Os olhos de Porto Alegre voltam-se para Chávez

Presidente venezuelano vem a Porto Alegre neste domingo para participar de encontros políticos e de ato em favor do povo de seu país
Especial para o Repórter Brasil
 25/01/2003

Porto Alegre. Ao meio-dia deste domingo, Hugo Chávez, presidente eleito da República Bolivariana da Venezuela, pousa no aeroporto internacional Salgado Filho. Uma vez na capital gaúcha, participa de encontros políticos; discursa em ato a favor do povo de seu país e conversa com lideranças do Fórum Social Mundial. Será a terceira vez que o presidente venezuelano visita o Brasil somente neste janeiro de 2003. Em cada uma delas, Chávez amplia sua base de apoio: sabe que o Brasil é o seu principal aliado internacional neste momento de crise. Nacionalmente, o povo venezuelano lhe sustenta. E a elite – a mídia, o sindicalismo pelego, os empresários e parte do exército – ensaia novo golpe.

O presidente venezuelano chega à capital gaúcha por volta do meio-dia (confira a programação de Chávez). Vem a convite do Comitê Gaúcho de Solidariedade ao Povo Venezuelano, cuja representante é a deputada federal Luciana Genro (PT-RS). Encontra-se também com o prefeito de Porto Alegre, João Verle, e com o governador do Rio Grande, Germano Rigotto. Na parte da tarde, pode se reunir com nomes expressivos do cenário internacional, como Noam Chomsky, Eduardo Galeano, Adolfo Peres Esquivel, Sebastião Salgado. Esse encontro, porém, não está confirmado. Certeza, apenas, é que será recebido pelos jornalistas franceses Ignácio Ramonet e Bernard Cassen, do Le Monde Diplomatique, e pelo sociólogo brasileiro, Emir Sader.

Polêmica sadia

A presença de Chávez em Porto Alegre, durante o Fórum Social Mundial, divide a opinião dos organizadores internacionais e brasileiros, mas agrada aos participantes em geral. O centro da polêmica é a Carta de Princípios do FSM, documento que rege a ação dos participantes e organizadores. Um tanto ambíguo, o documento permite leituras variadas. E elas nem sempre são afins.

O presidente da Associação Brasileira de Ongs (Abong), Sérgio Haddad, por exemplo, afirma não ter nada contra a vinda do líder da revolução bolivarina. “Ele não representa nenhuma organização armada”, afirma, baseado na Carta de Princípios. Roberto Savio, membro do Conselho Internacional do FSM, não vê da mesma forma. Na edição deste sábado do jornal Terra Viva, da agência de notícias IPS, o jornalista disse, também baseado na Carta de Princípios, que Chávez não poderia vir a Porto Alegre por não ter sido convidado nem pelo Conselho Internacional, nem pelo Comitê Brasileiro, “que são os únicos organismos que podem fazê-lo”. Quem está certo?

A carta de princípios do FSM destaca a possibilidade de participação de governantes no evento, como demonstra este trecho do documento Dúvidas mais freqüentes sobre a Carta de Princípios do FSM, que está disponível no site oficial www.forumsocialmundial.org.br: ” (…) os governos que hospedam os eventos do FSM podem ser parceiros na organização dos mesmos. Poderão ser convidados a participar, em caráter pessoal, governantes e parlamentares que assumam os compromissos da Carta de Princípios”. Chávez é um deles. Certo está Haddad.

Políticos são bem vindos

Ciente da polêmica, o professor Luis Fernandes, do instituto de Relações Internacionais da PUC do Rio, disse que o sucesso da organização do Fórum Social Mundial é fruto do financiamento de instituições públicas controladas por forças políticas críticas ao neoliberalismo. Estas são controladas por políticos. Em face disso, defende ele, “as críticas à participação desses governantes revela uma visão despolitizada e inconseqüente com a construção de alternativas mundiais”.

O jornalista Bernard Cassen, presidente de honra do ATTAC (Ação para Taxação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos), une-se ao coro, aprofundando o debate em favor dos políticos. “É preciso entender que, hoje, a principal frente de luta contra o neoliberalismo é a Venezuela, não é o Brasil. Por mais que Lula tenha vencido as eleições. Lá, a disputa é contra uma elite golpista, que vale de todos os métodos possíveis para destituir um presidente eleito legitimamente”, discorre.

A mídia quer o Fórum

Já sobre a declaração de Savio, Cassen diz: “Me parece fundamental expressar a nossa solidariedade à democracia, e ao povo venezuelano, neste momento de acirramento de disputas. Na verdade, a vinda de Chávez é um testemunho da importância do Fórum Social”. Posição com a qual Haddad concorda: “Entendo que o Fórum é, também, um espaço midiático extremamente importante. Se ele não tivesse importância, ninguém gostaria de vir para cá. Já que tem, todos querem vir, inclusive os políticos. Cabe a nós tentar administrar esse tipo de questão e é o que estamos fazendo”.

E a polêmica sobre a presença do presidente venezuelano – que não é tão profunda como querem fazer crer alguns dos organizadores – perde força na argumentação da jornalista Maria Luisa Mendonça, da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos (integrante do Comitê Organizador do FSM).

Maria Luisa analisa: “Ao mesmo tempo que nos preocupamos com que a vinda de Chávez não monopolize a atenção dos participantes e da imprensa, temos também consciência da urgência da causa venezuelana e da importância de fazer esse debate aqui em Porto Alegre”. Neste domingo, ele será feito. Os olhos do Fórum – e do mundo – voltam-se para Hugo Chávez, o protagonista (talvez a principal vítima) desta endêmica crise latino-americana.

Rodrigo Savazoni, da Intervozes e da Ciranda da Informação

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