Crianças indígenas morrem de causa incerta em Tocantins

Cinco crianças da etnia Apinagés com idade de zero a cinco anos morreram nas duas últimas semanas em Tocantinópolis (TO) apresentando sintomas variados. Há suspeitas de que a água do rio que passa pela região das tribos esteja contaminada, de acordo com a Funasa
Por Natália Suzuki
 23/01/2006

A Funasa (Fundação Nacional da Saúde) investiga as mortes de crianças indígenas com idades de zero a cinco anos da etnia Apinagé que ocorreram nos últimos 12 dias em Tocantinópolis (TO). Quatro delas morreram de desidratação grave, decorrente de diarréia e vômito, sendo que uma já tinha a saúde agravada por problema nos rins. Uma outra teve insuficiência respiratória por pneumonia. As crianças pertenciam às aldeias São José, Mariazinha e Riachinho.

Ainda não se tem certeza do que ocasionou todos os óbitos, mas há suspeita de que a água do rio São José, que passa pela região onde há cerca de onze tribos, esteja contaminada. Amostras da água foram recolhidas para análise. O resultado será divulgado em uma semana.

Carlos do Patrocínio Silveira, coordenador regional da Funasa Tocantins, diz que, nesta época do ano, é comum as crianças indígenas terem diarréias e infecções respiratórias. Há outras internadas no momento. O rio, possivelmente contaminado, pode ter sido um agravante para as crianças terem falecido, mas “independentemente disso, sempre temos crianças internadas”, constata Silveira.

Segundo a Funasa, em 2002, as tribos enfrentaram um surto de hepatite ocasionada pela água desse mesmo rio, quando 43 pessoas foram contaminadas. A maioria era da aldeia São José, a maior de todas da região, com 630 pessoas. Depois disso, um poço de água potável foi construído para evitar epidemias como essa. Porém, por conta das fortes chuvas, há quinze dias, houve uma variação de energia elétrica durante cinco dias que impediu o bombeamento do poço e o acesso à água potável aos índios. Por esse motivo, eles foram obrigados a utilizar a água do rio.

Celestina Delmundes, da assessoria de comunicação da Funasa diz que o rio muitas vezes é contaminado pelas criações de animais, como porcos, gados das aldeias indígenas. “Eles [índios] não tem esclarecimento sobre os cuidados que se deve ter com as criações”.

Celestina afirma que muitas crianças não foram salvas porque há uma resistência dos índios em levarem os doentes para o hospital. “Por questões culturais, eles levam os doentes para tratar com o pajé e passar por um ritual. Faz parte das nossas diretrizes esperar, porque tem que respeitar a parte cultural deles”, diz Delmundes. Contudo, em caso de desidratação, o quadro evolui rapidamente e em muitos casos não há mais como salvar a criança.

O coordenador da Funasa afirma que duas das crianças que morreram passaram cinco dias vomitando e tendo diarréia e tratavam-se com o pajé. Quando foram levadas ao hospital, já era tarde demais. “Nem o AIS (agente indígena de saúde – membro da própria comunidade treinado para detectar casos de doenças) percebeu que as crianças doentes”, lamenta. Segundo Silveira, os pais não revelaram que os filhos apresentavam um quadro que necessitava de ajuda médica.

Saúde indígena
O estudo Saúde Brasil 2005, divulgado na última quarta-feira (18/01) pelo Ministério da Saúde, revela que a mortalidade é praticamente igual entre crianças e idosos indígenas: 31,1% dos óbitos registrados em 2003 em todo o país foram de índios com menos de 5 anos de idade. Os idosos com mais de 65 anos representaram 31,5 % das mortes. Entre os brancos, somente 5,1 das mortes registradas em 2003, em cada 100 óbitos, referem-se a crianças de até 5 anos.

Da Agência Carta Maior

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