Brasil é o segundo em número de mortes por arma de fogo

Segundo estudo divulgado pela Unesco, índice de mortes por armas de fogo no Brasil é maior do que o de Israel, que vive em guerra com os palestinos. Mais de 200 mil crianças e jovens de cinco capitais brasileiras já tiveram acesso a armas de fogo dentro de escolas públicas e privadas do país
Por Marco Aurélio Weissheimer
 06/05/2005

O representante da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) no Brasil, Jorge Werten, entregou nesta quinta-feira (dia 5), ao presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), um relatório que classifica o Brasil como o segundo país com o maior número de mortes por armas de fogo. O país perde somente para a Venezuela neste ranking macabro. O levantamento foi feito em 57 países, entre 2000 e 2003, com base em relatórios enviados pelos governos destes países à Organização Mundial da Saúde (OMS).

Somente em 2002, foram 21 mortes por armas em cada cem mil mortes. Já na Venezuela, esse número chegou a 34 mortes. No outro extremo aparece o Japão – último colocado no ranking – , onde menos de uma pessoa (em cada cem mil) morreu no mesmo período em conseqüência de armas de fogo. A Unesco defende a proibição da comercialização de armamentos no país.

Segundo o estudo divulgado pela organização, morre mais gente no Brasil, vítima de armas de fogo, do que em países como Israel, situado em uma região de permanente conflito no Oriente Médio. Israel ficou em 6° lugar no ranking da Unesco, atrás de países como os Estados Unidos, Argentina, México, França e Croácia. Ao contrário do que ocorre no Brasil, em Israel é permitida a posse de armas de fogo, mas não a sua comercialização.

Para Jorge Werthein, o estudo mostra a necessidade de mudanças urgentes no comércio de armas de fogo no Brasil. O representante da Unesco pediu a Severino Cavalcanti agilidade na aprovação do referendo que proíbe a venda de armas no país. Os 57 países foram selecionados pela Unesco para o ranking por terem sido os únicos, entre os mais de 190 integrantes da Organização Mundial de Saúde (OMS), a enviar com freqüência anual dados sobre homicídios e mortes.

Obstáculos políticos
O presidente da Câmara Federal disse que está empenhado em votar o projeto, mas que isso depende de um acerto entre o governo e as bancadas no Congresso. O PFL é o partido que apresenta maior resistência ao projeto. Os parlamentares do PFL só aceitam votar o referendo junto com o projeto que prevê o fim da verticalização nas coligações eleitorais (o que permite coligações diferentes em níveis municipal, estadual e federal). Já haveria, no entanto, um acordo para que as duas matérias sejam votadas na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados (CCJ) no dia 10 de maio.

O parecer do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) sobre o referendo excluiu do texto a parte que definia a data de realização da consulta popular, prevista inicialmente para dois de outubro. O deputado Severino Cavalcanti prometeu trabalhar para agilizar a votação da proposta do referendo, conforme foi solicitado pela Unesco.

“Nós precisamos fazer tudo pra savalguardar a sociedade, e a sociedade não pode ficar sendo punida por falta de ação dos legisladores e da própria segurança do país. O referendo vai, e quem vai decidir é o povo. Tem que acabar a obstrução, senão eu não vou poder colocar em votação”, disse o presidente da Câmara. Já o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) defendeu nesta quinta que a data do referendo deveria ser decidida mais tarde. “O importante”, segundo Calheiros, “é que haja desobstrução da pauta na Câmara para que possamos votar o projeto de decreto legislativo, como fizemos no Senado”. “Acho que só depois disso é que poderemos pensar na data”, acrescentou. As declarações de Calheiros foram feitas durante a criação do comitê suprapartidário para tratar do referendo sobre a comercialização de armas de fogo no país. O comitê pretende trabalhar pela agilização da realização da consulta à população.

Armas nas escolas
Outro estudo divulgado pela Unesco mostrou que em cinco capitais (São Paulo, Porto Alegre, Belém, Salvador e Rio de Janeiro), e no Distrito Federal, 35% dos estudantes já viram uma arma de fogo dentro da escola. Mais de 200 mil crianças e jovens destas cidades já tiveram acesso a armas de fogo dentro de escolas públicas e privadas do país. Jorge Werthein entregou ao presidente da Câmara dos Deputados um relatório preliminar com dados sobre a pesquisa que deverá ser finalizada nos próximos meses.

Entre o final de 2003 e o início de 2004, a pesquisa ouviu alunos, professores, diretores e funcionários de escolas. Além disso, a Unesco aplicou mais de 10 mil questionários entre os estudantes para analisar a relação entre a violência e a educação no Brasil. Os resultados foram inquietantes, mas não chegaram a surpreender. Além dos 200 mil alunos que disseram já ter visto armas de fogo dentro das escolas, outros 19 mil afirmaram já ter entrado com revólveres nas escolas.

Segundo o representante da Unesco, “é incrível verificar a quantidade de armas de fogo que circulam hoje nas escolas brasileiras”. “São taxas inaceitáveis e pouco vistas em outros contextos. Isso mostra a facilidade com que as crianças e jovens têm acesso às armas, desde as armas de família as que são roubadas e depois circulam livremente”, enfatizou Werthein. Entre as armas mais comuns encontradas nas escolas, segundo relato dos próprios alunos, estão canivetes, facas, revólveres e punhais.

A Unesco está preocupada com a queda da qualidade da educação em ambientes escolares onde o medo predomina entre os alunos. “Se as ameaças são constantes, não há professor que possa ensinar bem, que queira ir à escola, e não há aluno que possa aprender bem e concentrar-se na escola quando os níveis de violência são tamanhos”, resumiu o representante da organização.

Da Agência Carta Maior. Com informações da Unesco e da Agência Brasil

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