Carvão

Fiscalização flagra escravidão em uma de cada três carvoarias no Tocantins

Ao todo, 96 pessoas foram resgatadas de condições análogas às de escravos. Fiscais constataram condições degradantes, restrição de liberdade, jornadas exaustivas e servidão por dívida
Por Daniel Santini
 21/05/2012

Em uma de cada três carvoarias no Tocantins foi encontrado trabalho escravo em uma ação de fiscalização conjunta realizada em abril pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Tocantins e pelo Ministério Público do Trabalho. Ao todo, foram inspecionadas 31 unidades de produção de carvão no Estado, sendo que em 11 delas foram encontradas pessoas em condições análogas às de escravos. Com auxílio da Polícia Rodoviária Federal e da Polícia Federal, os auditores fiscais e procuradores resgataram ao todo 96 pessoas.

Carvoeiro trabalha em forno sem nenhum equipamento de proteção. Fotos: MTE/SRTE/TO

“Encontramos a situação clássica em que boa parte das carvoarias do Estado se encontra: pessoal sem nenhum equipamento de proteção trabalhando no sol quente, no calor dos fornos, transportando o material de maneira inadequada, vivendo em condições degradantes e com uma alimentação muito ruim”, descreve Rodrigo Ramos do Carmo, chefe de inspeção da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Tocantins (SRTE-TO).

Reduzir pessoas à escravidão é crime previsto no artigo 149 do Código Penal. Pela lei, a condição se caracteriza por trabalho forçado, por servidão por dívida (quando o empregador mantém o trabalhador endividado e o impede de ir embora), por degradação e/ou por jornadas exaustivas. De acordo com Rodrigo, na operação foram encontrados trabalhadores submetidos ao mesmo tempo às quatro categorias que caracterizam a escravidão contemporânea.

Carne crua exposta sem nenhuma proteção secando no sol, o alimento de alguns dos trabalhadores

“Trabalhadores que foram aliciados em outros estados eram impedidos de ir embora. Eles cumpriam jornadas exaustivas sem remuneração por horas extras, viviam em alojamentos de palha, sem instalações sanitárias, sem nada", conta.

Caderno com "dívidas" dos empregados

"Sem opções, os empregados comiam alimentos que ficavam expostos, como mantas de carne repletas de moscas e outros insetos”, descreve o auditor. “A água que alguns bebiam era retirada de um rio sem nenhum tipo de tratamento e de locais que animais tinham acesso”, completa.

Muitos dos trabalhadores foram aliciados na Bahia e no Maranhão e já chegaram endividados. “Os ‘gatos’ falavam que eles deveriam pagar a passagem e a comida consumida na viagem e os trabalhadores seguiam se endividando com alimentação. Alguns acreditavam que deviam até R$ 2,5 mil”, descreve. “Eles estavam isolados em regiões sem transporte, sem nenhuma chance de deixarem as carvoarias”.

Em duas das 11 carvoarias flagradas com escravos os proprietários se recusaram em reconhecer a responsabilidade pela situação encontrada e em pagar as indenizações previstas. Elas devem sofrer ações judiciais pedindo penhora de bens para garantir o pagamento aos resgatados. O relatório de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego foi concluído na semana passada e será encaminhado ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério Público Federal.

Armazenamento e transporte da madeira e do carvão eram feitos em condições inadequadas

 

Poço de onde os trabalhadores retiravam água em uma das unidades de produção

 

Trabalhador em iguarapé de onde também era retirada água

 

Cozinha de um dos "alojamentos" improvisados junto aos fornos de carvão

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