Empresa condenada a pagar a maior indenização da história: R$ 5 milhões

O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região elevou nesta terça-feira (21), de R$ 3 milhões para R$ 5 milhões, condenação imposta à empresa Lima Araújo Agropecuária Ltda por escravizar trabalhadores em suas fazendas Estrela das Alagoas e Estrela de Maceió, em Piçarra, sul do Pará
Por Leonardo Sakamoto
 21/02/2006

O Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região confirmou, na manhã desta terça-feira (21), a condenação imposta à empresa Lima Araújo Agropecuária Ltda. por escravizar trabalhadores em suas fazendas Estrela das Alagoas e Estrela de Maceió, em Piçarra, sul do Pará. A decisão, tomada de forma unânime pelos cinco desembargadores da 1a turma do Tribunal, ainda aumentou a indenização por dano moral coletivo para R$ 5 milhões. Com isso, a empresa bateu seu próprio recorde. Até então, a maior condenação por trabalho escravo na história do país havia sido a da própria Lima Araújo, no seu julgamento em primeira instância na Justiça do Trabalho (R$ 3 milhões).

O aumento foi proposto pela relatora do processo, Suzy Koury. Mas o prejuízo da empresa seria ainda maior se a sugestão do juiz Marcus Lousada – que propôs o aumento do valor a ser pago para R$ 20 milhões – tivesse sido acatada. Lóris Rocha Júnior, o procurador do Ministério Público do Trabalho que ajuizou a ação, e Hermes Tupinambá, juiz aposentado do TRT da 8a Região e advogado da Lima Araújo, também participaram da sessão, que durou duas horas. Ambos devem recorrer. O advogado do réu para inverter a decisão, e o MPT para aumentar o valor a ser pago.

No julgamento, o desembargador Georgenor Franco Filho ressaltou a atuação conjunta do Ministério Público do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego e da Justiça do Trabalho no combate à escravidão. Lembrou também que os autos comprovavam as reinteradas infrações à legislação trabalhista cometidas pela empresa e seus proprietários.

Reincidente
A empresa Lima Araújo Agropecuária Ltda. foi condenada no dia 13 de maio de 2005 a pagar R$ 3 milhões de reais e a adotar uma série de medidas para se ajustar à legislação trabalhista – obrigação mantida pela decisão desta terça-feira do TRT. A empresa havia reduzido 180 pessoas (entre os quais nove adolescentes e uma criança) à condição de escravas em suas fazendas. Por três vezes, essas propriedades rurais foram palcos de libertação de trabalhadores em ações de fiscalização: em fevereiro de 1998, outubro de 2001 e novembro de 2002. A decisão da primeira instância foi proferida pelo juiz Jorge Vieira quando este era titular da 2ª Vara do Trabalho de Marabá, que acolheu uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho.

Este é o maior valor já aplicado em uma sentença por trabalho escravo contemporâneo. A primeira indenização milionária (R$1.350.440,00) havia sido obtida através de um acordo entre o Ministério Público do Trabalho, a Justiça do Trabalho e a empresa Jorge Mutran por escravidão na fazenda Cabaceiras, em Marabá (PA), em agosto de 2004. Esse acordo também foi selado por Jorge Vieira.

O processo da primeira instância contra a Lima Araújo, que possui quase 100 páginas, determinou a quebra dos sigilos bancário e fiscal, decretou a indisponibilidade de bens e deferiu o bloqueio imediato e preventivo do valor de R$ 3 milhões que fosse encontrado em contas bancárias em nomes dos réus: as alagoanas Lima Araújo Agropecuária, a PH Engenharia, a Construtora Lima Araújo e os proprietários dessas três empresas – Fernando Lyra de Carvalho e Jefferson de Lima Araújo Filho.

A juíza Sulamir Monassa concedeu liminar anulando a indisponibilidade dos bens dos envolvidos, que havia sido erguida para garantir o pagamento da condenação gerada pela ação civil. Na época, a decisão foi criticada por entidades da sociedade civil envolvidas no combate ao trabalho escravo, pois corria o risco dos réus sacarem o dinheiro.

O que veio a acontecer. Posteriormente, a liminar foi cassada e a decisão de Jorge Vieira reestabelecida. Porém, de acordo com o processo, quando isso ocorreu os réus já haviam sacado todo o dinheiro de suas contas, de modo que o bloqueio de R$ 3 milhões ficou impossibilitado. No julgamento em segunda instância, os desembargadores mantiveram a indisponibilidade dos bens decretada por Vieira.

O montante de R$ 5 milhões pode assustar, mas é bem menor se for considerado o valor pedido pelo Ministério Público do Trabalho do Pará em sua ação: R$ 85,056 milhões. O valor corresponderia a 40% do patrimônio estimado pelo MPT das duas propriedades, que têm como principal atividade a criação de gado para corte. Em valores, este foi o maior processo já movido contra uma empresa por trabalho escravo no Brasil. A própria testemunha de defesa, um funcionário da fazenda, afirmou que havia duas categorias de trabalhadores: os fixos e os temporários, e que a situação destes últimos, instalados em barracões de lona em péssimas condições de higiene, era bem pior.

A Lima Araújo já havia sido ré em outras três ações por trabalho escravo, tendo sido condenada a pagar R$ 30 mil por danos morais coletivos e flagrada cometendo o mesmo crime logo depois. De acordo com Lóris Rocha Júnior, procurador do Trabalho responsável pela ação milionária, as constantes reincidências da Lima Araújo na utilização de mão-de-obra escrava, a situação degradante em que sempre eram encontrados os seus funcionários e o descaso com a Justiça e o trabalho dos fiscais justificaram o tamanho do pedido.

“Eles não respeitam a lei ou as autoridades constituídas. Tanto que, enquanto tramitava uma ação na Justiça do Trabalho [por causa de trabalho escravo encontrado em uma das fazendas], uma outra fiscalização do grupo móvel do MTE encontrou novamente escravos na Lima Araújo”, afirma Rocha. Além disso, a empresa já havia assinado um termo de compromisso na Justiça do Trabalho, garantindo que não haveria mais descumprimento da legislação trabalhista.

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