Desde o século 16, os rios Paraguai e Paraná foram fundamentais para a colonização da região central da América do Sul, tornando-se posteriormente vias de escoamento de riquezas. Hoje, ainda são considerados estratégicos para as pretensões dos integrantes do Mercosul e da Bolívia, país que não possui saída para o mar. Chatas e rebocadores transitam pelos 3.342 quilômetros da hidrovia (1,4 mil em território brasileiro), da região de Cáceres ao porto de Nueva Palmira, no Uruguai. Os principais produtos escoados são soja, carne, madeira e minérios.
No final da década de 90, o governo federal e os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul tentaram pôr em prática um projeto que aumentaria a capacidade da hidrovia. Surgiram propostas como a retificação do rio Paraguai na região em que ele é mais sinuoso, construção de diques, dragagem – além da construção e pavimentação de estradas. "Esses projetos não têm nenhuma sensibilidade ecológica", afirma Gilney Viana, professor de Saúde Pública da UFMT e deputado estadual. "São pensados por teóricos de gabinete, que não convivem com o ecossistema e com a população, considerando apenas os ganhos econômicos e não os impactos socioambientais de longo prazo."
Estudos mostravam que os gastos com as intervenções seriam menores que os lucros. Entidades da sociedade civil, ribeirinhos e povos indígenas protestaram, e a repercussão foi grande dentro e fora do Brasil.
Por isso e devido à falta de recursos do governo, o projeto global foi deixado de lado. Mas, ao longo do rio Paraguai, as mudanças continuam a surgir. A ampliação do porto de Morrinhos, próximo a Cáceres, tem gerado atos de protesto da população. "O trânsito das chatas já está destruindo as margens do rio", denuncia Solange Ikeda, da Unemat.
O governo de Mato Grosso do Sul tem outra posição. Na realidade nunca se tratou de ‘ampliação’ da hidrovia, pois isso é absolutamente inviável, tanto no aspecto ambiental quanto técnico", informa Heitor Miranda dos Santos, superintendente de ações estratégicas e relações internacionais do governo.
"Não existem quaisquer projetos que venham a causar impacto ambiental e/ou prejuízos à região. Ao contrário, o que buscamos é exatamente a adequação dos meios de transportes à natureza. Isso é uma questão de inteligência e de sobrevivência. Mas é muito importante uma discussão ampla com a sociedade organizada – gente que conheça a região – e uma avaliação da importância da hidrovia para as populações, sem radicalismo e com muita racionalidade."
Há projetos conjuntos com a marinha do Brasil para a implantação de uma carta fluvial eletrônica, que permita o monitoramento das barcaças e das condições de navegabilidade, usando sistema de orientação e localização por satélite. Atualmente, além dos produtores, as empresas de transporte fluvial, algumas estrangeiras, são as maiores interessadas.
Viana diz que a ampliação de ferrovias como a Ferronorte, por exemplo, é uma alternativa viável, com custo compatível e que geraria menos impactos. O transporte na região continuaria multimodal, utilizando-se também os sistemas rodoviário e hidroviário, mas em menor escala.