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Desertos avançam no Nordeste do território brasileiro (Foto:Arquivo IICA) |
Do Sudeste à Amazônia, é possível encontrar outros milhões de brasileiros que, de alguma forma, têm sua história de vida marcada pelas estiagens do sertão. Somente na Grande São Paulo, segundo o Ministério da Integração Nacional, um terço da população é composta por nordestinos ou descendentes de retirantes do Nordeste. E a seca é, sem dúvida, um dos principais fatores na complexa equação dessa diáspora.
O regime hídrico do semi-árido é traiçoeiro à ocupação humana. A irregularidade das chuvas é um obstáculo constante ao desenvolvimento das atividades agropecuárias, e a lacuna de sistemas eficientes para o armazenamento da água – que estão quase sempre concentrados nas mãos de poucos – intensifica ainda mais os efeitos sociais dessa realidade. Para piorar, ciclos de fortes estiagens costumam atingir a região em intervalos que vão de poucos anos a até mesmo décadas. Eles colaboram para desarticular de vez as já frágeis condições de vida de pequenos produtores e outros grupos mais pobres, tornando-se, muitas vezes, o gatilho que faltava para o abandono da região.
A ultima grande estiagem do gênero ocorreu entre 1998 e 1999. Na ocasião, a Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) realizou uma pesquisa envolvendo 15 municípios de cinco estados afetados. Os resultados mostram uma queda de 72% na produção de feijão, milho, arroz, algodão e mandioca de antes para durante a seca. Isso considerando que, na sua maioria, a produção era para consumo próprio. Uma situação que Renato Duarte, o autor da pesquisa, define como um “tipo singular de desemprego massivo”.
Se as causas e conseqüências da seca no semi-árido são bastante claras, o mesmo não é possível dizer das melhores formas para lidar com essa realidade. Desde o século XIX – quando o imperador Dom Pedro II chegou a importar camelos da África para o transporte de água às regiões mais atingidas –, propostas de diversos tipos são anunciadas, discutidas, engavetadas, retomadas e, por fim, engavetadas novamente. O mais recente capítulo dessa novela é a transposição do rio São Francisco, mais ambiciosa obra de infra-estrutura encampada pelo primeiro mandato do governo Lula. Seu objetivo é levar as águas do rio, através de um sistema de canais, para rios intermitentes do semi-árido nordestino.
No entanto, são várias as entidades e especialistas contrários ao projeto. Entre os principais argumentos, afirmam que o regime hídrico do São Francisco, que hoje é fortemente afetado pela poluição e pelo assoreamento, acabaria prejudicado pela perda de água. Além disso, muitos defendem a existência de alternativas mais baratas e eficientes para lidar com a seca, como o investimento em cisternas, por exemplo. Ressaltam ainda que a transposição beneficiaria principalmente grandes projetos econômicos, em detrimento da população carente.
Desertos feitos pelo homem
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Para Gertjan Beekman, mudanças climáticas podem agravar ainda mais desertificação no país (Foto: Arquivo IICA) |
“O manejo inadequado de solos, através de práticas agropecuárias e de mineração inadequadas, é um dos principais fatores para o avanço de desertos no Brasil”, afirma Gertjan Beekman, coordenador do Programa de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca na América do Sul, iniciativa capitaneada pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). “É, portanto, necessário buscar alternativas para uma exploração sustentável das terras, através da agroecologia.”
Beekman explica que o aquecimento global, provocado pela emissão de gases do efeito estufa na atmosfera, pode agravar ainda mais esse quadro. "Com o aumento da temperatura, aumenta o risco associado a fatores que intensificam a aridez nas regiões, como a evapotranspiração – perda de água pela evaporação do solo e transpiração das plantas."
A desertificação é um fenômeno discutido desde década de 1930, quando uma enorme superfície de cinco estados do sudoeste norte-americano foi afetada pelo problema. Tudo começou após a Primeira Guerra Mundial: na ocasião, a introdução de novas técnicas agrícolas e a crescente demanda por alimentos na Europa levaram a um aumento absurdo de produtividade nas terras da região. Em poucos anos, o esgotamento do solo tornou-se uma realidade aguda, que atingiu proporções catastróficas com a chegada de um período de seca severa. A terra seca virou poeira, e foi carregada por fortes ventos em tempestades de areia que soterraram cidades e aldeias inteiras. Somente para o estado da Califórnia, calcula-se terem migrado, em dez anos, entre 300 e 400 mil pessoas vindas dos estados afetados.
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