Trabalho escravo: procuradoria investiga morte de peão no Ramal do Boi fronteira com o Amazonas

 17/02/2007

Abdoral Cardoso

A Procuradoria do Ministério Público do Trabalho da 14ª Região investiga a morte de um trabalhador por acidente de trabalho, na área de derrubada, e a participação dos fazendeiros João Pereira Lisboa e Sérgio Monteiro Oliveira denunciados como responsáveis pela prática de trabalho degradante no "Ramal do Boi", a estrada de chão que interliga o Noroeste de Rondônia ao Sul do Amazonas.

Os reclamantes são unânimes em afirmar que foram aliciados por Luís Lima, que atuou como "gato" na contratação dos braçais. O reclamante José Antônio Coelho, por exemplo, trabalhou quatro meses na frente de derrubada e tinha um saldo de R$10,5 mil. "Mas só recebi R$600,00", disse.

João Lisboa nega ser o grileiro da área e diz que atua com projeto de manejo florestal. Na região, segundo o fazendeiro, os braçais são contratados para atividade de derrubada, mas a primeira providência é o fornecimento de um rancho completo para a família. "Estou aqui mais como um intermediário para ajudar um amigo". O fazendeiro, no entanto, assinou o acordo na condição de reclamado.

Ele reclama também pelo fato de quase ter perdido a família, pois não conseguia mandar dinheiro para a mulher e os filhos. A motocicleta que tinha antes de ser aliciado está danificada e sem condições de trafegar. A motocicleta foi usada também para pedir apoio no transporte do corpo do trabalhador que morreu na frente de derrubada às 10h e somente foi removido do cenário do acidente às 22h30.

Coelho e outros braçais ainda perderam as motosserras. Os equipamentos foram apreendidos pelo Ibama. Coelho ainda conseguiu guardar uma cópia da lista de mantimentos, fornecida pela cantina administrada pelo "gato". A lista confirma que a maioria dos preços é superfaturada.

A carne com osso consumida tinha classificação de "primeira". O abate da "novilha" era praticado pelos próprios reclamantes durante caçadas noturnas. A maioria dos reclamantes afirmou que as vacas de meia idade eram adquiridas pelo "gato" e em seguida soltas na mata próxima ao acampamento, construído com barracas coberta com lona preta. "Até hoje tem novilha solta no meio da mata", disse Coelho.

Braçais conseguem indenização de R$ 50 mil
Ainda, os braçais usados em trabalho degradante por fazendeiros em uma área de grilagem de terras da União, no Sul do Amazonas, a 100 km de Vista Alegre, começam a receber hoje (16) em Guajará-Mirim o pagamento do acordo assinado com a Justiça do Trabalho como parte do acordo de R$ 50 mil pelo contrato de empreita firmado entre os reclamantes e o "gato" Luís Nei de Lima, na derrubada de 170 hectares.

A audiência de conciliação da Vara Itinerante da Justiça do Trabalho na região da Ponta do Abunã, 260km de Porto Velho, e que tornou possível a assinatura do acordo com os reclamantes, foi conduzida pelo juiz do trabalho substituto Saulo Marinho Mota, da 3ª VT da Capital e respondendo ainda pela Vara do Trabalho de Guajará-Mirim. Mota explicou que o acordo abrangeu 11 processos e dois outros foram arquivados pela falta consecutiva dos reclamantes a três audiências.

Os trabalhadores foram libertados no final de 2006 por auditores da Delegacia Regional do Trabalho de Rondônia, após as investigações da Procuradoria do Ministério Público do Trabalho da 14ª Região confirmarem a infração. Na quarta-feira (15) última, o advogado do fazendeiro João Pereira Lisboa negociou o pagamento de R$50 mil aos reclamantes e formalizou a quitação da dívida durante a audiência de conciliação.

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