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AS HISTÓRIAS de tocaias e jagunços nas terras banhadas pelo rio São Francisco não estão apenas no século passado ou imortalizadas nas páginas de livros como Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. A violência que permeou a travessia de Riobaldo e Diadorim ressurge nas margens do Velho Chico no norte de Minas Gerais com uma nova roupagem. Drones, helicópteros, homens desfilando em picapes com armas de grosso calibre e uma milícia rural que atua com o aval de autoridades que avançam sobre comunidades tradicionais.

Nos últimos seis anos, um sem-terra morreu e outros nove ficaram feridos em ataques armados. Quase a metade das lideranças de movimentos sociais de Minas Gerais que estão sob ameaça vive no norte do Estado. Uma comunidade de pescadores teve casas destruídas e foi expulsa sem ordem judicial. Lideranças só andam à noite – camuflados pela escuridão – e usam os atalhos do rio para escaparem de emboscadas.

O temor é que, se não houver uma mudança na política fundiária promovida pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, as águas do Velho Chico podem ficar vermelhas. De sangue. A Repórter Brasil visitou 12 comunidades tradicionais de pescadores, vazanteiros e quilombolas, além de grupos que lutam pela reforma agrária na região, e mostra neste especial a violência do agronegócio que voltou a assolar camponeses que vivem às margens do rio São Francisco.

A gente tem que ir para cidade, mas lá não tem terra. Vou para rua, mas contrariado

Sebastião de Paula e sua mulher, Nelsina, foram despejados da Fazenda Norte América, que já foi palco de dois ataques armados a sem-terra

Fomos expulsos e escorraçados à mão armada. Tiraram uma terra sagrada da mão da gente para entregar para o fazendeiro

Clarindo Pereira dos Santos lamenta que, junto a outras 30 famílias de pescadores, foi expulso da margem do rio

Estamos sem acesso às margens dos rios. Não estão aceitando mais que a gente faça um barraquinho para poder pescar

Magno Seixas, presidente da colônia de pescadores de Ibiaí, diz que os fazendeiros impedem que os pescadores fiquem nas margens do rio para descansar durante a pescaria

A gente trabalha na ilha porque não tem acesso às margens. O negócio deles [fazendeiros] é plantar capim e criar boi para eles venderem

Maria do Carmo Paiva Silva também lamenta ter sido despejada das margens do rio

Nós estamos só trabalhando, nunca roubamos nada aqui, o que fizemos foi lutar pela terra, pela vazante do rio

Ana Cecília de Alencar, da comunidade Ilha da Porteira, conta que também já foi ameaçada por fazendeiros

O rio São Francisco é tudo para gente. É nossa sobrevivência e o ganha pão dos nossos filhos

Ítala de Souza, da comunidade de Caraíbas, onde os moradores não têm documentação da terra, pois o processo de demarcação foi paralisado

Saudamos a memória do companheiro Cleomar de Almeida, dirigente da LCP [Liga dos Camponeses Pobres] assassinado por pistoleiros e policiais a mando do latifúndio

Placa e cruz lembram o assassinato do sem-terra Cleomar, executado em 2014

A história do latifúndio é a história do fazendeiro grileiro que compra um pouco com documento e o resto ele toma na marra

Arnaldo da Silva Vieira, da comunidade quilombola de Croatá, sobre as ameaças sofridas pelos moradores da região

Trabalhamos juntos para Deus abençoar e conseguirmos um pedaço de terra

Veri Quaresma, que vive em um acampamento ligado ao MST, afirma que os moradores estão sob constante ameaça de despejo

Vivemos como na época dos nossos avós. Iluminamos com candeeiro e bebemos água do rio. A luta nossa é ser reconhecido como quilombola para conseguir energia e água

Marinalva Mendes da Rocha alerta sobre a falta de infra-estrutura da comunidade Ilha das Cabaceiras

A água está longe, não tem energia, não tem nada. Seria bom se o governo lembrasse da gente

João Carlos de Araújo afirma que os moradores da comunidade da Barrinha não têm água potável e nem energia elétrica

Eles [fazendeiros] vêm para cima, andam armados e mostrando que estão armados

Um dos líderes da comunidade Maria Preta, Reinaldo Pereira da Silva, só sai de casa à noite, para se proteger na escuridão

O mapa da violência
Clique no mapa para conhecer a história dos moradores que vivem sob ameaça

SÃO PEDRO DA GRAÇACAPITÃO ENÉASFRANCISCO ENÉASPEDRAS DE MARIA DA CRUZBURITIZEIROSão FranciscoCACHOEIRA DO MANTEIGAItacarambiJanuáriaJAPONVARIBIAIREGIÃO NO NORTE DE MINAS GERAIS