Condição dos alojamentos dos empregados era degradante. Maioria dos trabalhadores é semi-analfabeta e vinha enganada do Ceará
Do G1, No Rio, com informações da TV Globo
O Ministério Público do Trabalho (MPT) encontrou nesta segunda-feira (19) condições "comparáveis a trabalho escravo" em uma empresa de limpeza de ônibus e garagens de coletivos no Rio. Os funcionários dormiam em alojamentos, que segundo nota divulgada pelo MPT, se encontravam em situação "degradante, indigna às condições humanas, tendo em vista a precariedade do ambiente insalubre e inóspito. Além do mau cheiro e da sujeira no local".
Após a inspeção no local, a fiscalização do trabalho determinou a remoção imediata dos trabalhadores para locais adequados e interditou os alojamentos devido à falta de condições de funcionamento.
Trabalhadores do Ceará vinham enganados
Os trabalhadores vinham do Ceará com a promessa de emprego da Marques Vieira Conservação e Limpeza, prestadora de serviço a empresas de ônibus, que custeia a passagem de vinda, mas desconta a despesa nos primeiros salários do empregado.
De acordo com depoimentos colhidos pelo MPT, a empresa recolhe os funcionários do Ceará desde 1979. Os empregados, que têm carteira de trabalho assinada, também pagam pelos uniformes.
O MPT explicou que, entre as irregularidades constatadas, está o turno diário de 12 horas. As horas extras não constam nos contracheques, ou seja, os valores são pagos "por fora". De acordo com os depoimentos, não há controle por parte dos trabalhadores, porque o valor do pagamento vem dentro de um envelope já com os descontos da empresa, que também não constam no contracheque.
"Nos alojamentos vistoriados pelos Procuradores e Auditores Fiscais, a situação encontrada foi degradante, indigna às condições humanas, tendo em vista a precariedade do ambiente insalubre e inóspito. Além do mau cheiro e da sujeira no local, a casa, situada em Cosmos (Zona Oeste), tem, originariamente, dois quartos, sala, cozinha e dois banheiros. Cerca de 30 camas, do tipo de beliche, estão espalhadas pela casa, que não tem ventilação, água potável, além de os banheiros e a cozinha estarem em condições impróprias de uso. Como o número de camas é insuficiente para o total de empregados, é preciso haver revezamento entre eles. Em algumas situações, eles dormem juntos na mesma cama ou até mesmo no chão em cima de papelões", diz a nota do MPT.
"Eles ficam amontoados e o espaço chega a ser sufocante", disse a Procuradora do Trabalho Lisyane Motta. "A situação encontrada configura trabalho em condições análogas às de escravo.
A limpeza é feita pelos próprios moradores, mas segundo relatos, à noite, é comum ver ratos andando pela casa. Muitos guardam comida e panelas debaixo das próprias camas, uma vez que não há armários para guardar utensílios domésticos e roupas.
A maioria dos empregados é semi-analfabeta
De acordo com um dos depoimentos, os trabalhadores ficam na cidade cerca de um ano e retornam após esse período, já que uma das responsáveis pela empresa, Jaquelma Marques Vieira, faz um "acordo" para liberar o seguro-desemprego e o FGTS somente após 10 meses de trabalho. A maioria dos empregados é semi-analfabeta. "Teve um dia que faltei ao serviço e fui suspenso por 15 dias", afirmou um empregado. "Eu sonhava com esse dia", desabafou um outro trabalhador, ao receber a visita dos representantes do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho e Emprego.
A empresa de limpeza presta serviço a seis empresas de ônibus: Expresso Pégaso, Viação Verdun, Transporte Amigos Unidos, Nossa Senhora da Penha, Ocidental e Madureira-Candelária. "Segundo informações, outras empresas de ônibus também mantêm alojamentos nas cercanias das garagens. A estimativa é a de que cerca de 100 trabalhadores devam estar em situação similar e divididos em outros seis alojamentos."
Auditores Fiscais do Trabalho vão inspecionar os demais alojamentos ainda nesta semana. Durante ida à sede da empresa de limpeza, localizada no Méier, foram solicitados documentos referentes à contratação dos trabalhadores para averiguar o contrato de trabalho firmado e irregularidades trabalhistas como desconto de valores referentes às passagens de ônibus interestaduais e uniformes de trabalho. Diante da análise dos dados, o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho avaliarão as medidas que deverão ser tomadas. Na quarta-feira (21), trabalhadores serão ouvidos na sede do Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro.
Ninguém da empresa Marques Vieira Conservação e Limpeza foi encontrado para responder pela acusação.