Ullisses Campbell
Da equipe do Correio Brasiliense
Organizações não-governamentais e a Igreja Católica aproveitaram o início oficial da campanha eleitoral para cobrar do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, o cumprimento do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo e de acordos internacionais firmados pelo governo brasileiro sobre o tema. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) e outras 15 entidades enviaram documento ao presidente chamado "Carta ao Lula", cobrando a promessa feita em 2003 pelo petista de que erradicaria o trabalho escravo até o fim do seu mandato.
Para o frei Xavier Plassat, da CPT, a carta enviada ao presidente também serve para alertar outros candidatos, já que o problema do trabalho escravo envergonha o país. A CPT estima que existam cerca de 25 mil trabalhadores em condições análogas à escravidão no Brasil. Metade estaria no Pará. De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), 1.616 homens foram libertados da condição de escravo em 2006. Desde janeiro, foram realizadas 40 operações em um total de 77 fazendas. "Acho a carta válida como instrumento político", ressalta o coordenador da Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE, Marcelo Campos.
No documento, as ONGs elogiam o trabalho da equipe móvel do governo federal que resgata escravos em fazendas do interior, mas criticam o fato de a reforma agrária não ter decolado no governo Lula. "Não adianta só libertar trabalhadores. É preciso dar condições de sobrevivência para o homem no campo, e a reforma agrária seria uma solução. Mas, no governo Lula, ela [reforma agrária] não aconteceu", argumenta frei Xavier.
Na carta, as ONGs cobram do Poder Executivo a implementação de políticas de geração de emprego, a ampla realização da reforma agrária e o apoio à agricultura camponesa. Ao Legislativo, pede-se que seja aprovado o projeto de emenda constitucional que expropria terras onde for encontrado trabalho escravo e, ao Judiciário, o documento solicita que se defina de quem é a competência para julgar o tema. Hoje, existe um conflito se estes casos devem ser apreciados pelas justiças do Trabalho ou a Federal. De acordo com a carta, essa indefinição gera impunidade.
Impunidade
O religioso critica ainda o fato de nenhum fazendeiro autuado pelo Ministério do Trabalho por explorar mão-de-obra escrava ter sido preso. "Até hoje não se sabe se manter trabalhador em regime de escravidão é um crime estadual ou federal. Com isso, os criminosos não são julgados e a atividade prospera no país", diz Xavier. Outra crítica do religioso refere-se ao fato de a lista suja, relação das empresas que são flagradas com trabalho escravo, não ter dado certo. "Os empresários conseguem na Justiça retirar o nome da lista", ressalta o frei.
A CPT já enviou a carta à Presidência da República e pretende ainda que ela seja reproduzida livremente dentro e fora do país, tanto que o documento foi escrito em cinco línguas diferentes. Além da CPT, assinam a carta a Cáritas, Serviço Pastoral do Migrante, Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no estado da Bahia (AATR), Pastoral Rural, Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas Agrícolas (Sintagro) da Bahia e os centros de defesa dos direitos humanos de Açailândia (MA) e de Araguaína (TO).