![]() |
Clique para ver mapa interativo com os seis municípios que são grandes produtores de grãos e que têm problemas com trabalho escravo |
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou, no último dia 19, uma pesquisa que mediu a produção municipal de grãos em 2006. Entre os dez municípios com maior renda agrícola estão seis em que o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) já flagrou trabalho análogo à escravidão. Na pesquisa do IBGE são considerados "grãos" os cereais, leguminosas e oleaginosas, tais como soja, milho, arroz, feijão e algodão. A renda obtida pela produção é medida multiplicando-se o preço médio recebido pelo produtor ao longo do ano pela quantidade de grãos produzida.
Os seis municípios ficam no Mato Grosso e na Bahia, estados que aparecem, respectivamente, em segundo e terceiro colocados no ranking de libertações de trabalho escravo. A liderança absoluta cabe ao Pará. As fiscalizações ocorridas em São Desidério (BA), Sorriso (MT), Campo Verde (MT), Campo Novo do Parecis (MT), Diamantino (MT) e Barreiras (BA) aconteceram entre 2000 e 2007, e libertaram, no total, 1.272 trabalhadores.
Apesar dessas fiscalizações terem ocorrido em várias atividades agrícolas, e não somente no cultivo de grãos, o cruzamento de dados mostra que a riqueza gerada na região nem sempre é revertida em boas condições de trabalho no campo.
Municípios que obtiveram maior renda agrícola com a produção de grãos em 2006
|
||||
Posição no ranking | Município | Valor da produção (em R$ 1000) | Ano em que foi encontrado trabalho escravo | Total de trabalhadores libertados |
1º | São Desidério (BA) | 659 269 | 2003 e 2007 | 802 |
2º | Sapezal (MT) | 599 866 | – | – |
3º | Sorriso (MT) | 585 105 | 2003 | 57 |
4º | Campo Verde (MT) | 421 922 | 2001 e 2002 | 23 |
5º | Campo Novo do Parecis (MT) | 378 095 | 2004 | 27 |
6º | Nova Mutum (MT) | 366 152 | – | – |
7º | Jataí (GO) | 318 402 | – | – |
8º | Diamantino (MT) | 317 383 | 2000 | 134 |
9º | Lucas do Rio Verde (MT) | 313 420 | – | – |
10º | Barreiras (BA) | 302 179 | 2003, 2005, 2006 e 2007 | 351 |
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As libertações não ocorreram necessariamente no cultivo de grãos.
O município líder do ranking de produtividade é São Desidério, no Oeste baiano, onde o plantio de grãos gerou R$ 659 milhões. A história recente mostra que a localidade tem sido foco de problemas graves de trabalho escravo. Entre 2003 e 2007, lá foram libertados 802 trabalhadores pelos fiscais do MTE. No município vizinho de Barreiras, que é o 10º local onde mais foi gerada renda pelo plantio de grãos, 351 pessoas ganharam a liberdade no mesmo período.
A produção de grãos que mais traz renda a essa região é o algodão, sendo que São Desidério é responsável por 12,9% do que foi colhido no país em 2006. De acordo com o auditor-fiscal Edvaldo Santos da Rocha, da Subdelegacia do Trabalho de Barreiras, os problemas trabalhistas acontecem principalmente na capina (limpeza de ervas daninhas) na cultura do algodão. "A mão-de-obra vem de fora, é pouco qualificada, não tem alojamento suficiente e é trazida por gatos." Segundo o auditor, houve fortalecimento na fiscalização rural, inclusive com a instalação de um ofício do Ministério Público do Trabalho na Região, e isso tem inibido a ocorrência de novos casos. "Houve melhoras, mas não a erradicação.", afirma.
Outro foco de trabalho escravo que também lidera o ranking do IBGE é o estado do Mato Grosso, onde a produção de soja e algodão são expressivas. Para Xavier Plassat, membro da coordenação nacional da Campanha de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a imagem de um agronegócio da soja moderno e mecanizado nem sempre corresponde à realidade.
"Esquecemos que antes da colheita e da aplicação dos venenos, antes mesmo do plantio, é preciso preparar o solo. Como muitas vezes se trata de
terras onde o Cerrado e a floresta foram arrancados, há necessidade de catar as raízes que sobram. É nessa atividade, que até hoje continua sendo feita à mão, que encontramos com freqüência grandes turmas de trabalhadores aliciados no Piauí, Tocantins ou Maranhão e explorados na Bahia, Mato Grosso, Goiás, ou mesmo no mesmo estado, como acontece no Maranhão, Piauí e Tocantins", explica Xavier.