está previsto na Constituição.

Na manhã desta quinta (9), ocorreu em Belém uma reunião entre a superintendência do Incra de Marabá, as ouvidorias agrárias nacional e estadual, coronéis da PM responsáveis pelos despejos, representantes do Tribunal de Justiça do Estado, do MDA e da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, além lideranças do MST e da Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri) do Pará, sem que as partes tivessem chegadas a um acordo.

Segundo Ulisses Manaças Campos, da coordenação estadual do MST, o objetivo da reunião, chamada pelos movimentos sociais, era pedir a suspensão de 16 liminares de despejo que estão em andamento no momento, das 48 deferidas pela Justiça estadual, para que o Incra possa encaminhar as petições referentes aos processos de assentamento.

“A resposta que tivemos é que o Estado não vai suspender nada sem ordens do Judiciário, já que foi o juiz agrário que decretou o cumprimento dos despejos. Já a representante do Tribunal da Justiça garantiu que não haverá suspensão, a princípio, e que a Justiça poderia, no máximo, estudar os processos caso a caso”, relata Campos.

Segundo ele, nova reunião com as partes interessadas e o juiz agrário deverá ocorre nesta sexta (10) no fórum de Marabá. Entremeios, tanto o Incra quanto o MDA devem estudar as formas legais para requerer a paralisação da ação policial.

Da Agência Carta Maior

APOIE

A REPÓRTER BRASIL

Sua contribuição permite que a gente continue revelando o que muita gente faz de tudo para esconder

LEIA TAMBÉM