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Construção de nova usina divide moradores de Angra dos Reis

Enquanto a expectativa de novos empregos anima parte dos habitantes, outros membros da sociedade local questionam a segurança socioambiental não só deste projeto, mas de todo o complexo nuclear já instalado no município

Angra dos Reis – A polêmica retomada do programa nuclear brasileiro pelo governo federal deve enfrentar tantas resistências em âmbito local quanto as que se manifestam nas discussões nacionais sobre o tema. É o que indicam as opiniões colocadas nesta terça-feira (19) durante audiência pública realizada em Angra dos Reis (RJ), que reuniu cerca de 700 pessoas. No evento organizado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), os moradores assistiram à apresentação do estudo de impacto ambiental da Eletronuclear – estatal que detém o monopólio da construção de usinas nucleares no Brasil – para a viabilização da usina. Além do Ibama e da Eletronuclear, estiveram presentes o Conselho Nacional de Energia Nuclear, a Defesa Civil do Rio de Janeiro e a prefeitura local.

 
Fernando Jordão, prefeito de
Angra dos Reis, defende a
construção de Angra 3

Angra 3 é o carro-chefe dos novos projetos nucleares previstos pelo Ministério de Minas e Energia (MME) para o Brasil. De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica 2006-2015, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao ministério, o objetivo é que a nova usina entre em operação já a partir de 2012. Além disso, outros estudos do MME prevêem a construção de mais quatro usinas nucleares no país até 2030.

Segundo a Eletronuclear, serão gastos 7,2 bilhões de reais para construir Angra 3. O cronograma prevê a geração de nove mil empregos diretos durante as obras e 5,5 anos para sua conclusão. A previsão é que a usina tenha potência instalada de 1350 megawatts, igual à de Angra 2. Dessa forma, supriria 34% da demanda de energia do Rio de Janeiro, aumentando para mais de 80% a participaçãoda matriz nuclear no consumo total do estado.

Durante a audiência pública, o prefeito de Angra dos Reis, Fernando Jordão, defendeu abertamente a construção da nova usina – algo que, segundo ele, é o desejo da maioria da população local. Para Jordão, no entanto, é importante garantir que as obras não gerem migração desordenada. "Esta é uma posição clara do município, que a mão-de-obra aplicada aqui seja mão-de-obra da região", ressalta o prefeito.

Além disso, a prefeitura atesta intenção de aplicar maciçamente os royalties provenientes da usina em ações sociais e ambientais. Elisabeth Brito, secretária de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano do município, listou uma série de iniciativas a serem beneficiadas por esses recursos, entre elas o gerenciamento de resíduos sólidos, o combate à ocupação desordenada e o apoio a programas de saneamento.

Ao redor do salão onde foi realizada a audiência, foram penduradas diversas faixas manifestando apoio de moradores de bairros locais à construção de Angra 3. Também enfeitavam o auditório cartazes contrários à nova usina, trazidos por militantes da Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (Sapê). A Sapê, entidade criada na década de 1970 e articuladora de movimentos anti-nucleares no Brasil, contesta a idéia de que uma nova usina nuclear vai melhorar a qualidade de vida no município. Para ela, implantar Angra 3 implica receber mais de 30 mil pessoas, algo que aumentará a já crítica situação de ocupação desordenada do território em Angra dos Reis.

O aumento do lixo radioativo depositado na região é outra das principais preocupações relativas à criação de uma nova usina. Ainda não existe nenhum tipo de tecnologia capaz de neutralizar os resíduos nucleares, que precisam ser cuidadosamente armazenados para evitar a contaminação do meio ambiente e das pessoas. Segundo a Eletronuclear, existem no complexo nuclear de Angra dos Reis três estruturas para armazenagem de resíduos radioativos, sendo que uma quarta está sendo construída. Com elas, diz a empresa, há espaço suficiente para armazenar os resíduos até 2018, incluindo os que seriam provenientes de Angra 3.

 
Manifestantes locais questionam benefícios
trazidos pelas usinas: rejeitos tóxicos estão entre
as principais preocupações 

Os debates em torno do perigo enfrentado pela população local ganharam fôlego no final do ano passado, quando foi publicada no jornal Correio Braziliense uma reportagem afirmando que Angra dos Reis é recordista dentre todos os 92 municípios do Rio de Janeiro em mortes por malformações congênitas, deformidades e anomalias cromossômicas – problemas que podem estar relacionados à exposição à radiação.

Segundo a publicação, os dados foram obtidos dos registros de óbitos em bancos de dados do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde do Estado do Rio de Janeiro. Na ocasião, a Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados afirmou que enviaria requerimentos a órgãos do governo federal exigindo a realização de um estudo científico que aponte ou não relação entre as mortes e a operação de Angra 1 e Angra 2. Em nota, o Conselho Nacional de Energia Nuclear afirmou que a reportagem não tem embasamento científico que a justifique.

Rafael Ribeiro, membro da coordenação da Sapê, questiona também o plano de emergência para a evacuação da cidade em caso de emergência. Para ele, a empresa não trabalha com a possibilidade de um acidente nuclear e não existe plano capaz de realizar a evacuação segura da população.

O subsecretário de Defesa Civil do Rio de Janeiro, Sérgio Simões, afirmou, no entanto, que a região conta com uma grande quantidade de unidades de bombeiros devido à necessidade de uma resposta rápida a uma emergência nuclear, e que a Defesa Civil municipal de Angra dos Reis é a melhor do estado. "Acompanho há dez anos o planejamento das ações de resposta a uma emergência, e sou testemunha da evolução ocorrida", diz.

Mais duas audiências públicas ocorrem esta semana para discutir o estudo de impacto ambiental de Angra 3 – na quarta-feira (20), em Paraty (RJ), e na quinta-feira (21), em Rio Claro (RJ).

Usinas nordestinas
Entre as outras quatro usinas previstas pelo MME para 2030, duas delas, segundo o Plano Nacional de Energia 2030, podem ser construídas no Nordeste. Na semana passada, o presidente da Eletronuclear, Othon Pinheiro, afirmou que o ideal era construir uma das centrais nordestinas às margens do Rio São Francisco, antes da Hidrelétrica de Xingó. A razão para isso, segundo ele, é a abundância de água existente no local para resfriamento das turbinas.

A Eletronuclear quer começar ainda este ano a busca por uma cidade para abrigar uma das novas centrais nucleares brasileiras.


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4 Comentários

  1. Rozimere G. Da Silva

    Essa usina deve ser feita com o maior cuidado, assim como Deus fez o mundo para nós vivermos.

  2. Valéria Cartach Amaral Simenc

    Não tenho uma opinião formada sobre os assunto, até porque ela mostra dos lado de uma mesma situação. Mas prefiro ir para o lado do contra.
    Acredito que o benefícico que ela trás, com a diminuição de CO², não compensa o fato do armazenamento do lixo radioativo, até porque, o lixo radioativo mesmo armazenando agora, teria problema no futuro, e já o CO²´é prejudicial mas não tanto quanto o lixo radiativo. O benefício que ela pode nos trazer(construção da usina Angra 3), não irá compensar o prejuízos que poderá ocorrer mais tarde.

  3. Lamartine Boechat

    No início dos anos noventa, quando comecei a frequentar Angra dos Reis, ouvi diversos relatos sobre um falso alarme de acidente na usina nuclear ali existente. Em um dia de muita chuva, à noite, os alarmes do Frade tocaram duas vezes: o primeiro seria de alerta e o segundo de evacuação da área. No último caso a população deveria se deslocar para um ponto previamente combinado e ali esperar, ordeiramente, a hora do embarque em caminhões militares que a levariam para um local seguro.
    Segundo relatos, uma ONG, prevendo o que aconteceria, fez uma teatralização durante um dos treinamentos: uma mulher com uma boneca no colo começou a gritar desesperadamente que não queria morrer, outros choravam e diziam que iam perder tudo, o que seria de suas vidas… A encenação acabou contagiando aqueles que cordeiramente se perfilavam esperando sua hora de embarque. O caos se instalou. Os responsáveis pela ordem, os que a todos ensinaram e ditaram regras de como deveriam se comportar, se perderam e não souberam como lidar com o inusitado, com aquilo que fugia aos manuais. O mesmo aconteceu quando do falso alarme: nenhum plano foi seguido, todos queriam fugir do local, de qualquer maneira e o mais rápido possível, pessoas passavam mal, houve aqueles que armados obrigavam ocupantes de carros a sairem para que neles fugissem com seus familiares. O caos se instalou novamente.
    Sobre estes fatos fiz, em 1996, um curta em VHS, “Angra sob um toque de medo”, que agora converti para vídeo e disponibilizei no YouTube (no seguinte endereço: http://www.youtube.com/watch?v=Obbf9fWyJwA ). A cópia, como poderia se prever, não ficou de boa qualidade, mas, acredito que, mesmo assim, vale a pena assistir, pois algumas das condições que geraram o pânico ainda continuam presentes, como pode ser tão bem demonstrado pelos noticiários relacionados ao fechamento da Rio-Santos em diversos locais em consequência de chuvas, o que expõe toda a fragilidade do plano de evacuação da Usina Nuclear.

  4. andrade

    parabens para o governo até que fim temos que ter total dominio nuclear como espacial só tem que ter cuidado com sabotagem avante brasil nação do seculo 21.