Conflito agrário

Despejos deixarão mais de 2 mil famílias “desabrigadas” no PA

Na Operação Tocantins, 115 homens da PM cumprem ordem judicial de reintegração de posse de 12 fazendas. Estado e Incra não têm destinação para sem-terra despejados
Verena Glass
 03/07/2007

No último dia 27 de junho, 115 homens do efetivo do Batalhão de Polícia de Choque, Companhia de Operações Especiais, Regimento de Polícia Montada e Grupamento Aéreo do Pará deram início a uma ação de despejo em massa que cumpre liminares de reintegração de posse de 12 áreas nas regiões Sul e Sudeste do estado. A chamada Operação Tocantins, que já retirou sem-terras ligados à Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará (Fetagri) de quatro áreas até esta segunda (2), deve ser concluída no final de julho, segundo estimativa da Polícia Militar.

Entre as áreas da lista de despejo, a maioria é ocupada por agricultores ligados à Fetagri, e apenas duas têm militantes do MST, segundo informação da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Tanto a CPT quanto o MST, porém, têm se manifestado de forma muito crítica à ação, considerada pelos movimentos uma resposta à pressão de fazendeiros e madeireiros sobre o governo do estado.

A grande preocupação do MST, segundo o dirigente estadual Ulisses Manaças, é a destinação das famílias despejadas. Enquanto o Incra fala em cerca de 2 mil famílias, a CPT contabiliza entre 4 e 5 mil. O Instituto de Terras do Pará (Iterpa) não arrisca estimativas de números. Mas tanto a superintendência do Incra quanto o Iterpa não sabem dizer onde os despejados serão realocados.

De acordo com o presidente do Iterpa, José Benatti, a maioria das áreas em litígio tem titulação do Incra, órgão responsável pelo assentamento dos clientes da reforma agrária. Na operação em curso, caberia ao estado basicamente prestar a assistência social necessária, como oferecer transporte aos despejados e atendimento às crianças, afirma Benatti.

Já o superintendente do Incra em Marabá, Raimundo Oliveira, afirma que o órgão “não tem um hectare de terra para assentar estas famílias”, e que esta dificuldade teria sido colocada à Justiça nas discussões sobre o cumprimento das reintegrações de posse. Segundo Oliveira, é fato que “muitas famílias não têm pra onde ir”.

Tanto Manaças quanto o advogado da CPT, José Batista, que reverteu, através de recursos, a inclusão de outras 20 áreas no pacote da Operação Tocantins, afirmam que o governo estadual estaria agindo de forma inábil no processo, uma vez que, se não tivesse disponibilizado força policial para a ação, ela seria retardada. Por outro lado, Batista também critica o Incra e afirma que 50% dos despejos na região de Marabá poderiam ter sido evitados se tivesse havido mais ênfase nas negociações por parte do órgão.

Segundo Benatti, porém, o estado não teria como descumprir uma ordem judicial. Por outro lado, afirma o presidente do Iterpa, havia a preocupação por parte dos órgãos públicos de que, caso não houvesse uma intervenção oficial no conflito fundiário, os fazendeiros estariam ameaçando utilizar milícias particulares para retirar os sem-terra. “Se o estado não responde [à ordem judicial], ha o perigo de uma resposta privada. Pior seria não fazer nada”, afirma. Questionado se a força policial de 115 homens, que está operando os despejos, não poderia agir na coerção da pistolagem, Benatti respondeu que “a polícia está agindo”.

Na mesma direção, o superintendente o Incra, questionado sobre a possibilidade de retomar áreas griladas na região dos despejos para assentar as famílias, ponderou que no Sul e Sudeste do estado os grileiros estão nas áreas ha muito tempo, “têm milícias armadas. Se colocarmos os trabalhadores nestas áreas, seria jogá-los na boca do jacaré”.

Demostrando preocupação com a situação, tanto Benatti quanto Oliveira afirmaram que os respectivos órgãos continuam na busca de soluções para o assentamento das famílias. “Os processos [na Justiça] não param”, afirma Oliveira sobre a disputa judicial pelas áreas em litígio. Segundo ele, o Incra também estaria buscando outras saídas, como a obtenção de uma das áreas que está hipotecada no Banco da Amazônia por conta de dívidas. “Mas o Incra está esperando uma resposta ha 15 dias”, desabafa.

Sobre a fazenda mais polêmica da lista da operação, a São Marcos, em Parauapebas, ocupada pelo MST, o órgão está buscando junto ao Ibama um atestado de que o proprietário cometeu crime ambiental ao desmatar ilegalmente a maior parte da área, para justificar a desapropriação. “Mas com a greve do Incra e do Ibama, as coisas ficam mais difíceis”, lamenta. Enquanto isso, sem solução em vista para os despejados, o MST promete resistir. “Os sem-terra do movimento só sairão se houver destino para as famílias”, afirma Manaças.

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