A tensão que se criou entre os negociadores da COP-8 esta semana, nos debates sobre a proposta de flexibilização das regras referentes às tecnologias de restrição de uso genético (GURTS), conhecidas como Terminator – engenharia genética que esteriliza as sementes e impede a sua reprodução –, acabou nesta sexta (24) com a surpreendente decisão do presidente da mesa do Grupo de Trabalho sobre o tema de encerrar o debate e rejeitar todas as modificações no texto original da COP-5, de 2000, que baniu experimentos em campo e a comercialização destas sementes.
Apesar da massiva rejeição ao Terminator entre os negociadores governamentais, Nova Zelândia, Canadá, Austrália e Suíça insistiram, nesta primeira semana de negociações da COP-8, em uma flexibilização do texto que instituiu uma moratória para os GURTS, de modo a permitir estudos caso a caso das tecnologias Terminator, bem como testes e possível comercialização.
A proposta do "estudo caso a caso" havia sido incluída no documento base da COP-8 em janeiro passado, mas já no início desta semana o governo brasileiro decidiu se posicionar contrário a sua manutenção. Como presidente da COP-8, no entanto, preferiu não se colocar em plenária, mas aderir a outras rejeições, que foram colocadas na manhã de quinta pela Venezuela, pela Argentina e pela Malásia, esta última representando o G-77 (grupo que reúne 133 países em desenvolvimento).
Segundo o especialista americano em tecnologia genética Pat Monney, pesquisador do instituto Erosão, Tecnologia e Concentração (ETC Group), além da rejeição do "caso a caso", cai também a tentativa de limitação do direito dos agricultores de reproduzir sementes, presente na proposta excluída. "Esta é uma das vitórias mais importantes de hoje, a reafirmação deste direito pela CDB", afirma.
Cauteloso, porém, Mooney alerta que a vitória, apesar de grande, pode não ser definitiva. "O debate poderá ser reaberto pela plenária, por exemplo, ou retomado na reunião ministerial [que começa neste domingo como evento paralelo à COP]. Temos que prestar atenção se não sai deste espaço nenhum documento sobre o tema, e devemos estar cientes que a batalha será retomada em dois anos, na COP-9. As empresas de biotecnologia não vão desistir, o negócio é demasiadamente lucrativo".
Por outro lado, a representante do Ministério do Meio Ambiente da Noruega, Tone Solhaug, uma das maiores defensoras do banimento do Terminator, não acredita em uma reversão da situação. "Fomos muitos contra o 'caso a caso'. Não temos informações suficientes sobre os possíveis impactos dos GURTS, e como os adendos feitos na reunião de janeiro em Granada se mostraram um problema, resolvemos tirá-los. Manter esta decisão se tornou uma obrigação para nós".
As sementes estão em festa
A decisão pela rejeição das tecnologias Terminator na CDB foi recebida com entusiasmo pelos movimentos e organizações sociais do Fórum Global da Sociedade Civil. Em especial a Via Campesina, que novamente promoveu protestos nos portões da COP-8 esta manhã e considerou o fato uma grande vitória das ações e pressões promovidas pela sociedade civil.
Para a coordenadora internacional da campanha de sementes crioulas da Via Campesina, Francisca Rodriguez, indígena da etnia mapuche do Chile e produtora de violetas, a resistência, principalmente das mulheres, à tecnologia Terminator é comparável àquela na década de 1970 contra a campanha de esterilização massiva contra as indígenas para o controle da natalidade.
"Hoje, as sementes estão em festa. Hoje vamos dar a elas todo o nosso carinho e afeto", disse. À tarde, a Via Campesina promoveu um grande ato em homenagem às sementes no espaço do Fórum Global da Sociedade Civil.
Da Agência Carta Maior