Deus e diabo na terra do ouro

 01/06/2004

"Curió é deus e o demônio de Serra Pelada." Assim o senador Edison Lobão (PFL) resume a trajetória do homem que inicialmente controlou o garimpo e ainda hoje permanece como sua principal força política.

"Nunca prometi nada que não cumprisse. Esse é o motivo do credo que os garimpeiros de cabeça branca têm por mim." Para o próprio Sebastião Rodrigues de Moura, o major Curió, essa é a explicação para sua divinização. A comparação com o demônio, no entanto, é mais comum entre todas as outras lideranças de Serra Pelada. "O prefeito é nosso maior inimigo", declara João Lepos, antigo aliado político.

Curió chegou ao garimpo em 1980 como agente do Serviço Nacional de Informações, para ser o interventor de Serra Pelada. A indicação deveu-se a seu conhecimento da área, uma vez que havia sido o líder da repressão aos grupos militantes do Partido Comunista do Brasil (PC do B) na região do Araguaia. Sobre sua atuação nesse episódio, Curió foi convidado, em 2001, a prestar depoimento na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Contra ele pesavam acusações de execução de membros do partido de esquerda. Cumpriu mandato de deputado federal de 1984 a 1987, pelo PDS. Hoje à frente da prefeitura, liderou a campanha que elegeu Josimar Barbosa presidente da Coomigasp, a despeito dos esforços do governo estadual, federal e de uma coligação sem precedentes na história de Serra Pelada.

"Curió é a pedra no sapato dos garimpeiros", afirma José Maria Vieira, membro do Simgbrás. Carioca, como é conhecido, alega ter sofrido cinco tentativas de homicídio. "A primeira, em 1990, foi motivada por denúncias que fiz contra ele." O conteúdo dessas acusações foi comprovado na CPI do caso PC Farias, quando o então candidato a deputado federal Curió confirmou ter recebido dinheiro de Paulo César Farias para sua campanha.

Como prefeito e líder indireto da Coomigasp, Curió tornou-se, mais do que nunca, o dono de Serra Pelada e domina corações e mentes dos garimpeiros. No dia da posse de Barbosa, centenas deles lotavam o auditório da Coomigasp, aplaudindo cada frase do discurso do prefeito. "Perante os garimpeiros, construí a imagem de um homem sério e justo", arremata Curió. Efetivamente, sua popularidade é capaz de fazer os homens esquecerem o estado de miséria em que se encontram. Enquanto promete uma nova realidade, os vícios do poder irrestrito que detém há mais de duas décadas ainda marcam sua fala. "Não tínhamos condição de gerar empregos. Agora, chegou a hora de levantar a cooperativa, trazendo empresas multinacionais. Mas nós acabamos de assumir. Nós, não. O Josimar", corrige-se o governante de uma cidade que tem seu próprio nome.

 

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