Maranhão

Prefeito e reincidente são envolvidos em casos de escravidão

Fiscalização encontrou 24 pessoas em condições de trabalho escravo na fazenda do prefeito de Codó (MA), Zito Rolim (PV). Outros sete foram libertados da propriedade do reincidente Rui Carlos Dias Alves da Silva
Por Bianca Pyl
 22/12/2009

A Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Maranhão (SRTE/MA) encontrou 24 pessoas – incluindo um jovem de 17 anos – em condições análogas à escravidão na Fazenda São Raimundo/São José, pertencente ao prefeito de Codó (MA) José Rolim Filho (PV), conhecido como Zito Rolim.

Segundo auditor fiscal, água consumida tinha cor amarelada e cheiro ruim (Foto: SRTE/MA)

Em outra ação, o mesmo grupo libertou sete pessoas da Fazenda Pajeú, no município de Governador Acher (MA), a 350 km da capital São Luís (MA). Uma das vítimas era um adolescente de 13 anos. O dono da área é Rui Carlos Dias Alves da Silva, reincidente no crime. Ele fez parte da "lista suja" do trabalho escravo (relação de empregadores flagrados) até fevereiro deste ano.

As fiscalizações ocorreram entre os dias 7 e 17 de dezembro e contaram com a participação do Ministério Público do Trabalho (MPT) e de agentes da Polícia Federal (PF).

Os libertados na Fazenda São Raimundo/São José foram arregimentados pelo "gato" Antônio Mauro há dois meses, que já foi enquadrado no crime de aliciamento de trabalhadores, previsto no art. 207 do Código Penal, segundo o auditor fiscal Carlos Henrique da Silva Oliveira, que coordenou a ação. Duas mulheres responsáveis pelo preparo das refeições estavam entre as vítimas. Uma delas estava acompanhada de duas filhas com idades entre 5 e 6 anos e do filho de 13 anos. O adolescente ajudava sua mãe nas tarefas diárias e tinha a função de levar a alimentação até a frente de trabalho, que ficava a 3 km de distância dos barracos utilizados como alojamento.

Os empregados eram responsáveis pelo "roço de juquira" – limpeza da área para formação de pasto para pecuária extensiva. Segundo a fiscalização, eles tinham dívidas com o "gato" e recebiam por produção, de R$ 10 a R$ 12 por dia. No fim, os salários não chegavam nem ao mínimo (R$ 465). 

Trabalhadores não tinham acesso a alojamentos adequados e nem à água potável (Foto: SRTE/MA)

Os alojamentos eram quatro barracos de palha, em formato de ocas, construídos debaixo de um palmeiral de babaçu, na beira de um açude poluído. A água consumida pelos trabalhadores vinha desse açude e não recebia nenhum tratamento ou processo de filtração.

"A água ia direto para o pote, tinha cor amarelada e cheiro ruim", detalha Carlos Henrique, que contou com o apoio do auditor Antônio Borba durante a operação.

A comida servida aos trabalhadores era basicamente arroz e feijão. De vez em quando, havia buchada, tripas e outros miúdos (fato) do boi. Para o desjejum, pela manhã, somente café com farinha.

As vítimas receberam as verbas referentes à rescisão do contrato de trabalho, além das três parcelas do Seguro Desemprego para Trabalhador Resgatado. A procuradora do trabalho Maria Elena Rêgo intermediou ainda o pagamento de indenização por danos morais individuais no valor R$ 500 para cada libertado.

Fazenda Pajeú

Na propriedade do reincidente Rui Carlos Dias Alves da Silva, a fiscalização libertou sete pessoas de trabalho escravo. Uma delas era um adolescente de apenas 13 anos. A estrada que dá acesso à Fazenda Pajeú é precária, segundo o auditor Carlos Henrique, da SRTE/MA.

Os trabalhadores chegaram no local no início de outubro de 2009. Estavam alojados em barraca de palha, sem condições de higiene. Não havia camas no local nem armários para guardar pertences.

A água consumida pelas vítimas vinha de um poço cheio de sapos. Para tomar banho, os trabalhadores utilizavam um açude, também usado para matar a sede dos animais. A alimentação oferecida aos trabalhadores consistia somente em arroz e feijão. Pela manhã, o alimento era café com farinha.

O empregador pagava o salário de R$ 150, no máximo. Além disso, as vítimas estavam endividadas com o gerente da fazenda, que vendia mercadorias com preços acima dos praticados no mercado.

Água consumida pelos empregados da Faz. Pajeú vinha de poço cheio de sapos (Foto: SRTE/MA)

Os empregados foram retirados do local e o proprietário efetuou o pagamento das rescisões dos contratos de trabalho. O empregador também assinou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), proposto pelo MPT, em que se prontifica a abrir uma conta poupança com depósito de R$ 5 mil em favor do adolescente libertado. Além disso, pagou também R$ 1,8 mil por danos morais individuais.

"A SRTE/MA e MPT vão tentar viabilizar o recebimento do Seguro Desemprego de Trabalhador Resgatado para o adolescente de 13 anos, tendo em vista que não há previsão legal para o execício deste ditreito por menores de 16 anos de idade", relata Carlos Henrique.

Rui Carlos entrou para a "lista suja" por causa de uma fiscalização ocorrida em novembro de 2005. Naquela ocasião, 52 trabalhadores foram libertados da fazenda Agranor/Sanganhá, em Codó (MA).

Saldo de libertações
Entre maio de 2003 e dezembro de 2009, a SRTE/MA libertou 1.186 trabalhadores de condições análogas à escravidão, de acordo com dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

As libertações resultaram no pagamento de mais de R$ 1 milhão em indenizações aos trabalhadores. Durante este período, foram realizadas 35 operações, que vasculharam 73 propriedades rurais. Foram formalizados mais de mil contratos de trabalho e lavrados 491 autos de infração.

Segundo os números, 56% dos libertados tinham entre 18 e 35 anos. Cerca de 4% eram crianças e adolescentes de até 16 anos. A maioria das vítimas de trabalho escravo no Maranhão era analfabeta: 68%.

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