Amazônia

Participantes do Fórum Sustentável apostam em relação de confiança

Representantes de organizações da sociedade civil apresentam suas opiniões e perspectivas acerca de desconfianças e de questionamentos referentes ao Fórum Amazônia Sustentável, lançado semana passada em Belém
Por Maurício Hashizume*
 13/11/2007

Belém – Se até há pouco tempo uma articulação como o Fórum Amazônia Sustentável não seria possível – como várias vezes se repetiu durante o encontro de lançamento da proposta que se deu na semana passada -, o que teria mudado? Mudou a sociedade civil, a conjuntura ou as companhias da iniciativa privada com atividades na região? Repórter Brasil ouviu representantes da sociedade civil que estão engajados no esforço do Fórum acerca de algumas questões basilares sobre esta nova iniciativa.

Na opinião de Magnólio de Oliveira, vice-coordenador do Projeto Saúde e Alegria (PSA), as organizações civis se fortaleceram nos últimos anos e hoje tem mais condições de encarar as empresas privadas, as quais, por sua vez, também vêm mudando. Esse cenário de maior equilíbrio entre as partes faz com que os diferentes atores busquem as convergências e não realcem apenas as divergências, avalia o arte-educador que transmite noções de saúde básica junto a comunidades ribeirinhas. "Essa união de forças pode garantir políticas públicas para melhorar a vida dos povos da floresta", ressalta.

Contudo, a participação no Fórum de empresas poderosas responsáveis por passivos socioambientais na Amazônia – como a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e a Alcoa – tem causado a desconfiança de outros setores organizados da sociedade civil. Para Paulo Barreto, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), essa desconfiança é mútua: empresas também desconfiam de movimentos sociais e organizações ambientalistas. "O que está acontecendo agora é o reconhecimento de que é preciso construir pontes. E esse encontro não vai resolver tudo isso de início. Dedicaremos parte do primeiro ano do nosso trabalho justamente para desenvolver essa confiança. E para saber se os grupos estão realmente dispostos a investir de verdade nessas relações. Existe um sentimento de que isso é possível, mas terá de ser construído e reforçado neste primeiro ano do Fórum".

Adesão de empresas do segmento agropecuário será fundamental para consolidação do Fórum
Antes de investir nessa relação de confiança, porém, não seria necessário que essas empresas pagassem a conta dos impactos sociais e ambientais que causaram e continuam causando? Na avaliação do pesquisador do Imazon, esta aproximação inicial do Fórum Amazônia Sustentável está sendo com "empresas que têm um passivo ambiental relativamente pequeno". "Para que esse Fórum seja realmente bem-sucedido, será necessário trazer, na etapa intermediária, os setores que tem um débito maior com a área social e ambiental. Por exemplo, os pecuaristas. Hoje nós temos uma adesão maior de segmentos ligados aos investimentos financeiros, ao uso de biodiversidade na área de cosméticos, etc.", coloca. "Precisamos ter toda a cadeia produtiva envolvida para resolver os problemas. Teremos estágios de envolvimento e esse segundo estágio será muito importante porque isso significaria mudar as práticas na ponta das atividades econômicas na região".

Outro fator relevante, reforça Paulo Barreto, está mais ligado à conjuntura: o comportamento do mercado, especialmente no que tange à valorização econômica de empresas que estão dispostas a cumprir melhores práticas de sustentabilidade. "O mercado de capitais, que as empresas têm buscado para consolidar suas operações, já começa a exigir planos de gestão ambiental. No setor de carnes, por exemplo, os frigoríficos maiores têm adquirido os menores visando o mercado internacional. Para isso, eles precisam buscar dinheiro na bolsa de valores e em outros grandes bancos, que também começam a fazer exigências. É um jogo de pressões e oportunidades que começa a aparecer e isso permite que esse Fórum exista".

O questionamento sobre a ausência de um conjunto maior de organizações de base para fortalecer o contraponto ao poderio econômico das empresas também foi colocado aos organizadores do Fórum. O interesse, responde Paulo Barreto, é que haja um envolvimento maior desses setores. "Em relação às organizações sociais, o primeiro movimento se dará na difusão pelas redes. Existem grupos que representam esses segmentos. Um dos mais expressivos é o GTA, que é o Grupo de Trabalho Amazônico. A CNS, que é o Conselho Nacional dos Seringueiros, que também tem bastante representatividade", adiciona.

"Alguns grupos não estiveram presentes por motivos de agenda. Representantes dos povos indígenas [como a Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab)], por exemplo, têm um comprometimento com o Fórum, mas não puderam participar de uma forma mais atuante neste início. Mas a idéia é ampliar a partir dessas redes, fazendo com que os participantes disseminem o entendimento sobre o Fórum", justifica o pesquisador do Imazon.

O importante é "não alimentar a ira entre os movimentos", complementa Magnólio, do Projeto Saúde e Alegria. Os povos da floresta, explana o vice-coordenador, não são ingênuos e estariam fora desse barco se a proposta de articulação com grandes empresas não trouxesse a possibilidade concreta de melhorias nas condições de vida. "As coisas se fazem devagar. São vários os fatores que geram a mudança. Por isso, o Fórum busca uma agenda genérica e factível para avançar. Nem que seja pouco".

*O jornalista viajou a convite da organização do Fórum Amazônia Sustentável. Leia a íntegra da Carta de Compromisso do Fórum Amazônia Sustentável Notícias relacionadas:
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