Barragem de Candonga: problema ambiental e social |
“Depois que a barragem chegou, este povoadinho virou um inferno”. A inquietude de José Quirino é sensação comum entre os habitantes de Santana do Deserto, um acanhado distrito do não menos humilde município de Rio Doce, a cerca de 150 km de Belo Horizonte (MG). Agricultor na época da cheia e garimpeiro quando o nível das águas abaixava, Quirino sempre dependeu do rio que dá nome à cidade onde mora para ganhar a vida. Seja para pegar os peixes e tocar o roçado que garantiam sua subsistência; seja para faiscar o ouro que costumava retirar a fim de completar o orçamento doméstico. Porém, ele agora já não pode mais se dedicar a essas atividades e tem dúvidas quanto ao destino dos vizinhos de sua vila. “Quem precisa trabalhar vai ter de sair daqui. Só vão ficar os aposentados”, sentencia.
A causa de tanta incerteza é a instalação da Usina Hidrelétrica (UHE) de Candonga. O empreendimento foi construído em parceria pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e Alcan Alumínio do Brasil – entre junho de 2001 e março deste ano – com o intuito de represar a água necessária para girar as turbinas da barragem e produzir energia destinada ao auto-consumo exclusivo de indústrias dessas duas gigantes do setor de minérios.
A obra gastou quase R$ 200 milhões e alagou 2,8 quilômetros quadrados de dois municípios localizados numa exuberante região da Zona da Mata de Minas Gerais: Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado. Nessa segunda cidade, por exemplo, todas as 120 famílias que compunham a comunidade de São Sebastião do Soberbo foram obrigadas a deixar as áreas em que tradicionalmente residiam, para ceder lugar ao lago da hidrelétrica, e se mudar para um núcleo urbano construído pelo consórcio, batizado de Nova Soberbo. Prova de que a UHE não apenas redesenhou a bela paisagem local, mas causou uma reviravolta nos costumes das populações que viviam à margem do rio Doce.
Entretanto, não são apenas os moradores cujas casas acabaram submersas para a formação do reservatório que tiveram seus cotidianos revolucionados. Havia ainda agricultores que não moravam, mas tiravam o seu sustento de terras que não lhes pertenciam – e que hoje também estão embaixo d’água – mediante algum acerto com os verdadeiros proprietários. Sem falar naqueles que durante anos driblaram a pobreza procurando ouro no rio.
José Quirino: "Povoado virou um inferno" |
A construção de hidrelétricas como a de Candonga não é apenas um problema ambiental, mas também social. Não temos dúvidas de que o drama das populações afetadas por essas obras é pouco conhecido perante a opinião pública e o próprio Governo Federal. Mas só resolveremos isso com organização”, afirma Gilberto Cervinski, coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
As populações ribeirinhas de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado começaram a perder o sono em janeiro de 2000, quando o Consórcio Candonga, inicialmente formado pela CVRD e pela Energia Elétrica, Promoção e Participação Ltda (EPP), deu o lance mínimo exigido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) – R$ 181 mil – e saiu vencedor do leilão que negociava a exploração do potencial energético daquela região. No ano seguinte, a Alcan comprou os 50% das ações do consórcio que pertenciam à EPP pagando uma importância correspondente a 100 vezes o valor desembolsado no leilão. Uma pechincha já que os 140 MW de potência instalada da barragem, suficientes para abastecer uma cidade de quase 200 mil pessoas, vão poupar mensalmente às duas empresas gastos de milhões de reais com eletricidade.
Porém, uma queda-de-braço entre o empreendedor e os afetados pela hidrelétrica de Candonga vem se arrastando há tempos. As queixas dizem respeito às contrapartidas oferecidas pelo consórcio para contornar os impactos gerados pela obra. Os moradores de Nova Soberbo afirmam que os terrenos das casas construídas no núcleo urbano onde estão realocados não garantem o mesmo nível de vida que possuíam quando estavam à beira do rio Doce. Os agricultores instalados nos assentamentos rurais também reclamam do local e do tamanho dos lotes que receberam.
Além disso, não são poucos os que ainda lutam para ter seus direitos reconhecidos, como José Quirino e alguns de seus vizinhos de Santana do Deserto. Só de garimpeiros, o MAB da região enviou uma lista com mais de 50 nomes ao Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) de Minas Gerais – órgão responsável pelo processo de licenciamento da usina.
“Existem coisas que dinheiro nenhum pode pagar ao atingido. Não se trata apenas da terra, mas da estrada da roça que o agricultor abriu com sua enxada; o terreiro onde suas crianças brincavam; a sua comunidade. Enfim, os laços afetivos que tinha com o local”, poetiza o deputado federal Adão Pretto (PT-RS), um dos fundadores da Frente Parlamentar em defesa dos Atingidos por Barragens.
Uma obra do porte da UHE de Candonga passa por várias etapas até que seu funcionamento seja autorizado definitivamente. Para chegar à última fase do processo e obter a licença de operação (LO), o empreendedor precisa cumprir uma série de ações para compensar os impactos ambientais, sociais e econômicos gerados pela construção.
“O problema é que, no dia 30 de março, o Copam não poderia ter concedido a licença para o consórcio sem que tivessem sido resolvidas todas as pendências sociais. A mais importante é a implementação do Plano de Reativação Econômica para as pessoas afetadas pela hidrelétrica”, afirma Leonardo Rezende, consultor jurídico do Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab).
Alexandre Vieira – Nacab: "As terras antes eram mais férteis" |
Mesmo passados três anos desde o in
ício da construção da usina, ainda existe um grande impasse. Os atingidos argumentam que os lotes oferecidos pelo consórcio, tanto para os assentamentos rurais como para as casas de Nova Soberbo, dificultariam a aplicação de medidas efetivas que assegurem trabalho e tranqüilidade às famílias desalojadas. “Antes elas possuíam terras férteis e planas, propícias para o plantio de diversas culturas, pois viviam perto do rio. Agora, estão numa região de morros, em uma área que não é suficiente para garantir a qualidade de vida que tinham antes. Por enquanto, conseguem se manter porque ainda contam com cestas básicas”, argumenta Alexandre Vieira, assessor do Nacab.
Entretanto, para a representante do consórcio nas negociações, Gleuza Jesué, “não dá para dizer que uma obra como esta não trará impacto. Porém, estamos tentando propor ações de geração de renda para os atingidos há muito tempo. Mas o que eles querem não necessariamente vai ao encontro de uma realidade factível de ser implementada”.
Leonardo Rezende rebate: “o Plano de Reativação Econômica precisava ter sido concluído antes da concessão da licença de operação”. Utilizando justamente esse argumento, o Nacab entrou com uma ação na justiça e conseguiu em abril deste ano uma liminar que impedia o enchimento do lago de Candonga, até a resolução das pendências.
Geraldo Aquino: royalties bem-vindos |
Contudo, as prefeituras de Rio Doce e de Santa Cruz do Escalvado também resolveram participar do jogo. Valendo-se de um recurso que só o poder público pode fazer, “em nome dos interesses econômicos municipais”, cassaram a liminar obtida pelo Nacab. As cidades vão receber de 60 a 70 mil reais por mês, entre pagamentos de royalties e de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) gerados pela hidrelétrica, de acordo com Geraldo Aquino, prefeito de Santa Cruz – que também já havia sido contemplada com algumas obras bancadas pelo empreendedor, como a reforma do seu ginásio poliesportivo e o asfaltamento de estradas na zona rural.
“Além disso, a barragem é uma realidade e o consórcio não vai fugir dessas pendências porque elas já são de conhecimento do Copam e da Justiça”, justifica Aquino. O reservatório começou a ser enchido no final de junho. “Retardar a formação do lago só iria adiar a entrada de recursos importantes para a prefeitura”, acrescenta.
Sônia Loschi: contato direto com os atingidos |
Mas não é essa a preocupação das organizações que vêm auxiliando a população afetada pela barragem de Candonga. “Se com o lago vazio o consórcio já não queria negociar, imagine agora com ele cheio?”, declara Sônia Loschi, da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Na opinião do coordenador nacional do MAB, o principal problema é que os atingidos sempre acabam reféns da boa vontade das construtoras de barragens. “São as empresas que decidem os direitos deles, analisando o custo que isso acarretará para o empreendimento”, afirma Cervinski.
Joaquim Brazeiro passou boa parte de sua vida no município de Rio Doce, trabalhando em uma terra de que não era dono, e que também foi inundada pelo lago da usina de Candonga. Costumava dividir com o proprietário a colheita que conseguia produzir junto com sua esposa. Essa espécie de acordo é bastante comum nas áreas rurais, e ele se enquadrava numa categoria que se convencionou denominar “meeiro”.
Aproximadamente 80 agricultores, na mesma condição de Brazeiro, foram reconhecidos pelo consórcio como atingidos. Duas eram suas alternativas: o reassentamento em áreas de três hectares – a menor extensão registrada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) como imóvel rural – ou uma indenização de R$ 25 mil. Assim como outros 19 camponeses, Brazeiro apostou na possibilidade de tocar o seu próprio lote, localizado no núcleo do Marimbondo, na margem esquerda do rio Doce. O restante optou pelo dinheiro. “Antes, os meeiros não eram donos de nada. Agora, passaram do status de não-proprietário para o de proprietário. E o fato de receberem essa área não significa que tenham de trabalhar somente nela”, argumenta Gleuza.
Porém, Brazeiro e sua família não compartilham da mesma idéia de ascensão social da representante do consórcio. Sua esposa, Maria José, é uma das mais abaladas com a mudança de vida imposta pela construção da hidrelétrica. “Eles fizeram uma casa muito bonita, é verdade. Mas de que adianta se a panela está vazia? Não vou arrancar o azulejo para cozinhar”, diz.
Joaquim Bradero: como meeiro, muito mais terra para plantar |
Acostumada a uma fartura de alimentos que a grande fertilidade do solo que cultivavam proporcionava, hoje Maria José se espanta com o fato de seu marido precisar comprar gêneros como milho e banana. Além disso, na época em que era meeiro, Brazeiro tinha quase seis vezes mais terra para plantar, apesar de não possuir o título da propriedade. A gleba que recebeu do consórcio, reclama ele, fica em uma região de relevo muito acidentado, o que dificulta bastante a lida diária.
Considerando as queixas e as condições de vida dos colonos, um grupo de agrônomos da Universidade Federal de Viçosa (UFV), contratados como assessores técnicos dos atingidos, contestou as dimensões dos lotes oferecidos pelo consórcio para o reassentamento dos antigos meeiros, nos encontros da comissão especialmente criada no Copam para discutir o Plano de Reativação Econômica da população prejudicada pela barragem – instalada logo após a concessão da licença de operação, em março deste ano.
Baseados numa legislação de 1964, conhecida por Estatuto da Terra, os agrônomos defenderam a concessão de um módulo rural para cada um dos ex-agricultores ribeirinhos. Esse módulo nada mais é do que o sítio mínimo necessário para a subsistência de uma família, cujas medidas variam de lugar para lugar, determinadas pelo Incra. Na região de Candonga, ele &eacu
te; de 26 hectares. Entretanto, a proposta não foi aceita pelo empreendedor. “Não estamos aqui para fazer reforma agrária. Não é o nosso papel”, afirma Gleuza.
“Mas o consórcio também não pode contribuir para a favelização rural”, rebate Marcos Helênio Pena, superintendente do Incra-MG. “A questão social já é grave quando há uma mudança de ambiente. Além disso, esses três hectares vão inviabilizar a auto-sustentabilidade das famílias, criando uma situação de minifúndio improdutivo”, completa. E o prejuízo dos atingidos não pára por aí. Sem um lote do tamanho estipulado pelo módulo rural da região, não terão acesso a uma série de benefícios, como linhas de crédito para produção, além de não poderem contar, no futuro, com a assistência técnica oferecida pelo governo federal aos pequenos agricultores em geral.
Apesar de toda a argumentação dos assessores dos atingidos, Carlos Fernando Vianna, presidente dessa comissão especial do Copam, acabou acatando no relatório final das discussões a oferta do empreendedor – ou seja, confirmou os três hectares. “Nós nos baseamos nos estudos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater), que durante dois anos também vai prestar assessoria, paga pelo consórcio, aos agricultores. Não acho que as propostas sejam perfeitas, longe disso. Mas foi o possível diante do impasse que se criou entre as partes”, pondera Vianna.
Maria Marta: "amolada" desde a blitz policial |
Nessa verdadeira guerra de pareceres, até os órgãos públicos se dividiram. De um lado, a maior autoridade em questão agrária no país, o Incra, duvida do sucesso dos assentamentos propostos pelos empreendedores da UHE de Candonga. Do outro, a Emater subsidia essas mesmas propostas para “provar com estatísticas que os atingidos podem melhorar de vida com pouca terra para trabalhar”, critica Sônia Loschi, da CPT.
Existe ainda um fato no mínimo curioso: para os que possuíam documentos, que comprovavam a propriedade das áreas inundadas pela hidrelétrica, foi levada em conta a orientação do Incra. “Aqueles que tinham menos de 26 hectares receberam o equivalente a um módulo rural. É um sistema de negociação típico do setor elétrico”, explica a representante do consórcio. Para Cervinski, trata-se de uma estratégia com o objetivo de baratear os custos sociais da obra. “As construtoras de barragens possuem um conceito próprio sobre o atingido: é quem detém o título da terra. Porém, na beira dos rios, as populações são compostas de pequenos agricultores e mais da metade é arrendatária, meeira. Ou seja, não é proprietária”, afirma.
Vale lembrar que, desde o ano passado, os atingidos por barragens constam oficialmente do II Plano Nacional de Reforma Agrária, sejam donos ou não das terras onde trabalham. “Por isso, o Incra deve tomar partido nesse processo para fazer o devido assentamento dessas famílias, garantindo a elas o módulo rural e, conseqüentemente, o acesso a benefícios, como o crédito para plantação. Precisa pressionar os Estados que, por sua vez, devem cobrar das empresas”, afirma o deputado Adão Pretto.
Destroços de S. Sebastião do Soberbo, antes do enchimento do lago de candonga |
São Sebastião do Soberbo, distrito de Santa Cruz do Escalvado, foi o único povoado totalmente inundado pelo reservatório de Candonga. Era uma comunidade tipicamente rural, com ruas de terra batida e casas muito simples, daquelas que possuem extensas cozinhas com fogão a lenha. Sua população era composta por uma maioria de agricultores e garimpeiros, passando por pequenos comerciantes, até os raros funcionários públicos. Além de se dedicar aos seus trabalhos, boa parte também dependia dos quintais para cultivar uma horta, criar galinhas e porcos, além de colher frutas. A proximidade com o rio era a garantia de terras férteis.
Do alto dos seus 76 anos, os olhos de Maria Marta chegam a lacrimejar quando lembra a operação policial, realizada no começo de maio, que retirou as últimas 14 famílias que ainda resistiam em mudar para Nova Soberbo – a cidade construída para abrigá-las. Ela se recorda da truculência dos quase 200 policiais mobilizados na blitz e conta que apenas pôde assistir à retirada dos pertences de sua casa pelos homens a serviço do consórcio.
Hoje Maria Marta ocupa uma residência em Nova Soberbo, mas não se cansa de dizer que está muito “amolada” com a transformação de seus hábitos. “Era uma comunidade rural que agora está alojada num espaço urbano, em casas ‘para inglês ver’. O consórcio impôs um conceito de modernidade aos atingidos”, argumenta o Alexandre Vieira, do Nacab. Carlos Fernando Vianna, conselheiro do Copam, também considera que “esteticamente a vida dos habitantes de Soberbo evoluiu. Mas há gente que não troca um casebre de 20 metros quadrados com uma horta no quintal por uma casa três vezes maior na cidade”. A representante do consórcio argumenta que essa mudança de perfil foi necessária devido ao local onde foi construída Nova Soberbo. “É uma sede distrital, uma área urbana. Por isso, tínhamos de seguir os pré-requisitos legais e as normas técnicas vigentes”, justifica.
“Esta casa é de rico, mas a gente não tem prazer de morar nela”, desabafa Maria Helena Alves. Ela também foi reconhecida como meeira mas, em vez do assentamento rural nos 3 hectares, optou pelos R$ 25 mil de indenização. Depositou o dinheiro em um banco e hoje vive em Nova Soberbo, na casa da mãe, que paga as despesas do lar com o salário mínimo que recebe de aposentadoria. “Aqui é uma chatice. Está todo mundo parado, sem nada para fazer”, reclama Maria Helena.
Nova Soberbo: modernidade imposta "para inglês ver" |
Outra queixa dos moradores na cidade é o fato de ninguém possuir a escritura da residência, apesar de muitos já estarem instalados há mais de ano. A única prova de que um dia serão os donos é um termo de permuta fi
rmado com o consórcio. A representante do empreendedor atribui essa confusão ao complicado processo de desapropriação da área adquirida para a construção da cidade, mas afirma que “o problema está resolvido e as escrituras, prontas”.
As “normas técnicas” adotadas na construção de Nova Soberbo também foram motivo de outra grande briga. Gleuza garante que a comunidade se envolveu na concepção da estrutura da cidade e afirma possuir atas com assinaturas de atingidos que participaram das discussões. Mas, na opinião de muitos deles, os terrenos de 360 metros quadrados recebidos por cada família – que correspondem ao tamanho médio das casas na antiga Soberbo – não eram suficientes para garantir o mesmo nível de vida que possuíam antes. Os quintais, que não passam dos 200 metros quadrados, são o motivo de maior insatisfação. “Ele é muito pequeno e a terra é pura areia. Não dá para plantar nada. Além disso, como é possível criar um porco numa casa como esta?”, indaga Maria Helena.
Reconhecendo a complicada situação dos atingidos, o Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais (Ceas) tomou uma atitude inusitada: determinou que o consórcio concedesse a cada uma das famílias de Nova Soberbo uma área destinada a “extensão de quintal”, a cerca de meio quilômetro do núcleo urbano. “Confesso que esse conceito é meio estranho. Não é comum haver um quintal que não faça parte do terreno, que não seja contíguo a ele. Agora, com a cidade construída, não cabe demolir e fazer outra”, afirma Vianna.
Mas o problema não se resume ao fato de essas “extensões” não se localizarem nos fundos das casas. Os assessores técnicos dos atingidos também questionam a dimensão da glebas adicionais de 360 metros quadrados, oferecidas pelo consórcio, e principalmente o local onde vão ficar – uma área de morro pouco fértil. Por essa razão, fizeram uma contraproposta na comissão do Copam que debatia o Plano de Reativação Econômica: lotes suplementares de 1.000 metros quadrados, em uma região um pouco mais distante de Nova Soberbo, porém com o solo em melhores condições. “Eles estão numa fase de transição e precisam de segurança alimentar. A barragem tem de vir para melhorar a vida deles”, justifica Hélder Freitas, um dos assessores dos atingidos.
Lotes das "extensões de quintais": área íngrime |
Porém, o mesmo relatório do Copam que sacramentou os três hectares de terra para os assentados da área rural acatou novamente a oferta do empreendedor, e confirmou os 360 metros quadrados para a extensão dos quintais, na cidade – baseando-se também nas análises técnicas da Emater. “Isso era para ter sido decidido há dois, três anos. Na época de construção de Nova Soberbo, firmou-se um acordo que ao que tudo indica foi mal-feito. Agora estão tentando consertar”, diz Vianna. Na opinião de Freitas, “o problema é que os atingidos só foram se organizar no fim do processo, pois estavam dispersos e iludidos pelas promessas do consórcio. Se o empreendedor ceder agora, é uma conquista para o movimento e um precedente que se abre nos processos de construção de outras barragens”.
Em Diogo de Vasconcelos, a poucos quilômetros da região da usina de Candonga, a Alcan também possui outra usina: a Pequena Central Hidrelétrica de Fumaça, com potência de 30MW. “O menor assentamento que conseguimos foi de 13 hectares e o maior, de 22. O trabalhador rural não necessita do dinheiro de indenizações, mas sim de terra para plantar. Precisa pensar no amanhã”, declara Marta Caetano, uma das lideranças locais. Agora, por intermédio do MAB, ela tenta transmitir sua experiência para os atingidos de Candonga. Fumaça é um dos primeiros assentamentos de atingidos por barragens de Minas Gerais, com casas construídas de acordo com o gosto dos agricultores. A receita para a façanha é simples: mobilização.
Minas Gerais, segundo semestre de 2004