McDonald’s devasta Amazônia, acusa ONG

 07/04/2006

CLAUDIO ANGELO
Editor de Ciência da Folha de S.Paulo

Depois da conexão hambúrguer, a conexão Chicken McNuggets. Um relatório da ONG ambientalista Greenpeace, divulgado ontem, afirma que consumidores de fast-food na Europa podem estar contribuindo involuntariamente com o desmatamento na Amazônia, ao consumir frango alimentado com soja plantada na região da floresta.

O documento, intitulado "Comendo a Amazônia", afirma que o McDonald's, maior rede de fast-food do mundo, compra frango de uma subsidiária da multinacional americana de alimentos Cargill, apontada pelo Greenpeace como uma das principais "criminosas" por trás da expansão predatória da soja na Amazônia.

A Cargill disse que não poderia comentar o relatório, por tê-lo recebido somente ontem. A direção do McDonald's no Reino Unido disse que iniciaria "imediatamente" uma investigação sobre o caso.

"A produção da soja incorpora uma enorme cadeia de ilegalidades, e elas terminam no prato de alguém na Europa", disse ontem o coordenador da campanha Amazônia do Greenpeace, Paulo Adário. Essas ilegalidades vão do desmatamento além da reserva legal (a lei brasileira determina que 80% da área de propriedades na Amazônia deve ser mantida como floresta, determinação que quase ninguém cumpre) até o uso de trabalho escravo, visto em fazendas do Pará e de Mato Grosso.

Ele afirmou que o relatório é resultado de um ano de investigações feitas pela ONG, que acompanhou carregamentos de soja saídos da Amazônia.

Multinacionais

Segundo o Greenpeace, a soja é hoje a maior ameaça à floresta, e teve um papel crucial na explosão do desmatamento nos últimos anos (em 2003/2004, a devastação chegou a 27.000 km2). Mato Grosso, principal produtor do grão no país –e campeão absoluto de desmatamento–, viu a área plantada com soja dobrar desde 1996.

Empurradas pelo aumento da demanda mundial e pela fartura de terras na Amazônia, grandes multinacionais de alimentos dos EUA começaram a investir em infra-estrutura, como silos e estradas, e no financiamento de sojicultores na região. Segundo o relatório do Greenpeace, 60% do financiamento à produção de soja no país vem de três empresas: a ADM, a Bunge e a Cargill.

Esta última é classificada como a principal vilã das três. A acusação se deve sobretudo à construção de um porto para escoamento de soja em Santarém, no Pará. O porto da Cargill sofreu contestações por parte do Ministério Público, que considerou insuficientes os estudos de impacto ambiental apresentados para a obra. O porto foi, ainda, o indutor da recente expansão da soja para a região de Santarém.

Do porto de Santarém a soja vai para Liverpool, na Inglaterra, onde é processada pela Sun Valley, subsidiária da Cargill que usa a oleaginosa como ração de frango. A Sun Valley é o principal fornecedor de frango para o McDonald's em 46 países.

Frango escaldado

Adário apelidou essa teia comercial de "conexão Chicken McNuggets", em alusão à expressão "conexão hambúrguer", criada pelo ecólogo Norman Myers na década de 1980 para explicar como o aumento no consumo de carne nos EUA fazia aumentar o rebanho bovino e o desmatamento na América do Sul. "Estamos pedindo que o McDonald's tire a Amazônia do cardápio", disse.

"Estamos muito preocupados com essas questões ligadas ao ambiente tanto em relação à nossa atuação como às responsabilidades de toda nossa rede de fornecedores", disse o diretor de Qualidade e Segurança do McDonald's Europa, Keith Kenny. "Além de analisar cuidadosamente o relatório iniciaremos uma investigação imediatamente sobre o caso."

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