Trabalho vs Capital

Ação sindical e gestos do governo adiam votação de “reforma”

Congresso vai esperar para julgar veto de Lula que manteve multa contra empresa que foge da carteira assinada contratando prestador de serviço. Pressão sindical, com atos e ameaça de "parar o país", e negociação de acordo pelo governo provocaram recuo
André Barrocal
 11/04/2007

De um lado, a união das sete maiores centrais sindicais, que promoveram atos e paralisações em vários estados nesta terça-feira (10) e ameaçam "parar o país". De outro, um pedido do presidente Lula e gestos do governo de que está mesmo disposto a negociar uma saída que agrade ao empresariado e à bancada patronal no Legislativo. Foi assim que o Congresso adiou uma polêmica votação prevista para esta quarta-feira (11). Ela poderia derrubar uma decisão presidencial e proibir fiscais de multar empresas que contratam trabalhadores como pessoas jurídicas, para fugir do registro na carteira profissional.

"Queremos tempo para negociar. Se o Congresso votar o veto do presidente Lula, vai ser uma guerra. O país pára na semana que vem", disse o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique da Silva Santos. "Vivemos uma radicalização que não interessa para ninguém", afirmou o presidente da Força Sindical, deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho.

As sete centrais juntaram-se contra a chamada "emenda 3" pois avaliam que a extinção da multa, já aprovada por deputados e senadores, faz uma reforma trabalhista disfarçada. Sem risco de punição, as empresas poderiam demitir funcionários registrados para readmiti-los como PJs, sem pagar direitos como FGTS e décimo-terceiro.

Foi para barrar a "reforma" que as entidades realizaram paralisações pelo país, distribuíram panfletos alertando a população, pressionaram parlamentares no aeroporto de Brasília e coletaram assinaturas para enviar documento ao presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), articulador da votação do veto.

‘Boa-vontade' do governo
Além da mobilização, alguns gestos do governo contribuíram para Calheiros segurar, por ora, a votação. Na última quinta-feira (5), o presidente Lula pediu pessoalmente ao senador que esperasse um acordo. Dias antes, a Receita Federal já informara que suspenderia as multas em casos sobre vínculo trabalhista até que houvesse um acordo sobre a "emenda 3".

Nesta terça-feira (10), mais dois sinais de boa-vontade do governo. Um foi o anúncio da retirada do Congresso de projeto do governo que era considerado duro demais pelo empresariado. O texto oferecia uma alternativa à "emenda 3" e tinha sido enviado ao Legislativo quando o presidente Lula vetou a emenda. O anúncio da desistência foi feito pelo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), Casa mais engajada a favor da "emenda 3".

O segundo gesto foi o início efetivo de uma negociação sobre a emenda. Os ministérios da Fazenda, do Trabalho e da Previdência começaram a discutir uma saída com as centrais descontentes – empresários também serão ouvidos. O objetivo da negociação, aceito pelos sindicalistas, é buscar uma solução para atividades profissionais cuja realidade está distante da carteira assinada e para as quais o espírito da "emenda 3" seria válido. É o caso de consultores de empresas e artistas, por exemplo.

Ficou acertado que as centrais vão tentar se entender sobre critérios que definam PJs legítimos, para voltar a dialogar com o governo dia 23. Algumas idéias já surgiram. Por exemplo: impor limite salarial acima do qual a contratação como PJ estaria liberada; não aceitar a contratação como PJ em casos em que o trabalhador tenha horário a cumprir; e proibir empresa de demitir um funcionário CLT para recontratá-lo como PJ.

A conversão é o grande temor dos sindicalistas. Numa audiência pública sobre a "emenda 3" nesta terça-feira (10) na Câmara, o secretário-geral da CUT, Quintino Serevo, disse que já há indústrias consultando funcionários sobre a idéia de dar baixa na carteira e transformar todos em PJ. "O trabalhador tem receio de que isso acabe de tornando regra", afirmou.

Na mesma audiência, que foi dominada pela posição patronal, o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, deu mais um sinal da disposição do governo para negociar uma solução. Segundo ele, há uma "zona cinzenta" em certos tipos de PJs que requer nova legislação. "De fato, o mundo mudou. Temos de adaptar a legislação nesse sentido e regulamentar o que é relação de trabalho e o que é relação de negócio", afirmou.

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