As discussões sobre o trabalho escravo contemporâneo ganharam um novo espaço no Congresso Nacional. A Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público (CTASP) da Câmara dos Deputados aprovou, na quarta-feira (24) da semana passada, o requerimento de criação da Subcomissão Temporária de Combate ao Trabalho Escravo, Degradante e Infantil.
A proposta de abertura da subcomissão foi apresentada pelo deputado Paulo Rocha (PT-PA), que também deve presidir a nova instância. Autor primeiro da proposta de emenda constitucional (PEC) que prevê a expropriação da terra em que for constatada a prática do trabalho escravo – inicialmente identificada com o número 232/1995 e depois apensada à PEC 438/2001 do senador Ademir Andrade (PSB-PA) para facilitar o seu trâmite -, Paulo Rocha deve convocar audiências públicas e abrir espaço para o debate de matérias (confira a lista) que possam prever punições mais severas contra crimes desse tipo.
"É triste constatar que, após quase 10 anos da aprovação da Lei nº 9.777/1998 [que reconhece como crime a prática do trabalho escravo e também é de autoria do congressista paraense], ainda seja preciso discutir e votar projetos que combatam a escravidão", sublinha Paulo Rocha, que renunciou ao cargo de deputado federal em 2005 depois de ser envolvido no caso do "mensalão" e foi eleito novamente para o mesmo cargo em 2006. Os membros da recém-criada subcomissão devem ser escolhidos na semana que vem.
Para o deputado Tarcísio Zimmermann (PT-RS), que atuou como relator da PEC 438/2001 em 2004 quando a proposta chegou até a ser aprovada em primeiro turno no plenário da Câmara, a criação da subcomissão permitirá que parlamentares que trabalham pela aprovação da medidas mais rigorosas contra escravocratas possam intervir politicamente de forma mais organizada. "A nossa luta é muito difícil e espinhosa. Não temos ilusões de que será simples retomar a votação da PEC 438/2001 e de outros projetos de lei no sentido de intensificar a repressão à prática do trabalho escravo. A bancada ruralista é muito influente na Casa e atravessa inclusive a base aliada do governo", analisa o provável integrante da subcomissão.
O presidente da CTASP, Nelson Marquezelli (PTB-SP), não esboçou nenhuma resistência com relação à instalação da subcomissão, segundo Tarcísio Zimmermann. "Não acho que o presidente da comissão [e notório integrante da bancada ruralista] deve impor dificuldades maiores para a aprovação de projetos relacionados ao trabalho escravo. Politicamente, propostas desse gênero já geram muita resistência".
Reação
A criação da subcomissão temporária na Câmara Federal – a exemplo da Subcomissão de Trabalho Escravo ligada à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal – faz parte de um movimento reativo relacionado com o caso Pagrisa. Deputados engajados no combate ao trabalho escravo tentam se rearticular depois da pressão promovida em sentido oposto por um grupo de senadores que tentou deslegitimar a operação do grupo móvel de fiscalização realizada na fazenda e usina de cana-de-açúcar Pagrisa. No final de junho, 1.064 trabalhadores rurais foram libertados de condição análoga à de escravo por uma comitiva coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) na propriedade localizada em Ulianópolis (PA).
A última ação da comissão externa do Senado instalada para analisar o caso Pagrisa foi uma reunião com o ministro Carlos Lupi (Trabalho e Emprego), realizada na semana passada. Antes, eles já haviam decidido paralisar as sessões de depoimentos de pessoas envolvidas na libertação recorde.
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