STJ nega federalização do caso Dorothy; ativistas protestam

Ministros do STJ votaram contra a federalização do caso da irmã Dorothy Stang, morta em fevereiro no Pará. Decisão frustra movimentos e ONGs de direitos humanos, que acusam a Justiça paraense de não investigar outros casos no Estado
Por Verena Glass
 09/06/2005

No final da tarde desta quarta-feira (8), a terceira seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) indeferiu, por unanimidade, o pedido da Procuradoria-Geral da República para que a ação judicial que investiga o assassinato de Dorothy Stang fosse julgada na Justiça Federal. A federalização do caso havia sido pedida e apoiada por uma série de organizações de direitos humanos e movimentos sociais nacionais e internacionais, que consideram a justiça paraense, que agora se responsabilizará pela conclusão das investigações, tendenciosa e ineficiente na apuração de crimes contra os direitos humanos.

Na terça (7), um dia antes do julgamento do mérito pelo STJ, entidades como o Greenpeace, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o MST, a CUT, o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), entre outros, organizaram uma manifestação em frente ao Palácio do Planalto segurando fotos da Irmã Dorothy, que, se viva, teria completado 74 anos naquela data.

Como parte do ato, os manifestantes encaminharam ao presidente Lula um documento pedindo ações mais eficazes em prol da justiça social, que foi recebido pelo secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda. Ainda na tarde de terça, representantes das organizações se reuniram com o ministro do STJ, Arnaldo Esteves de Lima, relator do caso, e com o presidente da casa, o ministro Edson Vidigal, para reforçar o pedido de federalização. Também foram entregues ao STJ abaixo-assinados neste sentido com 13 mil firmas do Brasil e mais de mil petições de inúmeros países.

Decepção
Para o presidente da CPT, Dom Tomas Balduino, o resultado da votação do STJ foi uma decepção. Segundo ele, os oito juízes que votaram contra a federalização barraram um desejo constitucional das organizações sociais e de direitos humanos, utilizando como argumento a suposta eficiência da Justiça paraense na apuração do caso. “Eles foram cegos em relação à situação de violência no Pará”, afirma Balduino, que considerou o resultado uma manifestação de corporativismo do judiciário.

Segundo o advogado da ONG Terra de Direitos, Darci Frigo, que também acompanhou o julgamento, dois dos juízes chegaram a citar um levantamento da CPT que aponta que cerca de 90% dos casos de crimes contra agricultores e lideranças sindicais e socias não foram devidamente investigados pela justiça do Pará, mas argumentaram que, como o caso Dorothy foi bem encaminhado, não poderiam se basear em fatos externos para apoiar a federalização desta investigação especificamente.

“Acontece que eles se esquecem que o caso Dorothy só caminhou tão rapidamente porque houve intervenção da Polícia Federal. Se dependesse do delegado local, o ex-prefeito de Anapu, Francisco de Assis de Souza Santos, o Chiquinho do PT, teria sido considerado o mandante do crime. Até agora, apenas os executores e dois mandantes foram identificados. O caso foi apurado sem que a parte mais poderosa do Consórcio que teria encomendado a morte da religiosa fosse identificada. O Pará não é um Estado sem lei. Mas a lei é para prender os pobres e proteger madeireiros e grileiros”, denuncia.

Frigo vai mais além. “Com a sua decisão, o STJ certamente não quis dar carta branca aos criminosos no Pará. Mas estes podem ler o fato como tal, podem se sentir fortalecidos”. Segundo ele, a situação das lideranças sociais, sindicais e religiosas na região de Anapu, município onde Stang atuava e foi assassinada, é muito delicada. “Desde a morte de Dorothy, a perseguição a estas pessoas é mais aguda, seja em termos da ação policial, que prendeu cinco agricultores e expediu mandados de prisão preventiva contra outros tantos, seja pelas ameaças de morte de fazendeiros e grileiros. Sinceramente, temo pela vida das lideranças em Anapu”, afirma o advogado.

Agora, os movimentos sociais e ONGs devem analisar minuciosamente os casos de crimes de violação dos direitos humanos no Estado que não foram levados a julgamento, e apresentar o seu pedido de federalização à Procuradoria Geral da República. “Estes casos não prescrevem desde que haja grave violação de direitos humanos ou de tratados internacionais assinados pelo Brasil. Queremos demonstrar qual é a linha da justiça no Pará”, diz o advogado.

Da Agência Carta Maior

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