Escravidão

Força-tarefa liberta 41 indígenas de trabalho escravo no Rio Grande do Sul

Entre os resgatados estavam 11 adolescentes. Grupo foi encontrado em condições precárias no cultivo de maçã em Itaimbezinho
Por Verena Glass
 29/11/2012

No último dia 22, uma força-tarefa do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Publico do Trabalho (MPT) e Funai libertaram 41 indígenas kaingang – entre os quais 11 eram menores de 18 anos – que trabalhavam em condições análogas à escravidão em Itaimbezinho, distrito do Município de Bom Jesus, RS. Os indígenas foram encontrados durante uma fiscalização de rotina do MTE na atividade de raleio de maçãs em uma área arrendada pelo empresário Germano Neukamp.


Cultivo de maçã no Rio Grande do Sul. Fotos: Divulgação/MPT

De acordo com o procurador do MPT Ricardo Garcia, os trabalhadores foram aliciados por um funcionário do empresário, e nenhum indígena tinha carteira assinada, os contratos de trabalho eram apenas verbais e por tempo indeterminado, e o pagamento – também acordado verbalmente – de R$ 40/dia não havia sido efetuado regularmente, apesar de vários indígenas estarem trabalhando desde setembro. "Quando chovia e os indígenas não podiam trabalhar e não recebiam", relata o procurador. O empregador também não forneceu as ferramentas de trabalho ou quaisquer equipamentos de proteção individual (EPI).

 
Famílias com crianças nos alojamentos

Já as condições precárias de alojamento e alimentação chocaram os membros da força-tarefa. Segundo a auditora fiscal Inez Rospide, coordenadora da Fiscalização Rural no Rio Grande do Sul, que coordenou a libertação, os alojamentos estavam em péssimas condições, havia apenas dois banheiros para os 41 trabalhadores, as famílias – inclusive crianças – se apertavam em espaço insuficiente, a fiação elétrica estava solta, o frio entrava pelas frestas, a água era armazenada em garrafas pet e havia comida estragada pelos cantos.

De acordo com Ricardo Garcia, do MPT, o alojamento já havia sido interditado em outra fiscalização em 2009, e de lá para cá só se deteriorou. "Pode até ser que os indígenas vivem com menos conforto nas aldeias, mas aquilo era insuportável até para um trabalhador mais rústico", afirma o procurador.

 

Comida estragada encontrada pelos fiscais

Adolescentes
Dos 11 indígenas adolescentes libertados pela força-tarefa, cinco tinham entre 14 a 16 anos, e outros seis, de 16 a 17 anos. "Uma garota de 17 anos estava grávida. O pai da criança, de 15, também trabalhava no local", relata a auditora fiscal Inez Rospide. A contratação de menores de 18 anos é proibida por lei, e gerou dois autos de infração ao empregador.

Coordenador da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpinsul), Rildo Kaingang explica que a presença de adolescentes nas frentes de trabalho é um fator que exige especial atenção dos empregadores, uma vez que a total ausência de políticas públicas para as aldeias Kaingang tem forçado cada vez mais indígenas a buscar fontes de renda em atividades nos frigoríficos e nas safras de frutas, como maçã e uva, na região nordeste do Rio Grande do Sul.


Quarto em que famílias viviam 

“Para os kaingang, um adolescente de 13 anos já está entrando na fase adulta, e os jovens acabam seguindo o caminho indicado a eles pelos adultos. Como nas aldeias a situação é muito precária – são quase favelas rurais, sem habitação decente nem qualquer apoio a atividades produtivas por parte do governo -, os indígenas – e também os adolescentes – são empurrados a buscar alternativas fora. É obrigação do empregador zelar pelo cumprimento da lei e não contratar estes jovens, que ficam expostos a condições impróprias, como áreas com perigo de contaminação por agrotóxicos, e outros problemas”, explica o dirigente da Arpinsul.
 
Após a libertação dos indígenas, foram lavrados 17 autos de infração contra o empregador Germano Neukamp – entre eles, a falta de sinalização das áreas tratadas com agrotóxicos -, e foram pagos 50% dos direitos recisórios (que totalizam R$ 54.646,32). O restante será quitado no dia 23 de dezembro. Os indígenas foram reconduzidos à aldeia na terra indígena Monte Caseros, e o MTE emitiu as carteiras profissionais de todos os trabalhadores que ainda não as tinham, com anotação do início e fim dos contratos de trabalho, para todos os fins, inclusive previdenciários.

Procurado pela reportagem, até a conclusão da matéria o empresário Germano Neukamp não retornou o telefonema nem respondeu e-mail com solicitação de entrevista.


Ação de fiscalização contou com participação da Polícia Federal

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