Artigo

Da vigilância à prevenção, como diminuir acidentes de trabalho

Pesquisadores apontam limites de análises que colocam falhas humanas ou falta de atenção com normas como principais fatores para índices elevados
Rodolfo Vilela
 16/11/2012

Com o objetivo de explicitar a necessidade de abordagens contextualizadas nas medidas de combate a acidentes de trabalho, pesquisadores realizaram estudo de caso analisando índices de acidentes e diferentes políticas adotadas por um frigorífico no interior de São Paulo.

Defendendo que, para redução de índices altos, é necessário levar em conta não apenas fatores pontuais, mas também o quadro geral de como os casos acontecem, os três autores do estudo em questão acompanharam dois momentos diferentes. No primeiro, em 1997, as ações de vigilância incidiam apenas em fatores de risco visíveis e deram pouco resultado. No segundo, em 2008, quando o índice anual de acidentes ainda era de 26%, a fiscalização passou a considerar o contexto no qual os acidentes aconteciam: trabalho intenso; inadequação de meios técnicos; absenteísmo e rotatividade com recrutamento de inexperientes, quadro agravado por práticas autoritárias.


Cena do documentário Carne, Osso, sobre condições de trabalho em frigoríficos

O resultado da pesquisa é um artigo científico publicado na Revista "Saúde e Sociedade – Abrasco" disponível na íntegra neste link. Abaixo, a Repórter Brasil reproduz trecho em que os pesquisadores argumentam em favor de uma abordagem contextualizada no combate aos acidentes de trabalho.

"Os acidentes do trabalho constituem o principal agravo à saúde dos trabalhadores, com elevados custos sociais e econômicos que podem chegar a 10% do PIB (Produto Interno Bruto).

Esses acidentes são influenciados por aspectos da situação imediata de trabalho como o maquinário, a tarefa, o meio técnico ou material, mas também pelas relações de trabalho, cuja determinação situa-se na sua organização.

A despeito das críticas às abordagens tradicio­nais, ainda prevalece uma visão reducionista e tendenciosa de que esses eventos possuem uma ou poucas causas decorrentes de falhas dos operadores (erro humano, ato inseguro, comportamento fora do padrão etc.) associadas ao descumprimento de normas e padrões de segurança ou a falhas técnicas e materiais.

Esse enfoque herdado de disciplinas clássicas como a Higiene e Saúde Ocupacional é insuficiente para explicar o processo causal dos acidentes e da nocividade, o que limita as ações de vigilância e prevenção, ao deixar intocados os determinantes desses eventos.

A vigilância em saúde do trabalhador no SUS (Sistema Único de Saúde) tem sido abordada em perspectiva sociotécnica, na qual a prevenção pode surgir de ações estratégicas articuladas interinstitucionalmente, de modo a analisar e a intervir nos fatores determinantes e condicionantes dos problemas de saúde relacionados aos processos de trabalho.

A despeito de avanços práticos e teóricos, um dos grandes desafios dos agentes públicos é identificar os determinantes dos acidentes e da nocividade e, a partir desse diagnóstico, desencadear ações de prevenção".

* Rodolfo Vilela é professor da Faculdade de Saúde Pública, da Universidade de São Paulo. Ildeberto Muniz de Almeida é professor do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu. Renata Wey Berti Mendes é doutoranda em engenharia de produção da COPPE/UFRJ e doutoranda em Sociologia e Antropologia da Universidade Lyon II.

Veja também:
Especial "Moendo Gente"
Documentário "Carne, Osso"
Fórum Acidentes de Trabalho
– próximo encontro presencial em São Paulo no próximo dia 5 de dezembro (acesse o site para mais informações).

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