Akratikatêjê e Kyikatejê, PA

Povo Gavião pede ajuda à universidade para fazer um plano de vida

Por Thais Lazzeri

Para manter os 62 mil hectares de floresta Amazônica a salvo do desmatamento que varreu o entorno da sua terra e garantir a sobrevivência de 14 comunidades indígenas, seis caciques procuraram a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) com um pedido grandioso: construir um plano de vida para os Gavião.

Não temos o horizonte que nos é de direito", explica a cacique Kátia Silene Costa, 49 anos, Akratikatêjê - os Gavião da Montanha - com uma marcante agonia na voz firme. Mesma agonia e firmeza com que seu pai já falecido, Payaré, lutou por seis décadas pelos direitos do povo, que habita a da Terra Indígena Mãe Maria, no Pará. Os Gavião já sobreviveram a grandes feridas abertas na floresta. Em especial com a chegada dos empreendimentos governamentais construídos durante a ditadura militar, como a usina hidrelétrica Tucuruí, a rodovia BR-222, as linhas de transmissão da Eletronorte e a Ferrovia dos Carajás, construída pela Vale, na época Vale do Rio Doce.

O tempo não apagou as ameaças. Duplicações da ferrovia e das linhas seguem na pauta. "Esses são os nossos maiores inimigos. Para a gente se proteger deles, fomos pedir ajuda para continuar existindo".

Foto: Fernando Martinho

Ajudar um povo a reencontrar o seu horizonte foi a difícil tarefa apresentada à equipe da Unifesspa por Pepkrakte Jakukreikapiti Ronore Konxarti, conhecido como Zeca Gavião, da aldeia Kyikatêjê. Aos 51 anos, o também cacique quer construir um plano que abarque a proteção do território, assim como questões ligadas à saúde, educação e plantio. "Queremos diagnosticar a situação do povo Gavião para que a nossa raiz e a língua materna permaneçam vivos daqui a trezentos anos", explica Zeca.

A primeira reunião foi no segundo semestre de 2017 com especialistas em meio ambiente e direito. Vieram outras, e professores de outras áreas, como educação e saúde, uniram-se ao time. “Estamos organizando idas ao território para pensar nos próximos passos. Tudo, claro, a partir das demandas que eles trouxerem”, afirmou Rita de Cássia Pereira da Costa, professora da Unifesspa.

A pressão é grande e visível, o território Gavião está cercado por desmatamento. “Só existe floresta dentro do território indígena”, afirma Kátia. Entre 2001 e 2016, o estado do Pará perdeu 11 milhões de hectares de cobertura florestal - em 2016, foram 1.57 milhões de hectares. Os dados são do alerta Glad (monitoramento por satélite que mostra a perda de cobertura vegetal em tempo real), compilados pela Global Forest Watch.

Os Gavião, contou Zeca, já tentaram monitorar a terra para protegê-la do desmatamento. Não funcionou. “Não tínhamos nem equipamento certo nem meios de locomoção rápidos. Enquanto monitorávamos uma área, outra era invadida por pessoas atrás de caça e frutos, como castanha, para revender, o que é ilegal”. As invasões trouxeram outro tipo de impacto: roubos e ao menos um sequestro nas comunidades, que pioram com as pressões que chegam de grande empreendimentos.

A construção do plano de vida com a universidade conta ainda com a entrada de jovens da comunidade na licenciatura, em cursos como engenharia florestal, direito e pedagogia. É uma estratégia de proteção ao território e de manutenção aos modos de vida. O incentivo veio dos mais velhos, cientes de que, com profissionais formados, aumentam as chances de os indígenas serem ouvidos e respeitados dentro e fora do território. "Antes, a formação com anciões dentro da aldeia bastava aos indígenas. Agora não. Se não fizermos esse esforço, ninguém vai fazer", disse Kátia