Eldorado dos Carajás, 1996

 01/10/2003
 

Ação da polícia militar que resultou na morte de 19 camponeses. Foto: Reprodução/TV Floresta

O assassinato de 19 trabalhadores rurais sem-terra durante uma manifestação pela reforma agrária no sudeste do Pará é considerado o maior caso brasileiro de violência no campo. Cerca de 1,5 mil famílias pediam a desapropriação da fazenda Macaxeira, já ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST). A ação, realizada por policiais militares em 17 de abril de 1996, deixou ainda 69 feridos.

 

 

O assassinato de 19 trabalhadores rurais sem-terra durante uma manifestação pela reforma agrária no sudeste do Pará é considerado o maior caso brasileiro de violência no campo. Cerca de 1,5 mil famílias pediam a desapropriação da fazenda Macaxeira, já ocupada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST). A ação, realizada por policiais militares em 17 de abril de 1996, deixou ainda 69 feridos.

O caso de Eldorado dos Carajás tornou-se histórico não apenas por causa de sua gravidade, mas também porque simboliza um problema crônico no Brasil, especialmente na região da fronteira agrícola amazônica. Nas últimas três décadas, mais de 500 militantes da reforma agrária foram mortos no sul e no sudeste do Pará, dos quais 23 só no ano passado, de acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Há outros 18 processos não concluídos de assassinatos de sem-terra, assentados, religiosos, advogados e presidentes de sindicatos, alguns deles abertos há mais de 20 anos. “Carajás é o símbolo maior do massacre do Estado contra os trabalhadores. A não-punição, neste caso, que é exemplar, soa como uma licença oficial para matar”, lamenta João Batista Afonso, coordenador da CPT na região. Como conseqüência, 17 de abril passou a ser lembrado como o dia mundial de luta camponesa, pela reforma agrária e contra a violência no campo.

O coronel Mário Colares Pantoja e o major José Maria Pereira Oliveira, que respondiam pela operação policial na “curva do S” da rodovia PA-150, foram os únicos condenados em primeira instância, acusados de homicídio qualificado e lesão corporal. No julgamento, que começou em 14 de maio do ano passado e durou 13 dias, eles receberam penas de 228 e 158 anos de prisão, respectivamente, e os outros 147 policiais envolvidos foram inocentados. O Ministério Público apresentou recurso, pedindo que os absolvidos sejam julgados novamente – os dois condenados recorrem da sentença em liberdade.

Instituições que acompanham de perto os conflitos de terra na região, como a CPT e o MST, levantaram suspeitas sobre a responsabilidade direta do então governador do Pará, Almir Gabriel (PSDB), do comandante-geral da PM, Fabiano Lopes, e do secretário de Segurança Pública daquela época, Paulo Sette. O coronel Pantoja havia afirmado, em depoimento, que recebera ordens de seus superiores para desinterditar a área ocupada pelo MST a qualquer custo. Porém, para o promotor Marco Aurélio Nascimento, que apresentou a denúncia à Justiça, “não há ligação entre mandar desobstruir uma estrada e mandar matar”. Por isso, decidiu não acusá-los.

O caso levou seis anos para ser julgado, mesmo com a pressão da OEA, que o classificou como um dos piores exemplos de desrespeito aos direitos humanos, recomendando ações urgentes do governo brasileiro. Como juízes e jurados do sul do Pará demonstraram antipatia prévia pelo MST, o processo teve de ser transferido para Belém – o que atrasou o julgamento.

Agora, a demora de mais de um ano para uma decisão em segunda instância preocupa a Sociedade Paraense de Direitos Humanos, que a considera “completamente injustificada”, nas palavras de seu advogado, Marco Apolo Santana Leão. O juiz Roberto Moura, responsável pelo caso no Tribunal de Justiça do Pará, afirma que tudo está correndo em ritmo normal. “Este é um processo muito complexo, devido ao número de sessões, réus e partes interessadas.” Uma decisão definitiva pode sair só em 2005, se o caso for levado ao Supremo Tribunal Federal.

 

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