Borari, PA

Vigilantes querem oficializar seu trabalho de fiscalização

Por Jéssica Mota e Thais Lazzeri

Os irmãos Borari, Dadá e Poró precisam de um reforço de coragem para proteger com as próprias mãos a Terra Indígena Maró, no noroeste do Pará, da invasão de madeireiros. “Vivemos uma vida de terror”, diz Poró, de 27 anos.

Dadá - ou Odair José Alves de Souza, cacique da Aldeia Novo Lugar - sofreu emboscadas, foi espancado e ameaçado até entrar no programa federal de Proteção de Defensores de Direitos Humanos. “Não gosto nem de falar disso, me sinto muito fraco, minha pressão baixa.” Os irmãos arriscam a vida para defender os mais de 42 mil hectares que compõe a terra, às margens do rio Arapiuns, no Pará, e garantir a sobrevivência de 360 pessoas

Foto: Ana Aranha

O conflito se acirrou em 2000, quando os Borari e os Arapiuns, etnias que vivem nesse território, oficializaram na Justiça o pedido de demarcação. Sete anos depois, fizeram a autodemarcação, a primeira no Tapajós, mas até hoje, o processo estava parado na Funai.

Foto: Ana Aranha

Sem resposta do estado, em 2013 foi criado o grupo dos vigilantes. A cada dois meses, 13 homens saem a campo armados em busca dos invasores. Quando encontram madeireiros, confiscam o caminhão, liberam os trabalhadores e só devolvem depois de falar com o dono da empresa. Não apenas os vigilantes, mas todos os moradores da terra indígena são responsáveis pela vigília do território. “Se a pessoa vai caçar, ela monitora a nossa terra. Se for pescar, a mesma coisa. Todos precisam estar atentos o tempo todo a vestígios de invasão e barulho de motosserra”, disse Poró

Desde a criação do grupo, eles conseguiram derrubar todos os planos de manejo, locais onde madeireiras tinham permissão para explorar a floresta dentro da terra indígena. Municiados pelos Borari, uma das grandes operações de fiscalização ocorreu em novembro de 2014, quando fiscais interditaram as serrarias e embargaram os planos de manejo na área.

Foto: Ana Aranha

Duas semanas depois, no que foi interpretado como uma resposta à operação, um juiz federal publicou sentença determinando a “inexistência” da identidade Borari e Arapiuns e pedindo a suspensão do processo de demarcação, liberando assim a exploração do território por madeireiras.

A sentença foi amplamente criticada por violar o direito pela auto-identificação indígena e foi derrubada posteriormente, mas sua ousadia revelou a força de interesses na disputa pela floresta que fica dentro da Terra Indígena Maró.

Nessa luta de forças desiguais, o Conselho Intercomunitário Arapiun e Borari agora faz uma aposta ainda mais ousada. Eles querem institucionalizar a ação contra os madeireiros. “Queremos oficializar a nossa vigilância”, disse Poró. No final de abril, ele vai à Brasília durante o Acampamento Terra Livre para pressionar o Ministério da Justiça pela demarcação da reserva e para falar dos vigilantes, que fazem o papel do Estado sem nem receber por isso. “Nós estamos dentro do que é nosso, eles (os madeireiros) é que têm que ter medo.”

Foto: Ana Aranha

Desde a formação do grupo de vigilantes, o desmatamento dentro da terra estagnou. No entorno, porém, a devastação só cresce. A região do município de Santarém, onde fica a TI Maró, está entre as 14 áreas responsáveis por 50% de todo o desmatamento no estado do Pará, segundo dados compilados pela Global Forest Watch entre 2001 e 2016.

Para continuar protegendo a área, a ação dos Borari e Arapiuns revela-se como fundamental. “A Funai não tem condições de fazer a proteção, a proteção institucional é inexistente”, afirmou Rodrigo Oliveira, assessor jurídico do Ministério Público de Santarém. Em 18 de abril de 2018, a Funai encaminhou o processo da terra indígena Maró chegou ao Ministério da Justiça.