São incontáveis as fronteiras que se atravessa ao cruzar o Brasil carregando nada mais do que o bloco de anotações e os olhos da reportagem. Além de todos os marcos geográficos, os limites entre municípios e estados, surgem outras línguas, rostos marcados por outras histórias, peles curtidas por sóis menos brandos, cantos e sons que definem as milhares de fronteiras culturais internas ao país.
Esses contrastes tornam-se vicejantes aos olhos do jornalista, pois passam pela sua exigência profissional mais primária: fazer viável a comunicação entre o urbano e o rural, o operário e o empresário, o negro e o branco… Isso, obviamente, partindo do pressuposto de que há um elo possível entre esses setores sociais.
Entretanto, historicamente, o tratamento dado à diferença pela mídia brasileira tem contribuído para consolidar instituições culturais que, ao invés de viabilizarem o intercâmbio, são isoladas em manifestações regionais. O cinema e a literatura brasileiros tornaram célebres seus personagens estereotipados, também pelo fato de que a visão folclórica do Brasil é rentável e impressiona o mercado internacional.
Hoje, as culturas ditas populares exercem um fascínio, que remonta ao tempo dos primeiros contatos entre colonizadores e índios, sobre a universidade. A separação torna-se, aqui, ainda mais pungente: a relação entre os centros intelectuais e as manifestações culturais regionais passa a ser de observadores e observados, respectivamente.
O principal problema no que se refere a essa dinâmica é que, aos olhos dos próprios brasileiros, é predominante a aceitação do Brasil como o país do folclore. E o folclórico é sempre o outro, que, por isso, merece ser observado, estudado, desvendado.
Essa mentalidade é responsável pela atrofia de qualquer possibilidade de evolução da cultura brasileira em curto prazo. As manifestações existem, somente isso já as torna legítimas, são inúmeras e profundamente ricas. A estagnação ocorre exatamente no contato entre fenômenos culturais diversos. E o principal prejuízo desse processo na história cultural do Brasil é a perda da noção de comunidade como o lugar onde a coexistência é possível e o choque, produtivo; onde, além da harmonia na diversidade, pode-se buscar a revitalização do ideal modernista de antropofagia. Nesse ponto localiza-se a função cultural essencial do jornalista: dissolver as barreiras de comunicação que se estabeleceram entre os diferentes, e muitos, folclores brasileiros.
Maurício Monteiro Filho é jornalista e professor de jornalismo no Colégio Stockler.