Quando os donos da Usina Catende demitiram 2300 funcionários, em 1993, nem de longe ela lembrava o vigor de 40 anos antes, época em que era a maior unidade produtora de açúcar de toda a América do Sul. Localizada no município de mesmo nome, a cerca de 140 quilômetros de Recife, hoje o patrimônio de Catende está avaliado em R$ 90 milhões. Nos seus 26 mil hectares de terras, espalhados por 48 engenhos que ocupam cinco municípios, vivem 3 mil famílias.
Na década de 80, em meio à decadência do setor sucroalcooleiro nordestino, a usina estava preste a seguir a trilha de outras 17 empresas que já haviam fechado as portas, se não fosse a reação de seus empregados. "Com o tempo, percebemos que o governo não iria desapropriar a área, os donos venderiam as terras e expulsariam as pessoas que moravam lá. Por essa razão, amadurecemos a idéia de optar pelo caminho jurídico da falência", explica Bruno Ribeiro, advogado da Fetape.
Há dez anos os donos foram afastados pela Justiça e todo o processo produtivo do açúcar foi assumido pelos próprios empregados, que fazem de Catende a maior experiência de autogestão do país. Quando a usina foi à bancarrota, em 1995, o montante das dívidas de seus donos com o Banco do Brasil (BB) era três vezes maior do que todo o patrimônio por ela compreendido. Além disso, o valor das obrigações trabalhistas não honradas chegava à impressionante marca de R$ 56 milhões.
Hoje, uma parceria firmada com o MAPA, no valor de R$ 7 milhões, garante a compra antecipada do açúcar fabricado em Catende. Além disso, o crédito de custeio oferecido pelo BB – cujo valor não dá margem a investimentos na infra-estrutura da usina, mas ao menos permite a sobrevivência do empreendimento – é o único recurso que as instituições financeiras públicas oferecem ao coletivo de trabalhadores. Tratamento bem menos generoso do que o dispensado aos antigos proprietários que faliram a usina. A administração de Catende estima que seriam necessários cerca de R$ 40 milhões para recuperar as plantações de cana, renovar a frota de caminhões e reativar a destilaria de álcool, parada desde 1991 – o que a tornaria economicamente sustentável.
Apesar de a falência ainda não ter sido concluída, o advogado da Fetape espera finalizar o processo em breve e, dessa maneira, repassar integralmente o controle da usina aos seus funcionários. "Nós não queremos um modelo de desenvolvimento centrado na cana. Mas ela tem um papel estratégico, porque há uma indústria já consolidada e um trabalhador capacitado. A cana é quem vai financiar a apropriação dos meios de produção e financiar o desenvolvimento de outras culturas e da agricultura familiar. Vai preservar a renda dos que já têm e gerar para aqueles que não têm", conclui Ribeiro.