Tremembé, CE

Intimidação e ameaças contra indígenas reduziram proteção

Por Thais Lazzeri

Os indígenas de Tremembé da Barra do Mundaú não baixaram guarda mesmo depois de receber uma boa notícia: a decisão judicial que lhes dava posse permanente das terras que ocupam no município de Itapipoca, no Ceará. Além de famílias de não-indígenas que vivem no território, há quase duas décadas o Grupo Nova Atlântida tenta construir, ali, parte do “maior projeto turístico do mundo” - como a empresa espanhola denomina o complexo hoteleiro que pretende levantar sobre o território indígena que está em meio ao processo de homologação.

Foto: Iago Barreto

Se já havia hostilidade aos indígenas antes da decisão judicial que favorece os Tremembé, depois dela o conflito só piorou. Com medo da retaliação, os indígenas suspenderam parte das atividades de monitoramento e proteção ao território, que é feito por 12 brigadistas e 30 ambientalistas indígenas com apoio de toda a comunidade. “Você já pensou sentir medo de andar pelo o que é seu de direito? De não poder ir e vir? Para não acontecer coisa pior, os meninos deixaram de ir”, afirmou a cacique Adriana Carneiro de Castro, de 46 anos.

Para a Funai demarcar e homologar os 3.580 hectares, as 130 famílias de não indígenas que moram ali precisam ser ressarcidas pelas suas casas e construções, um processo lento e burocrático que leva o nome de desintrusão. Mas, o mais difícil até agora é que essas pessoas não querem sair. Pior, elas estariam promovendo ações para constranger e até ameaçar os indígenas.

Foto: Iago Barreto

Os invasores, dizem os Tremembé, arrancaram e destruíram algumas placas da Funai que delimitavam as fronteiras da terra. Depois, teriam passado a vigiar os indígenas mata adentro. Uma professora Tremembé afirmou, em depoimento ao Ministério Público Federal, que ela e os alunos foram ameaçados por capangas. Por fim, há relatos de intimidações com armas brancas. O processo da desintrusão está parado há dois meses no Fórum de Itapipoca. A reportagem procurou o Juiz Federal Felipe Graziano da Silva Turini, responsável pelo processo. Por e-mail, a assessoria da Justiça Federal informou que o juiz estava de férias e “só retornará às suas atividades na segunda quinzena de maio.”

Foto: Iago Barreto

Uma das causas de desmatamento dentro da terra indígena são as queimadas provocadas pelos posseiros. As plantações, antes de pequeno porte, aumentaram, segundo os indígenas. “Eles estão acabando com o que restou da floresta”, diz Adriana. Os focos de destruição aparecem no levantamento da Global Forest Watch. Nos últimos seis anos, é possível observar a expansão do fogo. No Ceará, 31 cidades foram responsáveis por 51% do desmatamento entre 2001 e 2016. Itapipoca é a nona no ranking.

Segundo denúncia dos Tremembé, representantes do Grupo Nova Atlântida fazem reuniões com os não-índios para que eles não deixem o local. “Sempre os não-índios tiveram junto com a empresa Nova Atlântida em toda atividade e conflito dentro da terra indígena”, afirmou Ezequiel Tremembé, sobrinho de Adriana.

Foto: Iago Barreto

Parte da construção do megaempreendimento com orçamento de US$ 15 bi, segundo a imprensa cearense, está prevista para acontecer dentro da Tremembé da Barra do Mundaú. Na prática, ocuparia 86% da área total da terra indígena. O projeto teve o licenciamento ambiental suspenso, segundo informações da Funai e do Ministério Público Federal. A reportagem tentou contato com a empresa no Brasil e no exterior, assim como com outras empresas do mesmo grupo, mas não teve resposta.

Colaborou Jéssica Mota