Congresso

Deputado financiado por escravagista é contra lei que combate esse crime

Abelardo Lupion, reeleito deputado federal em 2006, recebeu doação de empresa dona de fazenda onde já foram libertadas mais de cem pessoas. Ele é contra projeto que prevê confisco das terras onde foi flagrado trabalho escravo
Por André Campos
 08/02/2007

Reconhecido como um dos mais atuantes membros da bancada ruralista no Congresso, o deputado federal Abelardo Lupion (PFL-PR), reeleito em 2006, recebeu R$ 2 mil da Jorge Mutran Exportadora para sua campanha. A empresa é proprietária da Fazenda e Castanhal Cabaceiras, de onde já foram libertadas 101 pessoas em ações do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A propriedade é uma das que figuram na "lista suja" do trabalho escravo – cadastro do MTE que relaciona as fazendas que comprovadamente utilizaram esse tipo de mão-de-obra. A Cabaceiras fica no Pará, distante da base política de Lupion.

Lupion é um dos principais opositores da Proposta de Emenda Constitucional nº 438/2001, conhecida como "PEC do trabalho escravo". Ela prevê a expropriação de terras onde for cometido esse crime e sua posterior destinação a projetos de reforma agrária. Em agosto de 2004, a PEC foi votada em primeiro turno na Câmara dos Deputados, tendo sido aprovada com 326 votos. Na ocasião, Lupion foi um dos 10 parlamentares que votaram contra a medida. A aprovação da PEC é uma das metas do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, lançado em 2003 pelo governo federal.

Para João Alfredo (PSOL-CE), deputado federal na legislatura anterior, Lupion é uma das principais referências negativas no Congresso quando se trata de questões agrárias. "Ele quer punir as ocupações de terra, mas quer deixar impunes aqueles que utilizam o trabalho escravo."

João Alfredo foi relator da CPMI da Terra, comissão parlamentar instituída para realizar um amplo diagnóstico da estrutura fundiária brasileira, além de indicar soluções para os principais problemas do campo. Seu relatório propunha uma série de prioridades no combate à escravidão, entre elas o fortalecimento de instâncias que atuam no combate a esse crime, além da aprovação da PEC 438/2001.

Os deputados e senadores membros da Comissão, no entanto, derrubaram por maioria o parecer final do deputado do PSOL, escolhendo um relatório paralelo redigido por Lupion. Uma das principais críticas recebidas pelo documento aprovado foi justamente o fato de ele não fazer nenhuma menção ao tema do trabalho escravo.

Lupion Responde
Procurado pela Repórter Brasil, Abelardo Lupion respondeu, por meio de sua assessoria de imprensa, que "o relatório da CPMI da Terra não aborda o tema do trabalho escravo pelo fato de o documento tratar fundamentalmente de conflitos agrários." Ela esclarece também que o deputado é contra a PEC 438/2001 por ser contra a expropriação em si. Primeiro, de acordo com ele, é preciso que os casos sejam julgados em todas as instâncias possíveis para que só depois, quando não couber mais recurso, o proprietário seja punido. Entidades que atuam no combate à escravidão, no entanto, afirmam que, uma vez aprovada a PEC, a expropriação só ocorreria após um processo legal com decisão transitada em julgado – trâmite que dá amplo espaço de defesa para o proprietário das terras acusado de utilizar esse tipo de mão-de-obra.

Com relação à doação de campanha recebida da Jorge Mutran Exportadora, Abelardo Lupion explica que defende o agronegócio e recebe doações de várias pessoas deste setor, não havendo como investigar o passado de cada uma delas. "Em momento nenhum ele sabia dos problemas envolvendo a empresa", diz nota da assessoria do deputado, que atesta ainda o total repúdio do parlamentar contra quem pratica esse crime. "O que não pode acontecer é registrar como trabalho escravo um problema trabalhista de outro tipo, como a falta de carteira assinada."

Além de Lupion, outros 15 candidatos que concorreram nas eleições de 2006 receberam doações de pessoas ou empresas incluídas na "lista suja". Entre eles, quatro deputados federais eleitos – Dagoberto Nogueira Filho (PDT-MS), Eunício de Oliveira (PMDB-CE), Giovanni Queiroz (PDT-PA) e Olavo Calheiros (PMDB-AL) -, três não eleitos – Francisco Luiz Escórcio (PMDB-MA), Eduardo Bernis (PFL-MG), Marcos Sant´anna (PPS-MG), além de dois governadores – Marcelo Déda (PT), em Sergipe, e Ana Júlia Carepa (PT), no Pará.

Também integram essa lista o senador reeleito José Sarney e outros dois senadores que foram derrotados em disputas pelo governo de seus estados – José Maranhão (PMDB-PB) e Garibaldi Alves (PMDB-RN). Dois deputados estaduais eleitos – Luana Ribeiro (PL-TO) e Francisco Dantas (PMDB-MA) -, além de um que não se elegeu – Alberto Feitosa (PL-PE) – completam essa relação.

Leia mais:
Blog do Sakamoto – financiamento escravagista

 

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