Migração e trabalho escravo no Maranhão

 28/03/2007

Marcelo Carneiro

A realização do estudo "Migrações no Maranhão Contemporâneo", através de uma parceria entre a Comissão Pastoral da Terra e o Grupo de Estudos Rurais e Urbanos da UFMA, está revelando características importantes sobre o processo migratório no Estado.

O primeiro aspecto que a pesquisa realizada nos municípios de Timbiras, Codó e São José dos Basílios revela é a importância do fenômeno migratório. Das famílias entrevistadas em Timbiras, 63% têm pelo menos um membro trabalhando fora do município. Em São José dos Basílios, este percentual é de 42%; e de 24% em Codó, cujo percentual bem menor está associado ao fato da cidade possuir algumas indústrias instaladas e funcionar como centro regional, portanto com capacidade de geração de ocupação e empregos.

São Paulo e Goiás são os estados para onde se dirige a maioria dos migrantes de Timbiras e Codó. No caso de São José dos Basílios aparecem como destaque os estado do Mato Grosso e Pará. Essa diferença de destino traz consigo uma diferença de atividades realizadas, pois o deslocamento para São Paulo está associado ao trabalho na lavoura de cana-de-açúcar, para Mato Grosso na lavoura da soja e para o Pará nas atividades da pecuária, exploração madeireira e garimpo.

Um terceiro aspecto importante no estudo são os dados referentes à composição da renda dos chefes de famílias. O dado que mais sobressai é a importância da atividade agrícola. Além desta, outra importante fonte de renda para as famílias é a aposentadoria rural, ocupação principal de 10,1% dos chefes de família em Codó, 10,1% em São José dos Basílios, e 20% em Timbiras.

Quando se adiciona a esses dados as informações relativas a cobertura dos programas de transferência de renda do governo federal( Bolsa Família, PETI, etc) – 54,3% das famílias de Codó; 55,8% de São José dos Basílios e 44,7% em Timbiras – verifica-se a importância das políticas sociais para a reprodução econômica dessas famílias.

O penúltimo fato relevante no estudo é a caracterização da forma de acesso à terra trabalhada. Nos três municípios o principal mecanismo de aceso à terra ainda é o arrendamento: – 70,7% dos entrevistados em São José dos Basílios, 74,5% em Codó e 54% em Timbiras.

Por fim, é importante observar como se dá o processo de mobilização dos migrantes para o trabalho fora do município. Há, neste caso, uma maior diversidade de situações, pois enquanto em Timbiras a maior parte é mobilizada através de amigos/vizinhos e familiares, em São José dos Basílios a maioria desloca-se por conta própria – 50 % do total – e em Codó destacam-se os empreiteiros.

Um elemento central para a compreensão da disponibilidade desses trabalhadores é a situação vivenciada por suas famílias no local de origem, marcada pelo não-acesso aos recursos produtivos de que dispõe o município, de forma particularmente importante o não-acesso à propriedade da terra. Por conseguinte, pode-se afirmar que o fenômeno migratório está em grande parte associado ao monopólio da terra por parte de poucos e da existência do arrendamento como mecanismo de acesso dos trabalhadores aos meios de sobrevivência.

Nessa perspectiva, pensar a construção de uma alternativa para essas pessoas ao destino do trabalho na cana, passa pela intervenção do estado na distribuição dos recursos fundiários da região – desapropriação ou arrecadação de terras, estabelecimento de projetos de assentamento – como está estabelecido no « Plano MDA/INCRA para a Erradicação do Trabalho Escravo, que sugere como primeira medida ao combate da produção de migrantes nas regiões de aliciamento para o trabalho escravo.

A aplicação das ações de reforma agrária nesse municípios, tal como preconizado pelo MDA/INCRA, constitui-se numa ferramenta fundamental para o atenuamento do movimento migratório e, dessa forma, diminuição do fluxo de trabalhadores para regiões de fronteira agrícola, nas quais eles acabam sendo atraídos para atividades econômicas em que predominam o trabalho escravo contemporâneo.

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