Políticas públicas

Posto em Guarulhos identifica e atende vítimas do tráfico de pessoas

De 300 atendimentos já feitos desde dezembro a brasileiros extraditados ou não-admitidos no Aeroporto Internacional de Cumbica, cerca de 10% apresentam indícios de serem vítimas do tráfico de seres humanos
Por Beatriz Camargo
 21/03/2007

O Posto de Atendimento Humanizado aos Migrantes, que funciona em área restrita do Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos (SP), completa três meses de funcionamento. Desde dezembro, o serviço acolhe pessoas que não conseguiram entrar em outro país – e por isso voltam ao Brasil – ou que são deportadas – mandadas de volta para cá por estarem em situação ilegal em outro país. A iniciativa é da Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad), em conjunto com a Secretaria Nacional de Justiça (SNJ) e a ONG holandesa Cordaid.

De um universo de 300 atendimentos feitos até agora, identificou-se que 10% dos deportados e não-admitidos apresentam indícios de serem vítimas de tráfico de pessoas. "A maioria é de mulheres retornando da Europa. É mais comum serem deportadas do que impedidas de entrar no país", conta Dalila Eugênia Figueiredo, coordenadora da Asbrad.

O objetivo do Posto é identificar e prestar atendimento adequado às vítimas de tráfico de seres humanos, na maioria dos casos, para fins de exploração sexual. A equipe da Asbrad conversa com os deportados ou não-admitidos e os orientam com relação à volta para casa e à reinserção social. "Não somos vistos como polícia. Tentamos oferecer apoio, acolhida num momento de tensão e insegurança", explica Dalila.

Ela esclarece que os resultados conseguidos até agora "são um retrato qualificativo do perfil das vítimas de tráfico de pessoas e do atendimento dado a elas pelos diversos órgãos envolvidos". Para o especialista em Políticas Públicas da SNJ, Ivens Moreira da Gama, é difícil combater o problema porque muitas vítimas não se consideram vítimas. "Elas acham que estão compactuando com o aliciador e têm medo de cair nas mãos das autoridades locais."

O serviço faz parte do conjunto de medidas que serão incorporadas ao Plano Nacional de Enfrentamento do Tráfico de Pessoas, ainda em construção. O governo também planeja expandir o atendimento para outros locais considerados críticos, como fronteiras e outros aeroportos. Segundo Ivens, há estados em que as pessoas saem do país com mais freqüência, como Goiás, Pará, Rio Grande do Sul e São Paulo – principal ponto de saída internacional. Por outro lado, o Ceará apresenta grande tráfico interno, do interior para o litoral, seguindo a rota do turismo sexual.

Nas conversas com brasileiros que voltam para cá involuntariamente, a equipe da Asbrad conseguiu identificar casos de violação dos Direitos Humanos e dos direitos do migrante. A entidade prevê que, até o final do ano, será desenvolvida uma metodologia de atendimento às vítimas de tráfico de seres humanos e um levantamento dessas violações, para apresentar ao governo um projeto em forma de política pública.

O serviço de atendimento é feito pela Asbrad desde 1997, mas funcionava de forma esporádica. Quando a Polícia Federal fazia operações especiais e trazia pessoas extraditadas, solicitava a ajuda da entidade, que as recebia.

Vulnerabilidade
No Posto de Atendimento Humanizado aos Migrantes, que tem acesso restrito e sigiloso, só é atendido quem quer. Enquanto as pessoas aguardam a liberação de alguns documentos, a equipe da Asbrad se aproxima para conversar. Não há questionários nem fichas, para não intimidar.  Para Dalila, é preciso saber lidar com essas pessoas, que estão em um momento difícil e que em geral são socialmente vulneráveis. "Entre os migrantes, transexuais são ainda mais vulneráveis que mulheres", ressalta.

Para receber o serviço de forma permanente em Cumbica, agentes federais que trabalham na área restrita do Aeroporto e funcionários de companhias aéreas receberam uma formação sobre qual seria o trabalho da Asbrad no local. Além disso, foram sensibilizados de como deveriam tratar a questão do tráfico de seres humanos.

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