O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) pretende intensificar a fiscalização para coibir trabalho infantil em clubes de futebol nos próximos meses. A morte do adolescente Wendel Junior Venâncio da Silva, de 14 anos, durante teste para integrar as categorias de base do Vasco, em 9 de fevereiro, fez com que este passasse a ser o tema da próxima reunião dos coordenadores da Divisão de Fiscalização do Trabalho Infantil.
Torcida do Vasco exibe bandeira com as cores do Brasil. Foto: Marcelo Sadio/vasco.com.br |
“A morte do garoto impulsionou as ações que já estávamos prevendo”, diz Luiz Henrique Ramos Lopes, coordenador da divisão dentro do MTE. A exploração de adolescentes, de acordo com o responsável por comandar a fiscalização do governo federal, envolve questões complexas como tráfico de pessoas, com o aliciamento de garotos em regiões pobres por olheiros vinculados a clubes grandes. O temor é que, com a realização da Copa do Mundo de futebol no Brasil em 2014 e das Olimpíadas no Rio de Janeiro em 2016, o número de jovens explorados aumente no país.
Adolescentes de 14 anos a 16 anos que compõem as equipes de base de clubes devem ser registrados como aprendizes, de acordo com autoridades ouvidas pela reportagem. Esta é a interpretação da lei feita pelo MTE, pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e por representantes de Conselhos Estaduais de Defesa da Criança e do Adolescente. É com base nesta premissa que o MPT pretende processar o Vasco por trabalho infantil. Porta-vozes da diretoria do clube têm, porém, uma interpretação diferente da lei. Hoje, no Brasil, nenhum clube tem cursos validados no sistema nacional de aprendizagem para fazer os registros considerados necessários pelas autoridades.
Resolução
Além da pressão do MTE, os clubes também devem sofrer pressão por parte do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), que pretende obter no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) uma resolução reforçando a necessidade de proteção legal para os adolescentes vinculados a clubes com idades entre 14 e 16 anos.
“Estamos trabalhando também junto aos conselhos estaduais. Os clubes devem ter responsabilidade inclusive nas peneiras. A proteção deve ser integral", defende Isa Oliveira, secretária-executiva do Fórum. “O Brasil está organizando os dois maiores eventos esportivos do mundo e este é o momento de o país ter atenção especial com a criança e adolescente. Precisamos promover a cidadania, o direito à vida, e à prática esportiva saudável neste momento. Temos dois caminhos. Ou nos omitimos e deixamos que essa exploração aconteça, ou criamos estratégias para realizar dois eventos cidadãos”.
Carmen Oliveira, secretária dos Direitos da Criança e do Adolescente. Foto: José Cruz/Agência Senado |
Isa destaca que, da enorme quantidade de garotos que almejam e tentam obter sucesso em carreiras esportivas, pouquíssimos são os que realmente conseguem. “Há riscos de conseqüências psicológicas. O não sucesso traz frustração, baixa estima, tudo isso para um ser humano em desenvolvimento traz prejuízos”, afirma, destacando que não é pouco dinheiro que os clubes costumam lucrar com as revelações encontradas nas peneiras.
Para Carmen Oliveira, secretária nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, é fundamental que o Brasil organize mecanismos para coibir a exploração de adolescentes antes da realização dos grandes eventos. “O país do futebol não pode ser um país em que o futebol seja um agente de violação de direitos de crianças e adolescentes. Essa imagem é muito negativa”.
Ela ressalta que, mesmo na condição de aprendiz, o adolescente tem direito à educação, convivência familiar e comunitária. E lembra que, nem sempre, as violências sofridas chegam a conhecimento público. “Temos conhecimento de violações graves, mas é difícil termos denúncias. Quem vai denunciar o clube? A criança? A família, que depende do dinheiro?”, questiona.
Leia também:
Após morte de adolescente, MPT pretende processar Vasco por trabalho infantil
Contra trabalho infantil no futebol, OIT cobra mudanças nas categorias de base