Competição no campo estimula trabalho escravo, aponta ONG

 06/07/2007

Ana Luiza Zenker
Da Agência Brasil

Brasília – Mesmo depois de a escravidão ter sido abolida no Brasil há mais de cem anos, milhares de pessoas ainda vivem em situação semelhante ao trabalho escravo. Na semana passada, o Ministério Público do Trabalho realizou uma operação para libertar mais de mil empregados de uma fazenda de cana-de-açúcar.

Parece contradição encontrar, em fazendas que operam com alta tecnologia e com destaque internacional, trabalhadores que sofrem por não terem dignidade em seu emprego. "Parece que é contradição, mas na verdade não, uma coisa deriva da outra", afirma o cientista político Leonardo Sakamoto, coordenador da organização de defesa de direitos humanos Repórter Brasil.

Os casos de trabalho escravo são mais comuns quando em fazendas que estão sendo implantadas ou modernizadas, segundo Sakamoto. Nesses casos, o proprietário pode tentar compensar a falta de recursos com corte em direitos trabalhistas. "Ele não vai economizar na compra de tratores, de colheitadeiras, de caminhões, ou de sementes; ele vai economizar na parte sempre do trabalhador, então ele começa a cortar direitos, cortar direitos, cortar direitos, e chega a um ponto em que lima todos os direitos do trabalhador, incluindo o seu salário e a sua liberdade", afirmou, em entrevista ao programa Notícias da Manhã, da Rádio Nacional.

Apesar do número de mais de mil trabalhadores libertados na operação do Pará, "na verdade, a cana de açúcar não é o principal problema do trabalho escravo no Brasil e, sim, a pecuária bovina". De acordo com os dados da chamada "lista suja" do trabalho escravo, o setor da pecuária está em 62% das fazendas listadas, seguido pelas produções de carvão, soja, algodão e milho. "Isso porque estamos trabalhando com o número de propriedades rurais", e não em quantidade de trabalhadores, destaca Sakamoto.

A "lista suja" é um cadastro feito pelo Ministério do Trabalho, "que mostra quais os fazendeiros que comprovadamente utilizaram trabalho escravo e os lugares onde houve libertação". A lista só é consolidada depois que os fazendeiros citados têm direito a ampla defesa. Quando as multas e os processos abertos a partir da fiscalização são confirmados, o fazendeiro é incluído na lista e permanece por dois anos.

"A cada seis meses, ela é atualizada e publicada e mostra quais as fiscalizações, os trabalhadores libertados, ou seja, é uma divulgação dessas fiscalizações", explica Leonardo Sakamoto. "É importante falar sobre essa lista porque ela é ótima, com base nela corta-se crédito, corta-se clientes", afirma. De acordo com o cientista político, os fazendeiros que aparecem na lista têm dificuldade em conseguir financiamento para a atividade rural, pois diversos bancos se negam a emprestar dinheiro para ser aplicado nessas propriedades.

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