Histórias de vidas migrantes

 22/07/2006

Roberto acredita que sua trajetória pode servir de exemplo a outros migrantes. "Muitos só precisam ver que é possível vencer aqui, que é a terra de muitas oportunidades", defende. Quando chegou de La Paz, foi difícil encontrar trabalho e ele quis voltar. "Mas, ao mesmo tempo, queria fazer as coisas darem certo aqui." Ele viveu na rua por um ano, período em que conheceu muitos brasileiros. "Aprendi muito com o povo daqui e entendi seu jeito de pensar. Vi que dava para sair daquela situação."

Uma amiga baiana o ensinou tudo sobre costura e o fez encontrar sua vocação. Hoje, Roberto modela e costura roupas em uma grife de surfe. Trabalha oito horas por dia e é o único boliviano na empresa. Ganha, segundo ele, "o suficiente", o que dá para pagar a faculdade de moda que está cursando à noite e ainda ajudar sua filha brasileira. "Descobri que sou muito bom no que faço e quero continuar no ramo", admite, um pouco encabulado.

Mil outras histórias como a de Roberto se cruzam na praça. Nem todas elas com o mesmo final feliz. Boa parte dos homens e mulheres que visitam a Kantuta aos domingos trabalham mais de 12 horas por dia costurando em confecções, antes localizadas principalmente no bairro do Bom Retiro, mas que agora se espalham por toda a Grande São Paulo. Nelas, a maioria clandestinas, os trabalhadores ganham cerca de R$ 0,10 centavos por peça costurada, o que lhes confere, ao fim do mês, um salário de R$ 200 a R$ 300.

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Se os recém-chegados ao Brasil vão à Kantuta para encontrar seus pares e procurar emprego, também os "gatos" ou coyotes -como são chamados os aliciadores de mão-de-obra- vão lá semanalmente em busca de trabalhadores. Pode ser que as condições de emprego sejam dignas, como muitos bolivianos fazem questão de ressaltar. Mas, para quem precisa se fixar no país, não existe muita opção a não ser tentar a sorte e aceitar a oferta.

Para reverter a situação de exclusão que atinge muitos migrantes recém-chegados ao Brasil, a Associação "Padre Bento" passou a promover, em convênio com a prefeitura e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), cursos de cooperativismo. As aulas acontecem na sede da entidade, na própria praça Kantuta. "A idéia é que eles deixem de trabalhar para as confecções e montem uma cooperativa para costurar para eles mesmos. Vão ganhar muito mais", avalia Wilson Ferreira, presidente da Associação. O curso já está em sua segunda edição e é totalmente gratuito.

Voltar para a matéria Kantuta é um pedaço de Bolívia na capital paulista

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