Brasília – Apesar de o número de conflitos por terras no Brasil ter diminuído 46% no primeiro semestre deste ano, em relação ao mesmo período do ano passado, o número de pessoas mortas nessas disputas foi maior, passando de 14 para 17 casos. Essa é a conclusão de levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT) que será apresentado nesta quinta-feira. Além de os assassinatos terem aumentado entre janeiro e junho, os registros de ameaças de morte, despejos e perseguições também cresceram. As vítimas são, em geral, posseiros, indígenas, trabalhadores sem-terra, lideranças rurais, assentados da reforma agrária e quilombolas. "A causa principal desse aumento na violência é a ineficácia da reforma agrária. Outros entraves para a paz no campo giram em torno dos interesses do capital e da conivência do Estado, quando toma partido de quem tem o poder econômico", afirma o coordenador da CPT, Dirceu Fumagalli.
Segundo ele, o levantamento mostra também que a violência vem se espalhando pelo país. Em 2008 foram contabilizados 14 assassinatos em sete estados, enquanto os conflitos agrários no primeiro semestre deste ano acumulam 17 vítimas fatais em 11 estados. O crescimento da violência e dos registros de trabalho escravo em regiões mais ricas e desenvolvidas economicamente, como Sul e Sudeste, surpreenderam a CPT. Segundo Fumagalli, o Sudeste teve mais ocorrências de trabalho escravo nos seis primeiros meses deste ano do que em todo os meses de 2008. Ao todo, 2.013 pessoas foram encontradas em situação de escravidão em 16 estados.
"O que contribui para a reforma agrária nesse momento é a disponibilidade de terras públicas na região amazônica. Mas é no Nordeste e no Centro-Sul (Centro-Oeste, Sudeste e Sul) onde há maior disputa e menos terra disponível", explica. Para que a reforma agrária seja agilizada, é preciso, entretanto, que o Índice de Produtividade (IP), que por lei é medido pelo governo federal, seja constantemente atualizado. Isso não é feito há 30 anos.
O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento Agrário, Daniel Maia, concorda que o IP pode contribuir para a reforma agrária, mas que a função principal da atualização dele não é essa. "É claro que a desapropriação para a reforma agrária será sempre bem-vinda, mas a finalidade dos índices é provocar, no bom sentido, os produtores para que cumpram a legislação brasileira, no que diz respeito à função social da terra, e garantir alimentos para a população, exportar e gerar economia", ressalta. Os dados de ocupações de terra e de acampamentos, registrados pela CPT anualmente, confirmam que regiões que têm maior concentração de trabalhadores rurais sem-terra são as com o menor número de assentamentos.
Mapeamento
O governo federal já trabalha com a sistematização de dados de 1996 a 2007. Há 17 dias, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, assinou uma portaria interministerial para concluir esse levantamento. O documento está parado no Ministério da Agricultura. Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não publica no Diário Oficial da União (DOU) a nomeação do Conselho Nacional de Política Agrícola, que tem como papel discutir a aplicação do Índice de Produtividade, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, se mobiliza com os ruralistas para que não saiam no prejuízo. A categoria reclama que esse não seria o momento para desapropriar, por causa da instabilidade advinda da crise financeira internacional.