O fazendeiro Francisco Gil Alencar, dono do pequeno zoológico “Gilrassic Park” no município de Santa Inês (MA), teve 14 bens bloqueados pelo Tribunal Regional Trabalho da 16ª região (TRT-16) na última terça-feira (4). Em março deste ano, uma fiscalização do Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo libertou 12 trabalhadores em condições análogas à escravidão em uma de suas fazenda de gado, próxima ao zoológico.
Leia a matéria da Repórter Brasil que relata a inspeção trabalhista
O bloqueio é resultado do andamento de uma ação civil pública (ACP) impetrada pela procuradora do trabalho Christiane Nogueira, que participou da inspeção do trabalho à época. No processo, ela pede R$3 milhões em indenizações por danos morais coletivos, citando a poesia de Manuel Bandeira, “O Bicho”, para retratar a situação degradante na qual os trabalhadores se encontravam: “Vi ontem um bicho […] catando comida entre os detritos. Quando achava alguma coisa, não examinava nem cheirava: engolia com voracidade. O bicho não era um cão. Não era um gato. Não era um rato. O bicho, meu Deus, era um homem".
Na fiscalização, auditores do trabalho, policiais rodoviários federais e procuradoria do trabalho encontraram trabalhadores recebendo alimentação ruim (fotos: MTE)
O juiz Carlos Eduardo dos Santos concedeu uma liminar em razão do dano moral coletivo e determinou o bloqueio dos 14 bens do pecuarista, entre prédios, fazendas, casas, lotes e um sítio. Também determinou o cumprimento de 27 medidas em defesa dos trabalhadores resgatados.
“Implantar no inconsciente de um trabalhador que sua alimentação é menos importante que a de animais criados em cativeiro, e arriscar a saúde dessas pessoas pelo não fornecimento de condições mínimas de higiene, me parece aviltar o imponderável”, declarou o magistrado.
Enquanto o fazendeiro mantinha mais de 900 animais de 100 espécies diferentes e raras com alimentação especial e até a supervisão de um zootecnista em seu zoológico "Gilrassic Park", os trabalhadores mal recebiam comida, tinham os salários atrasados e habitavam um barraco em péssimas condições.
Diferença entre a comida que recebiam os animais e os trabalhadores (mais para cima) chamou a atenção da fiscalização do grupo móvel
Eles haviam sido contratados para fazer o roçado manual do pasto dos bois de Francisco Gil em condições absolutamente subumanas, e não dispunham de equipamentos de proteção individual (EPI) ou carteira de trabalho assinada. O alojamento do grupo estava no meio de um matagal, em localidade isolada geograficamente e sem proteção contra tempestades ou animais peçonhentos, às margens de um igarapé onde o gado bebia e urinava.
Pelo flagrante de trabalho escravo, o pecuarista também poderá ser incluído na “lista suja” do trabalho escravo – registro mantido pelo MTE com empregadores que já usaram mão-de-obra em condições de escravidão contemporânea. A criação de gado bovino é o segmento econômico mais recorrente no cadastro de nomes “sujos”: 158 de um total de 391 entradas.
A Repórter Brasil procurou o fazendeiro Francisco Gil para comentar o caso duas vezes. Uma funcionária do zoológico disse que passaria o recado a ele, mas não houve contato.
*com informações da Assessoria de Comunicação da Procuradoria do Trabalho da 16ª região (PRT-16)