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Fiscais resgatam 83 pessoas em fazenda fornecedora da Unilever

Fazenda Arari, localizada a 100 km de Goiânia, produzia tomate com exclusividade para a Unilever Brasil; um dos trabalhadores foi ameaçado de morte e foi incluído no serviço de proteção à testemunha

O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou, na última quinta-feira (19), 83 colhedores de tomate na Fazenda Arari, em Itaberaí (GO). O auditor-fiscal que coordenou a ação, Dercides Pires da Silva, classifica as condições dos trabalhadores de análogas à escravidão. A propriedade fica a 13 km do centro de Itaberaí e a apenas 100 km da capital Goiânia.

O grupo móvel chegou ao local um dia após receber uma denúncia. A equipe de fiscalização identificou péssimas condições de alojamento, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) inadequados e retenção de documentos. Além disso, eram efetuados descontos ilegais no salário, de itens alimentícios, ferramentas e EPIs.

Fábio Alves dos Santos, arrendatário da propriedade, tem um contrato de venda exclusiva com a Unilever Brasil, filial da multinacional inglesa de mesmo nome que produz desde artigos de limpeza até gêneros alimentícios. A empresa oferece a ele sementes, agrotóxicos e assistência técnica. Em contrapartida, o produtor deve seguir uma série de recomendações e vender toda a produção à multinacional.

A Unilever adquire tomate de cerca de 40 produtores no Estado, sempre desse modo, segundo informa sua assessoria. A empresa também declara que, entre as exigências que faz a seus fornecedores, está a assinatura da carteira de trabalho e fornecimento de EPIs, como luvas, botas e máscaras.

Em nota, a Unilever afirma ter um projeto especial para colaborar na conscientização do produtor e do trabalhador rural. Diz, no caso da fiscalização, que a Delegacia Regional do Trabalho (DRT) de Goiás já liberou a continuidade do serviço na fazenda desde o dia 21, após a regularização das condições de trabalho. "A colheita de tomates nessa fazenda está sendo acompanhada de perto pelos agentes fiscalizadores daquela Delegacia e deve ser encerrada nos próximos dias. O produtor, inclusive, já se responsabilizou, junto à DRT e à Procuradoria Geral do Trabalho, pelo pagamento de eventuais direitos trabalhistas."

No sábado (21), houve uma reunião entre o grupo de fiscalização e representantes da Unilever. Segundo os coordenadores da ação, a empresa se comprometeu a arcar com os custos da rescisão contratual dos trabalhadores, repassando os valores ao produtor Fábio. O pagamento será feito na próxima sexta-feira, e totaliza cerca de R$ 162 mil.

A DRT de Goiás recebeu, no dia 18, a denúncia feita por um trabalhador paraibano que havia deixado a propriedade. No dia seguinte, ele voltou ao local com o grupo móvel e se misturou novamente aos demais colhedores, para poder receber o pagamento das rescisões de contrato pelo período trabalhado. No entanto, foi reconhecido e ameaçado de morte pelo irmão do "gato" (intermediário que contrata a mão-de-obra). Ele teve que ser retirado da fazenda pela Polícia Civil e foi incluído no Serviço de Proteção à Testemunha do Estado de Goiás.

Situação degradante
No total, cerca de 130 pessoas chegaram à fazenda para a safra de 2007, desde o dia 11 de junho, segundo depoimento do "gato" João Avelino dos Santos dado no Tribunal Regional do Trabalho nesta segunda-feira (23). No dia da chegada da equipe de fiscalização, porém, havia somente 83 trabalhadores na unidade de produção agrícola. De acordo com o que foi relatado à equipe de fiscalização, os outros tinham ido embora devido às péssimas condições de trabalho, mesmo sem receber o primeiro salário.

Para Dercides, há vários fatores encontrados que indicam trabalho escravo: o isolamento geográfico do colhedor de tomate em relação à cidade de origem, o que o torna vulnerável a uma situação de exploração. Ele também relata que havia retenção de documentos. Em muitas carteiras de trabalho vistas pelo grupo móvel, havia indícios de fraude: estava escrito "contrato de safra" e a assinatura do empregador, mas não havia a data de início do serviço.

Além disso, a fazenda realizava descontos ilegais no salário. "O ‘gato' trouxe os trabalhadores e descontou a passagem, colchão, pinga, cigarro, arroz, medicamento e EPI. A botina, por exemplo, custava R$ 22,00", relata Antônio Carlos Cavalcante, procurador do Trabalho e representante do Ministério Público do Trabalho (MPT) no grupo móvel, composto também por integrantes da Polícia Federal.

Condições de trabalho
Os libertados também enfrentavam condições ruins de trabalho, de alojamento e de alimentação. Além da cobrança ilegal, alguns EPIs eram inadequados e de má qualidade. "Quando nós chegamos lá, não havia nenhum trabalhador de luva", exemplifica Dercides. Ao lado dos trabalhadores, duas máquinas da Unilever também colhiam tomates na plantação. Segundo o depoimento dado pelo empregador Fábio dos Santos na superintendência da PF de Goiânia no dia 19, "os trabalhadores não têm o costume de usar os equipamentos de proteção e há necessidade constante de repor os equipamentos em virtude de perdas e/ou sumiços". Ele também negou que estes, ou qualquer outro artigo, fossem descontados dos colhedores.

Os safristas do tomate estavam alojados em três casas de alvenaria na cidade de Itaberaí, insuficientes para abrigar 83 pessoas. Dercides conta que uma das casas era boa, mas classifica de "deplorável" o estado das outras duas. "Os trabalhadores contaram que, quando chegaram, foram colocados todos juntos numa casa só. Reclamaram muito e, com o apoio do sindicato local, conseguiram uma situação um pouco melhor", narra. As casas não tinham tratamento de esgoto e em uma delas o vaso sanitário era um buraco no chão. Os dois ônibus que transportavam os trabalhadores diariamente até o local da colheita eram oferecidos pelo empregador, mas estavam em mau estado e foram apreendidos.

O procurador Antonio Carlos vai ajuizar ação por danos morais exigindo que o empregador pague R$ 5 mil em indenização a cada libertado e deve entrar com uma Ação Civil Pública contra o empregador Fábio dos Santos e a Unilever Brasil.

Leia na íntegra nota da Unilever

Notícia relacionada:
MPT investiga esquema de trabalho degradante na colheita do tomate


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11 Comentários

  1. ariadne cruz

    E a Unilever, será que foi questionada pela imposição dos preços que faz à esses produtores? Não só os preços, mas uma rede de imposições que são também responsáveis pelo trabalho escravo?

  2. Ailton lobo

    Se fosse fiscalizada a regiao do Pontal do Paranapanema,com certeza encontrariam muitos trabalhadores em condicoes um pouco piores,na colheita de sementes para pastagens. Eu,por exemplo,ja fui uma vitima desse tipo de degradacao humana naquela regiao!

  3. Paulo Pereira

    Mais uma vez venho parabenizar o MTE pelo trabalho desenvolvido, espero que a punição seja exemplar .Temos certeza que se o MTE disponibiliza-se de uma equipe maior abrangeria muito mais campo e com certeza fiscalizaria bem mais .Reforma Agrária neles …OITRA

  4. Edinete Sousa Fonseca

    Penso que além da exploraçao da mão de obra do pobre e ignorante( digo isso porque sei que essas pessoas não têm nenhum conhecimento dos seus direitos como cidadao e trabalhador).Pois é além dessa exploração vem a mim lembrança do que esses donos das plantações de tomatesnão estão fazendo com o uso indiscriminado do agrotóxico que coloca em risco a saúde do pobre trabalhador e do meio ambiente! Obrigada Edinete

  5. Rogério Borges da Silva

    o que me enoja mais nessa situação é que a imprensa goiana não publicou uma linha sequer sobre essa fiscalização, afinal, com um grupo grande,interesses podem ser contrariados

  6. Luciano Beregeno

    Rogério, nós, do Jornal Cidadão de Caldas Novas, publicamos a matéria na íntegra como a recebemos do Ministério Público e estamos desdobrando o material. identificando inclusive situações análogas à de Itaberaí e Morrinhos, em cidades da Região das Águas Quentes, onde o número de carvoarias é muito grande também. Caso queira maiores detalhes, entre em contato pelo [email protected].

  7. bruno calil fonseca

    OS INJUSTIÇADOS DE ITABERAÍ Assim talvez fosse a melhor qualificação dos produtores de tomate de Itaberaí. O município forte produtor na agricultura e sobressai nas culturas de: soja, milho, feijão, tomate, goiaba, cana, laranja, milho doce (industrial). Também é forte produtor de frango a nível nacional, leite, e gado de corte pelo sistema de semi-confinamento e confinamento propriamente dito.Podemos afirmar com toda certeza, que o Governo colabora muito pouco com estas produções extremadas e por outro lado podemos afirmar que quase tudo é iniciativa pura e simples da vontade indômita de trabalhar do itaberino.O triste episódio do dia 19 de julho foi fortemente noticiado e alardeado por autoridades do Ministério do Trabalho.O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) resgatou, na última quinta-feira (19/7/2007), 83 colhedores de tomate na Fazenda Arari, em Itaberaí (GO). O auditor-fiscal que coordenou a ação, Dercides Pires da Silva, classifica as condições dos trabalhadores de análogas à escravidão. A propriedade fica a 13 km do centro de Itaberaí e a apenas 100 km da capital Goiânia. O grupo móvel chegou ao local um dia após receber uma denúncia. A equipe de fiscalização identificou péssimas condições de alojamento, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) inadequados e retenção de documentos. Além disso, eram efetuados descontos ilegais no salário, de itens alimentícios, ferramentas e EPIs.Os agricultores de Itaberaí não fomentam nenhuma hostilidade aos trabalhadores braçais. Ademais se não estivessem preocupados com o bem estar social já teriam mecanizado suas lavouras a muito tempo. Forçosamente órgãos de governo inadvertidamente buscam sensacionalismo à custa de homens honrados e batalhadores.Implantou-se uma crise gratuita, pois, de um lado agricultores e de outro a indústria buscam a mecanização imediata para fugir destes embates institucionais.Por outro lado o Governo deveria servir de exemplo e humanizar as penitenciárias, onde vivem milhares de seres humanos em situação de penúria, aliás, em situação de penúria. Lá são mantidos presos, trancafiados em condição subumana, passando todas as privações conhecidas, bem como: fome, sede, frio, calor, solidão, humilhação, etc. Nesta situação não acha os legalistas para enfrentarem o Governo e denunciar as condições análogas à escravidão.O chamado “resgate de trabalhadores” não passa de fantasia, pois, o verdadeiro resgate deveria ser de homens e mulheres nas periferias das grandes cidades, dos homens que vivem condições análogas à escravidão nas celas das penitenciárias.Deveria o Governo preocupar-se com a segurança pública de pessoas honradas e honestas, que morrem diariamente vítima dos “escravos” libertados pelas instituições governamentais.Na verdade precisamos sair do faz de conta e partir para um Brasil melhor, mais justo e humano. Sairmos da condição de País de subdesenvolvido para país rico. Mas precisamos que todos dêem as mãos. Sem culpar ninguém pela política social caótica que vivemos…Os injustiçados de Itaberaí são hoje os produtores rurais, que dão a sustentação ao plano de Governo – com baixo índice de inflação, pois, conseguem com o milagre brasileiro manterem estável o preço de seus produtos. Na época de auge dizem que tudo está caro por serem os preços atrelados em dólar. E agora com o dólar despencando a indústria de insumos não baixa preços.Está na hora de uma união de produtores para dar um basta nesta situação de caos implantada pelas instituições, que buscam apenas os faróis da mídia. Fazem o estrago e desaparecem do mapa deixando prejuízos e abalos na agricultura local.O Governo perde em credibilidade e causa um terrorismo social. Não aprende com os seus próprios erros. Não podemos esquecer jamais, que os grandes produtores têm potencial de produção e know-how para produção de qualquer gênero alimentício.A hora do levante é esta e com sabedoria e altivez vamos construir uma estada de paz e prosperidade, impulsionada pelo respeito às leis e das leis aos produtores deste Brasil. Bruno Calil Fonseca É advogado em Itaberaí-GO. http://www.brunocalil.com.br/

  8. Júlio Comparato.

    Bruno, por Deus! Punição severa a todos que cometeram essa atrocidade e ponto final. Não vamos misturar a agicultura decente com o que esse pessoal fazia.

  9. Jhonathan

    Esses, produtores rurais não deviam usar mão de obra.
    E sim colocar maquinas para trabalhar. uma maquina que colhe tomate pode trabalhar para 60 homens…
    E o procurador do ministerio do trabalho devia ter um pouco de educação. E não cometer abuso de autoridade.
    Jhonathan silveira (agricultor em Rio verde)

  10. fora de sério em!!

    acho que voce esta exagerando em dizer que os colhedores foram resgatados do trabalho, agora me fala a quantidade de pessoas que estão empregadas na mesma cidade em comparativo a anos anteriores. ???????

  11. renata

    Querem saber o desfecho dessa história? foi firmado termo de ajuste de conduta com os supostos lobos-mau(produtores rurais); não houve desapropriação da terra porque era arrendada(os lobos-maus eram pequenos produtores); restou configurada a responsabilidade da Unilever (porque ela que fiscalizava semanalmente a plantação); o rei do holofote (rotulado de procurador do trabalho) se desculpou informalmente, longe da imprensa, pelo abuso de poder; descobriu-se posteriormente que o trabalhador ameaçado de morte foi ameaçado pelos proprios companheiros de trabalho e não pelos fazendeiros, porque descobriram que ele foi infiltrado no meio deles pelo próprio Ministério do Trabalho…