O juiz do Trabalho Manoel Lopes Veloso Sobrinho, da Vara do Trabalho de Barra do Corda, no Maranhão, condenou o deputado federal Inocêncio Oliveira (PFL-PE) em duas ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho por manter trabalhadores em condições análogas à de escravo em fazenda de sua propriedade. As condenações incluem pagamento de indenização por danos morais e a obrigação de cumprir direitos básicos do trabalhador – como registro em carteira e fornecimento de água potável -, sob pena de multa por descumprimento. O advogado João Agripino Maia, responsável pela defesa do deputado nestes casos, diz que irá recorrer das decisões tão logo seja intimado das mesmas. Ele sustenta que o Ministério Público não tem legitimidade para pleitear o dano moral dos trabalhadores. "O dano moral é algo da pessoa. Terceiro nenhum pode reclamar esse dano por outro. O MP tem o dever de fiscalizar o cumprimento da lei e está, nesse caso, extrapolando suas funções", afirma. Agripino Maia conta também que o deputado terceirizou a contratação em suas terras e, por isso, não tem responsabilidade pessoal sobre eventuais faltas cometidas pelos terceirizados. Segundo ele, o deputado Inocêncio de Oliveira não tinha conhecimento da situação desses trabalhadores. Por meio de sua assessoria de imprensa, o deputado declara que a condenação é "pura perseguição política". De acordo com nota oficial distribuída à imprensa, "o Ministério do Trabalho pronunciou-se oficialmente em 2002 dizendo que o deputado não tinha nada a ver com o fato. O Procurador da República de então arquivou o processo. Sem qualquer fato novo, o processo foi reaberto". As ações do MPT resultaram de uma operação de fiscalização iniciada em março de 2002 na fazenda Caraíba, município de Gonçalves Dias (348 km de São Luís). Na operação, foram encontrados 53 trabalhadores que, segundo o Ministério Público, encontravam-se "submetidos a condições subumanas, sem alojamento adequado, sem alimentação suficiente e adequada, sem qualquer cuidado em relação às condições de higiene e saúde no trabalho, sem sequer água potável e material de primeiros socorros e, pior, sem direito de ir e vir quando assim quisessem." A denúncia se fundamenta no relatório da equipe de fiscalização do Ministério do Trabalho e Polícia Federal, no período de 19 a 27 de março de 2002. A Fazenda Caraíbas tem 4.200 hectares e 3.000 cabeças de gado. Nos depoimentos e provas colhidos na instrução dos processos, constatou-se que os trabalhadores eram aliciados por "gatos" para trabalhar na fazenda de Inocêncio Oliveira por meio de promessas enganosas sobre salários e condições de trabalho. Chegando ao local, os empregados "contraíam" dívidas para adquirir alimentos, ferramentas de trabalho, equipamentos de proteção individual e bens de uso pessoal, e só poderiam sair da fazenda, rompendo o pacto, mediante a quitação da suposta dívida. Os depoimentos mostraram também que os trabalhadores bebiam água imprópria, obtida no mesmo açude que atendia os animais da fazenda. Os alojamentos eram feitos de galhos de árvores cobertos de palha e lona, com piso de terra batida, e sem condições sanitárias ou local adequado para realizar refeições e guardar alimentos. O juiz do Trabalho Manoel Lopes Veloso Sobrinho, que julgou as duas ações, definiu a situação como "um espetáculo perverso e condenável, revoltante até, pela conseqüência maior de degradação da própria dignidade humana". Na definição do valor da condenação – R$ 10 mil por trabalhador, totalizando R$ 530 mil a serem revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT, o juiz ressaltou "a circunstância de o réu ser um homem público, parlamentar de vários mandatos, exercendo atualmente mandato de deputado federal, ocupando a primeira Vice-Presidência da Mesa da Câmara dos Deputados e, por essa razão maior, devendo ser-lhe cobrada uma conduta exemplar no trato com seus subordinados". Na segunda ação, o juiz determinou o cumprimento, por parte de Inocêncio Oliveira, de uma série de obrigações trabalhistas e estabeleceu diversas ações das quais ele terá de se abster, sob pena de reincidência. Entre as obrigações, estão o registro da carteira de trabalho, o pagamento de salários até o quinto dia útil de cada mês, o recolhimento de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), o fornecimento de materiais de primeiros socorros, equipamentos de proteção individual, ferramentas de trabalho, água potável, alojamentos e instalações sanitárias adequadas e condições de conforto e higiene para refeições adequadas. Da lista de proibições, constam o cerceamento da liberdade de ir e vir dos trabalhadores, a exigência de trabalho forçado, realizado sob ameaças, o aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território nacional, a contratação com intermediação de terceiros ("gatos") e a contratação de menores de 16 anos. (Camila Agustini)