Trabalho Escravo

Ação recorde resgata 1108 trabalhadores da cana no Pará

Na fazenda, em Ulianópolis (PA), trabalhadores dormiam em alojamentos superlotados com esgoto a céu aberto, recebiam comida estragada e água sem condições de consumo, além de salários que chegavam a R$ 10,00 por mês. Petrobrás, cliente da empresa, anunciou suspensão do contrato
Por Iberê Thenório e Leonardo Sakamoto
 02/07/2007

O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) flagrou, no último sábado (30), 1108 trabalhadores que se encontravam em condições análogas à escravidão. [Explicação inserida posteriormente: ao final da operação de resgate, o MTE divulgou que o número totalizado de trabalhadores retirados foi de 1.064, diferente do que haviam anunciado inicialmente.] Eles faziam a colheita e plantio da cana para a fazenda Pagrisa (Pará Pastoril e Agrícola S.A.), no município de Ulianópolis (PA), localizado a 390 km de Belém. A ação contou com a participação do Ministério Público do Trabalho, representado pelo procurador Luis Antônio Fernandes, e da Polícia Federal.

De acordo com o auditor fiscal do trabalho e coordenador da ação, Humberto Célio Pereira, havia trabalhadores que recebiam apenas R$ 10,00 por mês, já que os descontos ilegais realizados pela empresa consumiam quase tudo o que havia para receber de salário. O auditor informa ainda que a comida fornecida aos trabalhadores estava estragada e havia várias pessoas sofrendo de náuseas e diarréia.

A água para beber, segundo relato dos empregados na fazenda, era a mesma utilizada na irrigação da cana e, de tão suja, parecia caldo de feijão. O alojamento, de acordo com Humberto, estava superlotado e o esgoto corria a céu aberto. Vindos em sua maioria do Maranhão e do Piauí, não havia transporte à disposição dos trabalhadores para levá-los da fazenda ao centro de Ulianópolis, distante 40 quilômetros.

Os auditores ainda se encontram na propriedade para realizar o pagamento da rescisão contratual, que deverá ser feito nesta terça-feira (3).

O diretor da Pagrisa, Fernão Villela Zancaner, informa que ainda aguarda uma notificação oficial do MTE sobre as irregularidades trabalhistas para poder se pronunciar. "Cem por cento dos nossos funcionários têm carteira assinada. Sempre sofremos fiscalizações e nunca tivemos problemas. Estamos surpresos com essa fiscalização que não é corretiva, mas punitiva", afirma. O grupo produz cerca de 50 milhões de litros de álcool a cada ano em Ulianópolis. E mantém no mesmo local uma usina de açúcar com produção de 4 mil sacos por dia. O principal comprador de etanol da empresa é a Petrobras, que já informou, por meio de sua assessoria, a suspensão da compra de álcool da Pagrisa.

Se os números se confirmarem, esta será a maior libertação de trabalhadores realizada no país. Desde que os grupos móveis de fiscalização foram criados, em 1995, a maior libertação havia acontecido na Destilaria Gameleira, em junho de 2005, quando 1003 pessoas foram libertadas. Apesar da cana figurar entre as maiores libertações, esta não é a atividade que mais usa trabalhadores escravos no país – posto esse que pertence à criação de gado bovino.

O Pará é recordista no número de trabalhadores libertados da escravidão – foram mais de 8,7 mil desde 1995. Essa é uma das primeiras ações envolvendo a cana-de-açúcar no estado. A pecuária bovina, a produção de carvão para siderurgia, a extração de madeira e o cultivo de pimenta-do-reino são atividades nas quais a incidência de trabalho escravo no Pará tem sido mais freqüente.

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