Direitos Humanos: Cruzada mundial contra o tráfico humano

 27/03/2007

Por Sanjay Suri, da IPS

Londres, 27/03/2007 – Uma nova iniciativa foi lançada ontem para combater o tráfico humano em todo o planeta. "É a maior iniciativa deste tipo já lançada", disse à IPS o diretor-executivo do Escritório das Nações Unidas Contra a Droga e o Crime (Unodc), Antonio Maria Costa. "Ela está destinada a criar um contexto para outras iniciativas desconexas realizadas até agora. Estamos falando de criar um contexto no qual cada iniciativa se tornará mais relevante e, em conseqüência, terá maior alcance em termos de impacto", afirmou.

O primeiro passo será realizar uma campanha de informação em nível mundial durante todo este ano. Também está prevista a criação de um fundo especial para financiar atividades a partir de 2008. "Ainda estamos na fase preparatória. O lançamento de nossa iniciativa global tem o objetivo de fazer as pessoas estarem a par do que é feito no mundo. Temos de atrair para este exército todos os que lutam pela liberdade", afirmou Costa. A Unodc diz que o problema do tráfico de pessoas atingiu "proporções epidêmicas durante a última década", e que a maioria das vítimas é de mulheres e adolescentes, muitas exploradas sexualmente.

O lançamento da iniciativa nesta segunda-feira coincidiu com o bicentenário da abolição do comércio de escravos no Império Britânico. Com base nisso, prevê-se a realização de uma série de encontros que terminarão em Viena com a Conferência Internacional contra o Tráfico Humano, entre 27 29 de novembro, informou a Unodc. Cerca de 2,5 milhões de pessoas em todo o mundo estão sob as redes dos traficantes, segundo especialistas internacionais. O tráfico humano, seja para exploração sexual ou trabalho forçado, é um problema que afeta todas as regiões do planeta.

Entretanto, a Unodc explicou que "os números verdadeiros são desconhecidos, pois ainda há muitas vítimas sem identificar". O "governo dos Estados Unidos estima que entre 600 mil e 800 mil pessoas são traficadas através das fronteiras internacionais a cada ano", acrescentou o Escritório da Organização das Nações Unidas. O tráfico de humanos se converteu em um grande negócio que, segundo dados da ONU, chega a US$ 32 bilhões ao ano. Deste total, cerca de US$ 10 bilhões correspondem à "venda" de pessoas, e o restante ao ganho de atividades ou produtos feitos pelas vítimas para seus exploradores.

"O problema do tráfico de pessoas e as formas resultantes de escravidão moderna não conhece fronteiras, não tem passaportes. Mas se forem examinadas as causas, entende-se melhor onde se localiza geograficamente", disse Costa. Em grande parte, "a primeira causa diz respeito às condições sócio-econômicas que tornam as pessoas mais vulneráveis e disponíveis para qualquer coisa, incluindo o risco de ser vítima dos traficantes e convertida em escrava", explicou Costa à IPS. "Em segundo lugar, em algumas culturas os vendem suas filhas por causa de dificuldades econômicas", acrescentou.

Este tráfico é alimentado pela constante demanda. "Há pessoas que buscam sexo exótico, outras que compram lençóis ou matérias-primas baratas produzidas por meninos e meninas com suas próprias mãos", afirmou. Também "tivemos no passado casos de importantíssimos produtores de artigos esportivos. Sabíamos que estes eram fabricados à mão em aldeias sob condições de escravidão. Há uma ampla gama de problemas", acrescentou.

Consultado sobre este tráfico do leste para oeste da Europa, Costa disse que as dificuldades econômicas nos ex-países comunistas "criaram o desejo de migrar sob qualquer condição, e o crime organizado se aproveita disso. Sobretudo, as jovens são muito vulneráveis ao tráfico", acrescentou. Entretanto, destacou a importância de não centralizar o problema na Europa oriental, já que está presente igualmente em outras regiões do mundo.

Um estudo da Unodc intitulado "Tráfico de pessoas: padrões globais", identifica Albânia, Bielorússia, Bulgária, China, Moldóvia, Tailândia e Ucrânia entre os principais países desde onde se trafica pessoas. Alemanha, Bélgica, Estados Unidos, Holanda, Israel, Itália, Japão, Turquia e também Tailândia são os destinos mais comuns destes escravos modernos. O Protocolo da ONU Contra o Tráfico de Pessoas, em vigor desde dezembro de 2003, foi assinado e ratificado por mais de 110 países, mas os governos e seus sistemas judiciais ainda não o colocaram de fato em prática, diz a Unodc.

"Poucos criminosos são condenados e a maioria das vítimas nunca recebe ajuda. Muitas, inclusive, são condenadas por crimes como entrada ou residência ilegal no país", acrescentou o escritório da ONU. Os principais sócios na nova iniciativa serão os governos, pois estes "têm a capacidade direta de por fim ao tráfico", destacou Costa. "O que tentamos fazer com está iniciativa é enfrentar os governos e dizer-lhes: se assinaram isto, agora devem cumpri-lo. Nós forneceremos os recursos para ajudar os países em termos de leis nacionais, punição dos traficantes, resgate das vítimas e prevenção para os mais vulneráveis", acrescentou Costa.

A iniciativa contará com a colaboração de organizações religiosas "e, em especial, grupos da sociedade civil". Estes grupos "serão nossos olhos e ouvidos no terreno, identificando as condições das vítimas e colaborando em operações de resgate". Uma grande parte dos novos recursos para combater o tráfico humano irá para as organizações da sociedade civil, informou Costa.

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