Expansão do etanol não pode transformar trabalhador em “escravo”, avalia fundação

 03/06/2007

Luciana Vasconcelos, repórter da Agência Brasil

Brasília – O crescimento da produção de cana-de-açúcar, para atender a crescente demanda por etanol, está piorando as condições de trabalho do bóia-fria, avalia o presidente da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), Remígio Todeschini. "É importante que se dê atenção ao trabalhador canavieiro. Ele não pode se tornar simplesmente um escravo da produção e tendo a capacidade de vida reduzida", disse, após audiência pública realizada na última semana no Senado Federal.

Cerca de 80% da cana produzida no país é colhida à mão, o que garante o emprego de cerca de um milhão de brasileiros. Mas a Fundacentro está preocupada com a qualidade desse trabalho.

Oitento e quatro trabalhadores do setor morreram em 2005, segundo dados da fundação. Mais de 23 mil acidentes. Já o Relatório Nacional de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e Culturais, lançado esta semana em Brasília, aponta a morte de 15 bóias-frias, somente na região de Ribeirão Preto.

A expansão da produção deve se traduzir em melhora das condições de trabalho, defende Todeschini. "Temos de ter redução da jornada para seis horas. Para que os trabalhadores não morram ou se acidentem por causa de esgotamento. Além de melhorar as condições de alojamento dos canavieiros, a questão de refeição, a questão da produção menos intensiva", observou.

Algumas das principais causas de acidentes e mortes, de acordo com estudo, são ausência de proteção coletiva, desnutrição e estresse por calor, alojamentos inadequados, exaustão e intoxicação.

De acordo com Todeschini, o ministério do Trabalho tem uma ação intensiva de fiscalização para coibir a informalidade, a terceirização, e o não cumprimento das normas básicas, como fornecimento e utilização de equipamento individual. Ele sugere que as empresas fiquem atentas às condições de trabalho.

"É preciso que nesse investimento feito pelo governo haja uma contrapartida também por parte das entidades empresariais de sentar com o Sindicato dos Trabalhadores para estabelecer um contrato coletivo, uma negociação coletiva adequada. Para se preservar a saúde e para que todos tenham um trabalho decente", destacou.

Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Manoel dos Santos, a situação como está não pode continuar. E acredita que a ampliação do setor vá prejudicar a agricultura familiar. "Onde chega uma plantação de cana, a agricultura familiar não pode se estabelecer ali em volta. Então, esses trabalhadores são expulsos ou pela pressão ou pela sedução de venda da terra, ou pelos herbicidas que são colocados, muitas vezes de avião e prejudicam comunidades inteiras", disse.

Além disso, ele acredita que a expansão do setor não se traduzirá em empregos, porque, segundo ele, o grande foco da sucro-alcoleira está mais na mecanização e no uso de herbicida e não de mão-de-obra de trabalhadores.

A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que o Brasil deva colher 528 milhões de toneladas de cana-de-açúcar na safra 2007/2008, com aumento de 11,20% sobre a safra 2006/2007. A área plantada cresceu 7,4% em relação à safra anterior, com ganhos de produtividade em torno de 3,5%.

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