Barragem de Campos Novos gera denúncia contra país na OEA

Manifestantes ocupam área da nova barragem de Campos Novos, em Santa Catarina. Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais denuncia na OEA violação de direitos de atingidos pelas obras e espera que governo adote medidas cautelares contra “danos pessoais irreparáveis”
Por Verena Glass
 10/10/2005

A Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (DHESC) e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) encaminharam na última sexta (7) à Organização dos Estados Americanos (OEA) uma denúncia de violação de direitos humanos dos atingidos pela barragem de Campos Novos, em Santa Catarina, sob responsabilidade do consórcio Enercan (formado pelas empresas Camargo Corrêa, Companhia Brasileira de Alumínio, Votorantim Cimentos e Banco Bradesco, com financiamento do BNDES e do Banco Interamericano de Desenvolvimento).

Segundo o MAB, a denúncia, dirigida à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, foi motivada pela expedição da licença de enchimento da barragem que, segundo as organizações, pode tornar irreversíveis “a destruição das bases materiais e culturais de que dependem os grupos populacionais atingidos, inviabilizando a sustentação de seus sistemas produtivos tradicionais e sua reprodução sócio-cultural”. De acordo com os denunciantes, a exposição a deslocamentos forçados e a expropriação e degradação de seus bens ambientais coloca em risco a sobrevivência dos atingidos devido à privação dos seus meios de subsistência.

No momento, a empresa ainda aguarda a Licença de Operação, a ser concedido pela Fundação do Meio Ambiente do Governo do Estado de Santa Catarina (Fatma), que, segundo o Ministério Público Federal, só deveria sair após o atendimento de todos os passivos sócio-ambientais pela empresa.

Nas últimas semanas, porém, os conflitos em torno da usina hidrelétrica de Campos Novos vêm se acirrando em função da discordância entre o MAB e a Enercan sobre quantas famílias devem ser indenizadas e qual o valor da indenização. Segundo os atingidos, a empresa não reconhece a totalidade das famílias consideradas pelo própria Fatma como passivos sociais da obra. Acampados nas cercanias da barragem, os atingidos também vem sofrendo forte repressão policial.

Pressão
Segundo a advogada da Plataforma DHESC, Mahine Dórea, a denúncia junto à OEA deve levar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos a interpelar o governo brasileiro com uma série de recomendações referentes a medidas cautelares que protejam os atingidos. “É uma forma de pressão para que o governo interceda, já que será um dos principais beneficiários da hidrelétrica”, diz Mahine.

De acordo com denúncia, a urgência de medidas é grande já que a Licença de Operação da usina, apesar dos pareceres técnicos contrários, está na iminência de ser concedida. Os advogados dos atingidos também afirmam que a proteção de seus direitos fundamentais deveria estar regulamentada legalmente, o que seria função do governo. Neste sentido, a denúncia à OEA cita a violência com que a polícia vem reprimindo as manifestações dos agricultores atingidos e a criminalização de suas organizações por parte da Justiça.

O principal objetivo, agora, é impedir que a usina entre em funcionamento sem que todos os passivos sociais tenham sido resolvidos, como aconteceu em outros projetos na região, especialmente a polêmica barragem de Campos Novos. “Campos Novos começou a funcionar tendo uma série de condicionantes que deverão ser resolvidos em um ano. Mas obviamente, uma vez em funcionamento, um projeto como este não é paralisado por não ter resolvido a questão das condicionantes”, avalia Mahine.

O que os movimentos esperam é que a OEA recomende ao governo interceder para que haja o pleno reconhecimento ao direito de indenização de todos os moradores e trabalhadores atingidos, incluindo arrendatários e meeiros. O reconhecimento, segundo o MAB, vai desde o pagamento de indenizações que chegam a R$ 40 mil e o reassentamento de todas as famílias que tiveram suas terras, propriedades e espaços de trabalho prejudicados em decorrência da construção usina, à efetiva implementação dos programas de desenvolvimento e transferência de renda para as comunidades que foram despojadas compulsoriamente de seus meios de subsistência por parte do governo.

“As denúncias de violação de direitos humanos no Brasil junto à OEA têm sido uma ferramenta de luta das organizações de defesa dos direitos no país. Em alguns casos, há resultados concretos, em que o governo realmente é interpelado perante a Comissão Interamericana. Mas o que conta para nós é que no mínimo ocorre um constrangimento que pode levar as autoridades a agir mais prontamente perante os casos denunciados”, diz Mahine.

Da Agência Carta Maior

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