Comércio justo

No Maranhão, ex-escravos tentam nova vida produzindo brinquedos

Já estão à venda pela internet os produtos da Cooperativa para Dignidade do Maranhão (Codigma). Entidade busca consolidar-se como fonte de renda para pessoas que já foram escravizadas em fazendas no interior do país
Por André Campos
 21/02/2007

Cooperativa é alternativa de trabalho e renda para
trabalhadores sob risco de serem escravizados
(Foto: CDVDH)

Açailândia, no Sul do Maranhão, possui cerca de 100 mil habitantes – grande parte vivendo em áreas periféricas onde faltam empregos e qualificação às pessoas. Em seus bairros mais pobres, contratadores de mão-de-obra a serviço de fazendeiros freqüentemente buscam pessoas para trabalhar em propriedades rurais de outros municípios – muitas vezes sem carteira assinada, e por menos de um salário mínimo. Não raro, trabalhadores locais acabam tornando-se escravos em fazendas da região ou mesmo de outros estados, como Pará, Mato Grosso e Tocantins.

Alterar essa realidade é o principal objetivo da Cooperativa para Dignidade do Maranhão (Codigma). Criada em maio de 2006 pelo Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia (CDVDH), a cooperativa pretende garantir uma vida decente aos moradores do município sob risco de caírem em situação de escravidão. Os brinquedos educativos produzidos pela entidade já estão sendo comercializados via internet, através de uma parceria com a Repórter Brasil pelo site www.reporterbrasil.com.br/brinquedos.

Direcionados a meninos e meninas de dois a dez anos, os produtos da Codigma são feitos com madeira que provém de retalhos descartados pelas serrarias da região. A pintura, por sua vez, é atóxica, garantindo segurança às crianças. Entre os modelos produzidos pela entidade destacam-se blocos de montar, trenzinhos e carrinhos, entre outros.

Segundo Rogério da Silva, coordenador da Codigma, cerca de 40% dos trabalhadores envolvidos na produção dos brinquedos já foram libertados de situações análogas à de escravidão durante fiscalizações realizadas por auditores do trabalho. Segundo ele, aproximadamente 100 pessoas estão sendo beneficiadas direta e indiretamente pela cooperativa, que também possui outro núcleo voltado à produção de "carvão ecológico" – feito a partir do pó de carvão descartado por siderúrgicas.

Os trabalhadores da Codigma recebem uma bolsa de 150 reais cada, através de recursos repassados pelo CDVDH. O objetivo da cooperativa, no entanto, é tornar-se uma organização auto-sustentável, capaz de converter-se em uma alternativa consolidada de renda para os participantes. "Pretendemos ter todos os cooperados ganhando ao menos um salário mínimo com o lucro do seu trabalho", revela Rogério.

Comércio justo
De acordo com pesquisas da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Maranhão está entre os maiores estados fornecedores de mão-de-obra escrava para fazendas no território nacional. São pessoas como Libério José da Costa, morador de Açailândia, que no início de 2006 foi aliciado para roçar pasto em uma fazenda na região de Imperatriz, também no Sul do Maranhão

Caminhão de brinquedo com blocos de madeira
produzido pela cooperativa

Lá chegando, conta ele, deparou-se com uma situação degradante: os trabalhadores dormiam em barracas de lona na beira de uma lagoa, onde tomavam água junto com os animais. Além disso, o salário de 120 reais prometido pelo "gato" – contratador que o levou até a fazenda – chegava tarde. "Fomos maltrados, éramos vigiados e não podíamos sair", conta Libério, que saiu da propriedade há cerca de cinco meses. Após receber uma denúncia, auditores do trabalho fiscalizaram a fazenda e libertaram as pessoas lá presentes.

Hoje, Libério corta e lixa madeira na Codigma junto com outros homens. Enquanto isso, um grupo de mulheres é responsável pelo acabamento dos brinquedos. Os cooperados tiveram cursos de aprendizagem e hoje trabalham em tempo integral na cooperativa, que, a partir de março, deve ganhar dois novos núcleos de atividade – um voltado à produção de materiais de limpeza e outro de papel reciclável.

Além de vendidos em algumas lojas de Açailândia, os brinquedos da entidade estão sendo utilizados como material pedagógico na escola Divino Mestre, que também fica em Açailândia. A cooperativa também comercializa seus produtos através de estandes montados em escolas da região.

Mais informações sobre a Codigma e seus produtos podem ser obtidas através do telefone (99) 3538-2383. Para enviar mensagens, o e-mail é o [email protected].

Conheça os brinquedos da cooperativa

APOIE

A REPÓRTER BRASIL

Sua contribuição permite que a gente continue revelando o que muita gente faz de tudo para esconder

LEIA TAMBÉM