Apresentado durante o debate eleitoral como um dos principais projetos na solução dos problemas de desemprego e crescimento da produção energética para o Brasil, o aumento da produção de combustível e energia a partir da cana de açúcar tem custos que praticamente não são levados em conta. E se por um lado já há respostas para viabilizar financeiramente um grande aumento na produção de álcool, com a promessa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de investimento de bilhões de reais para a implantação dos projetos, por outro seus impactos ambientais e sociais são sequer discutidos.
No Mato Grosso do Sul, políticos e fazendeiros estão eufóricos aguardando a implantação de 32 usinas de álcool, em um prazo de três anos. Neste mesmo estado, há 11 meses o ambientalista Francisco Anselmo de Barros morreu ateando fogo no próprio corpo, em protesto contra o projeto de lei que permitia a implantação de usinas de álcool no Pantanal, bacia do rio Paraguai.
Corte mecânico de cana (Foto:Leonardo Sakamoto) |
Mesmo com o risco de grandes impactos ambientais e com a forte demanda por reforma agrária e demarcação de terras quilombolas indígenas, bandeiras vermelhas ou azuis não se opõe ao modelo de crescimento baseado na grande propriedade rural. Isto foi praticamente consenso entre as duas principais forças políticas que disputaram o governo do estado, o PMDB e o PT.
Em um cenário político onde se vislumbra um panorama quase sem alternativas, poucas são as vozes que alertam e questionam as bases do modelo: Crescimento econômico para quem? Desenvolvimento a que custo?
Qual o rumo?
Para realização da promessa eleitoral, que projeta a geração de 51 mil novos postos de trabalho no Mato Grosso do Sul, o governo federal por meio do BNDES anunciou uma linha de crédito de R$ 5 bilhões que financiará em até 90% a implantação de cada usina. Ao todo estão planejadas 50 usinas de álcool, que devem se instalar no bioma do cerrado, região Centro-Oeste.
Apesar do banco garantir que só financia projetos devidamente licenciados, a própria Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA), que assina a licença ambiental, não garante a qualidade do estudo. "A pressão política é muito forte, é quase impossível analisar os Estudos de Impacto Ambiental da maneira adequada", confessou Paulo Aquino, gerente de Controle Ambiental da SEMA, durante o fórum "Impacto Ambiental e Trabalhista da Nova Matriz Energética de MS", realizado no início de outubro na Universidade Dom Bosco (UCDB), em Campo Grande.
"É no trabalho do corte de cana de açúcar, em usinas de álcool e em carvoarias que estão os maiores números de incidência de exploração de trabalho escravo", afirmou o Procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no estado, Cícero Rufino Pereira, no mesmo fórum. Segundo ele, a principal mão-de-obra explorada é a dos povos indígenas, migrantes e nordestinos, que consigo trazem as demandas históricas e geográficas.
O Ministério Público do Mato Grosso do Sul, por meio de seu procurador que trata da questão ambiental, Alexandre Lima Raslan, adverte que o poder público deve pagar no futuro pelas escolhas que a sua Secretaria de Meio Ambiente tem feito. "O estado sequer tem uma política definida de análise desses empreendimentos: usinas de açúcar, termoelétricas, hidrelétricas e siderúrgicas. É preciso ter uma política que diga o que é que nós queremos e o que não queremos. Sem uma política ambiental tudo cabe, tudo vale, tudo pode."
O superintendente do IBAMA do Mato Grosso do Sul, Nereu Fontes, também revela preocupação pela forma como o programa está sendo desenvolvido: "Para um projeto como este, o ideal é que houvesse planejamento e políticas públicas para que ao menos se diminuíssem os impactos sociais e ambientais. Mas o que está acontecendo é que vão implantar 32 novas usinas – aliás isso já está acontecendo – sem sequer ter definido qual seu espaço territorial ou onde elas vão estar localizadas".
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