Dezembro, Natal, fim de ano. Neste momento, surgem os balanços, as avaliações, os desejos, perspectivas e projetos de futuro. É assim na cultura de todos os povos. Porém, para tornar concretos os sonhos que projetamos para o novo ano, é necessário olhar a realidade com olhos críticos e propositivos.
Analisando os interesses que mantêm o trabalho escravo como uma das mais criminosas negações a uma vida plena é possível entender também muitas outras desgraças que impedem o advento daquela sociedade sonhada.
Em novembro, aconteceu em Açailândia a Conferência sobre Trabalho Escravo, que reuniu mais de duzentas pessoas, vindas de 11 estados brasileiros e de quatro países (Brasil, Espanha, Estados Unidos e Inglaterra). A reunião significou um tempo de reflexão do passado e uma construção coletiva dos movimentos sociais para o futuro.
Os pontos fracos dos planos institucionais ficaram à vista. O sistema dominante, como um ente depredador baseado na exploração, na competitividade e no lucro, ficou evidente. Ficou claro, também, que somente uma radicalização não violenta, mas absolutamente firme e irredutível dos movimentos sociais, trabalhadores e intelectuais comprometidos com o futuro, poderá manter uma esperança de que ser humano e natureza possam conviver numa harmonia geradora de vida.
Naqueles dias, foram várias as noticias que chamavam a atenção para a existência de outros interesses que não zelavam pela dignidade do ser humano e seu entorno, assim como deixavam de lado a distribuição da riqueza sobre o lucro.
Qual o significado das declarações feitas pelos deputados norte-americanos em fiscalizar a cadeia produtiva do ferro e aplicar severas sanções? Sabemos que uma das maiores empresas do ramo está associada à Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) que, por sua vez, tem imensos interesses em jogo e domina o setor através do fornecimento da matéria-prima para as outras siderúrgicas.
Como é possível acreditar nas declarações da CVRD, se a empresa é submissa aos interesses dos seus sócios e obedece aos padrões mais puros do capitalismo internacional? Não é possível que uma empresa assim seja uma radical defensora da igualdade, liberdade e participação dos trabalhadores nos meios de produção, questão básica para se acabar com a existência do trabalho escravo.
Poderemos acreditar que a empresa vai lutar contra a terceirização que, como destaca o professor Maurílio Monteiro, da Universidade Federal do Pará, é o meio que as siderúrgicas historicamente usam para se desvincular do trabalho escravo? Como a Vale irá se justificar diante de toda a poluição ambiental causada por suas ações, que é tão evidente para quem faz o trajeto Açailândia-Imperatriz nas proximidades do assentamento Califórnia? Na Conferencia de Açailândia ficou explicito que o trabalho escravo e a deterioração meio ambiente são os dois principais resultados destes crimes.
Não queremos mais saber de argumentos econômicos que defendem o comércio e a supremacia destes ou daqueles que controlam o setor siderúrgico e agrário! O problema é que sua grandiosa capacidade econômica não é utilizada para dar qualidade às suas empresas, mas para aumentá-las a qualquer custo, comprando benesses, oferecendo dinheiro fácil aos "políticos".
Nosso objetivo é outro! Defendemos o Brasil de todos os brasileiros. Um lugar livre daqueles que causam o sofrimento do povo por não cumprir as leis, por não oferecer alojamentos, salários, água potável e alimentação decentes para nossos trabalhadores. Queremos um Brasil onde não existam empresas que não colocam os filtros nas suas chaminés "porque são muito caros", sem querer enxergar o alto prejuízo que causam à saúde de centenas de brasileiros, e muitas vezes até matam, cegos pela ambição.
Por tudo isso, não podemos acreditar nas hipócritas medidas dos deputados norte-americanos (responsáveis por tantas mortes e destruição no mundo) e das empresas que fazem graúdas declarações a favor do meio ambiente e dos mais fracos, enquanto atuam lesando os direitos deles. Vamos trabalhar para que terra, água, ar e ser humano possam se sentir salvos, em liberdade e justiça.
Neste sentido, finalizamos o ano com uma boa notícia: "Supremo Tribunal Federal decide: Justiça Federal vai julgar trabalho escravo". Será o principio do fim da impunidade? O ano 2007 será testemunha do fim de arquivamentos de processos criminais, penais e danos morais dos escravocratas e exploradores que nos faziam duvidar do Direito e da Justiça?
Outras medidas ainda deverão ser tomadas, como a aprovação da PEC que prevê o confisco de terras flagradas com trabalho escravo, e o outras leis que podem trazer um pouco mais de desenvolvimento econômico e social ao nosso povo.
Se isso se concretizar, este ano de 2007 que se inicia será um ano especialmente feliz para todos nós.