Escravos com carteira assinada são libertados no Tocantins

Grupo móvel resgata 75 trabalhadores em duas fazendas no Norte do Tocantins. Carteira assinada e alojamento aparentemente em boas condições maquiavam reais condições de trabalho
Por Iberê Thenório
 26/06/2006

Mesmo com carteira de trabalho assinada e alojamentos de alvenaria – itens raros de se encontrar nas ações do grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) – 75 trabalhadores ganharam a liberdade na última quinta-feira (22), no município de Arapoema, no Norte do Tocantins. Eles trabalhavam para as fazendas Colatina e Dois Irmãos, de propriedade da família Lavignole, do Espírito Santo, roçando o pasto para o gado. O aparente cumprimento da lei servia para maquiar as verdadeiras condições de trabalho, que eram análogas à escravidão.

De acordo com o auditor fiscal e coordenador da ação, Luiz Fernando Sousa, a maioria dos trabalhadores foi aliciada no Piauí, onde receberam adiantamento de salário de R$ 100,00 e promessas de emprego decente. Chegando ao Tocantins, porém, já deviam à fazenda a viagem (de cerca de 900 km) e o valor pago antecipadamente. Somados a isso, o alojamento, que servia às duas fazendas, era superlotado e a comida, que todo dia era igual, de má qualidade. Quem não gostou das condições e quis voltar não tinha opção: estavam presos pela dívida do transporte e da alimentação.

"Alguns tinham que dormir fora do alojamento, e a comida, com escesso de sal e óleo, causava desinteria e fazia os trabalhadores passarem mal. No primeiro pagamento muitos nem receberam [de tanto que deviam]", relata Souza.

Os empregados receberiam o salário, mas ele era parcialmente ou totalmente confiscado pelo responsável da cantina, que cobrava essas dívidas.  Nessa pequena loja eram vendidos cigarros, roupas e comida. O gerente da fazenda, de acordo com o relato feito aos auditores do MTE, afirmou que essa cantina não era de sua responsabilidade.

Juntas, as fazendas Colatina e Dois Irmãos somam aproximadamente 48 mil hectares e têm 15 mil cabeças de gado. O montante a ser pago pela rescisão dos contratos ainda não foi calculado, mas Souza estima que pode chegar a R$ 80 mil. A operação de libertação deve se encerrar ainda nesta semana.

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